segunda-feira, 25 de julho de 2011
Um motivo a mais para viver
Dilmércio Daleffe
Aos 74 anos de idade, Sebastião Fernandes de Morais pode se considerar um vitorioso. Nascido em 37, ele venceu todos os prognósticos de expectativas de vida já levantadas no Brasil. Em 1950 o índice era de 48 anos. Em 2006, passou para 74. Hoje, ele faz parte de uma parcela da população – acima dos 60 anos - estimada em 20 milhões. Como o país está amadurecendo, a mesma camada dobrará em 2030, atingindo a casa dos 40 milhões de pessoas, segundo dados fornecidos pela 11ª Regional de Saúde. No entanto isso não quer dizer que a turma mais antiga parou de morrer, não. Significa que a população brasileira está mais responsável. Enquanto os mais jovens brecaram a “indústria” de bebês, os mais velhos passaram a se cuidar melhor. Não é errado dizer que os nossos anciões têm mais prazer em viver hoje, do que há 60 anos.
Sebastião chegou a Luiziana ainda em 49, quando o local se chamava Gleba Muquilão. Tinha apenas 12 anos quando começou a ajudar o pai na roça. Eram tempos muito difíceis e tudo se resumia a mato. Pra chegar até lá tiveram que abrir clareiras. Senão o Jipe não ia. Sem estradas, hospitais, mercados e nada mais, a diminuta população sempre dava um jeito em se estabelecer. “Não tínhamos acesso a saúde, quem diria então a remédios. Talvez seja por isso que o povo morria mais cedo”, acredita ele. Em meio a um lugar distante de tudo, o “jeitinho” brasileiro já se fazia presente. Então, quando alguém adoecia, lá vinham as cascas de árvores e folhas santas. Era chá pra tudo quanto era doença. E funcionava. Exemplo disso é que ele está vivo e com muita saúde.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que Luiziana contava em 2010 com 917 idosos. Certamente é muito maior que na década de 70 – não existem dados cadastrados pelo IBGE porque não se tratava de um município na época. Mas em Campo Mourão, em 70 eram 2,3 mil idosos. Atualmente, são mais de 11 mil. Irmão de Sebastião, Jorge Fernandes de Morais anda todo faceiro no topo dos seus 83 anos de vida. Ele veio de Siqueira Campos, Norte pioneiro do Paraná, também na década de 40, quando se estabeleceu definitivamente em Campo Mourão. A exemplo do irmão, Jorge também abriu caminho entre o mato para chegar até a região. Enquanto via a cidade crescer, também sentia a necessidade em tratamentos de saúde. “Não tinha quase nada para se tratar. Além disso as pessoas sofriam mais. Tudo era difícil”, lembra. Em 1991, os idosos representavam 6,8 da população brasileira. Em 2006, o índice subiu para 9,5%.
Sebastião e Jorge vieram de uma família composta por dez irmãos, sendo três já mortos. Juntos eles apanharam bastante para chegar aos dias de hoje. Lembram que gás naquele tempo não existia. Comida mesmo era à base da lenha, no bom e velho fogão. Energia elétrica, jamais. A luz dentro dos casebres era na base do querosene e das antigas lamparinas. Compras no mercado era obra de ficção científica. E remédios, como já mencionado, se resumiam aos chás caseiros. Sebastião lembra da vez em que um irmão apareceu em casa com uma picada de cobra no calcanhar. Doía muito e inventaram de chamar um benzedor da região que, segundo eles, deu jeito. É, o irmão continua vivo.
Os irmãos lembram que muitos amigos e conhecidos de tempos atrás morreram sem saber as causas. Faleciam ainda jovens sem nenhuma doença aparente. “Não tinha como a gente saber do que eles morriam. Não existiam médicos por perto”, disse Sebastião. Além disso, a população não se cuidava. A alimentação era a mais simples possível, embora sem a presença, ainda, de agrotóxicos. A água também era pura, direto da mina, sem nenhuma contaminação. Mesmo assim, a expectativa de vida do brasileiro, pelo menos na década de 50, se resumia aos 48 anos de idade. Uma afronta as leis da vida, reflexo de um país ainda atordoado pela pobreza.
Fábrica de bebês
Jorge é o mais velho dos irmãos e teve seis filhos. Sebastião possui apenas quatro. “Minha mulher teve um problema, não podendo ter mais filhos. Não fosse isso teríamos meia dúzia, facilmente”, brinca. Juntos, eles são o reflexo de um passado não muito distante, quando a população tinha seis filhos, em média. Dados indicam que em 1970, a taxa de fecundidade era exatamente de seis filhos por casal. Já em 2005, o índice despencou para apenas 1,82. Acredita-se que atualmente o número está ainda menor. Só para se ter idéia do que isso representa: em Luiziana, em 1985, nasceram 1513 crianças. Em 2010, o número desmoronou para apenas 128, segundo dados da 11ª Regional de Saúde. Só pra não esquecer, cada um dos quatro filhos de Sebastião possui dois filhos.
Nos dias atuais, cada um dos irmãos leva a vida do seu jeito, embora bem mais tranqüila que antigamente, afinal o gás apareceu, a luz clareou, a cura para inúmeras doenças surgiram e o supermercado, finalmente, é uma realidade. Sebastião está aposentado, parou de trabalhar na lavoura já há algum tempo e continua residindo em Luiziana. Adora cultivar a horta nos fundos da casa. Aprendeu a se gostar mais depois de um probleminha de saúde. Há três anos vem fazendo caminhadas ao lado da esposa, Elízia. Juntos, eles andam uma hora por dia. Jorge largou o cigarro há mais de 30 anos, perdeu peso e também passou a andar. Teve um pequeno problema no coração, mas se recupera muito bem. A família costuma dizer que ele é uma pessoa “zen”, daquelas as quais não esquentam a cabeça com nada. Também aposentado, passa o dia em casa, sempre em busca de algo para fazer, desde que não mexa na louça suja da esposa, a sempre perfeccionista Dona Clarinda. A eterna companheira. Segundo ela, ele não lava bem. Já Sebastião, ai dele se não ajudar Dona Elízia nas tarefas de casa. Ontem teve que lavar a calçada e a louça. Coisas de casal.
Tribuna do Interior - 24/07/11
domingo, 24 de julho de 2011
O misterioso caso da perna sem dono
Dilmércio Daleffe
Tiago Fialho
Há três semanas uma perna, possivelmente humana, foi encontrada ao lado de um saco plástico no interior do cemitério municipal São Judas Tadeu, em Campo Mourão. No início chegou-se a acreditar que o membro poderia ter sido extraído de uma das carneiras. Após intensa vistoria, a conclusão foi de que nenhum túmulo foi violado. A partir daí surgiu a possibilidade de que a perna pode ter sido arremessada pelo muro. Diante de todo o mistério, algumas perguntas ainda pairam no ar: onde está o dono da perna? Ela é realmente humana?
O problema é que o caso está parado. Ontem, o diretor administrativo do Instituto Médico Legal de Campo Mourão, Milton Scheibel, afirmou que os legistas não podem analisar a perna sem uma devida autorização e, ao mesmo tempo, solicitação da Polícia Civil. “Só periciamos depois de uma ordem da polícia. É no pedido deles que vamos analisar o que eles realmente querem”, disse. Scheibel se refere a detalhes do membro que podem dar provas e pistas aos policiais. “No pedido vão nos informar se querem saber se é de homem ou de mulher, e assim por diante”, explicou. Por enquanto, a gaveta da câmara fria do IML, contendo a perna, continua fechada. Nem fotos foram permitidas.
Cesar Antônio Gaspari, policial civil que está à frente do caso, informou ontem que está aguardando a perícia do IML. Para o seu espanto, ele não sabia que o instituto ainda aguarda a ordem da 16ª SDP para periciar a perna. “Não consegui verificar se o pedido realmente foi feito. Para mim a solicitação estava certa”, disse. De acordo com ele, somente depois que os legistas informarem detalhes do membro é que as investigações tomarão corpo. Ele também disse que há uma possibilidade da sacola contendo a parte do corpo ter vindo de fora da cidade. Mesmo assim, um detalhe chama atenção: dificilmente o dono da perna está vivo, principalmente, porque ela veio com partes da bacia.
Scheibel disse que, quando a ordem da perícia chegar, a análise pode sair no mesmo dia. “A pressa é nossa”. Embora se trate apenas de uma perna, ainda sem dono, o caso pode dar margem para uma investigação maior. Isso porque o fato pode trazer à tona pistas de um novo crime, uma pessoa assassinada e porque não dizer, até esquartejada. Mas isso depois que os dois órgãos, IML e Polícia Civil, se entenderem. Ontem, a reportagem da TRIBUNA tentou por inúmeras vezes falar com o delegado chefe da 16ª SDP, José Aparecido Jacovós. Ele estava em Engenheiro Beltrão.
Tribuna do Interior - 21\06\2011
Tiago Fialho
Há três semanas uma perna, possivelmente humana, foi encontrada ao lado de um saco plástico no interior do cemitério municipal São Judas Tadeu, em Campo Mourão. No início chegou-se a acreditar que o membro poderia ter sido extraído de uma das carneiras. Após intensa vistoria, a conclusão foi de que nenhum túmulo foi violado. A partir daí surgiu a possibilidade de que a perna pode ter sido arremessada pelo muro. Diante de todo o mistério, algumas perguntas ainda pairam no ar: onde está o dono da perna? Ela é realmente humana?
O problema é que o caso está parado. Ontem, o diretor administrativo do Instituto Médico Legal de Campo Mourão, Milton Scheibel, afirmou que os legistas não podem analisar a perna sem uma devida autorização e, ao mesmo tempo, solicitação da Polícia Civil. “Só periciamos depois de uma ordem da polícia. É no pedido deles que vamos analisar o que eles realmente querem”, disse. Scheibel se refere a detalhes do membro que podem dar provas e pistas aos policiais. “No pedido vão nos informar se querem saber se é de homem ou de mulher, e assim por diante”, explicou. Por enquanto, a gaveta da câmara fria do IML, contendo a perna, continua fechada. Nem fotos foram permitidas.
Cesar Antônio Gaspari, policial civil que está à frente do caso, informou ontem que está aguardando a perícia do IML. Para o seu espanto, ele não sabia que o instituto ainda aguarda a ordem da 16ª SDP para periciar a perna. “Não consegui verificar se o pedido realmente foi feito. Para mim a solicitação estava certa”, disse. De acordo com ele, somente depois que os legistas informarem detalhes do membro é que as investigações tomarão corpo. Ele também disse que há uma possibilidade da sacola contendo a parte do corpo ter vindo de fora da cidade. Mesmo assim, um detalhe chama atenção: dificilmente o dono da perna está vivo, principalmente, porque ela veio com partes da bacia.
Scheibel disse que, quando a ordem da perícia chegar, a análise pode sair no mesmo dia. “A pressa é nossa”. Embora se trate apenas de uma perna, ainda sem dono, o caso pode dar margem para uma investigação maior. Isso porque o fato pode trazer à tona pistas de um novo crime, uma pessoa assassinada e porque não dizer, até esquartejada. Mas isso depois que os dois órgãos, IML e Polícia Civil, se entenderem. Ontem, a reportagem da TRIBUNA tentou por inúmeras vezes falar com o delegado chefe da 16ª SDP, José Aparecido Jacovós. Ele estava em Engenheiro Beltrão.
Tribuna do Interior - 21\06\2011
terça-feira, 19 de julho de 2011
A mercê da saúde
A exemplo de outras nove cidades da região, Roncador está oficialmente sem hospital. O município que já se orgulhou em ter dois deles, agora vem sofrendo as mesmas conseqüências que marcaram o fechamento de outras 22 unidades ao longo dos últimos anos na Comcam. Para não deixar a população na mão, a vizinha Iretama vem atendendo os roncadorenses desde fevereiro deste ano. No entanto, ainda resta uma esperança. A prefeitura locou um antigo hospital, está fazendo as reformas solicitadas e, o mais rápido possível, tentará um novo credenciamento junto ao Sistema Único de Saúde (SUS). Enquanto isso não acontece, os filhos de Roncador continuarão a nascer em Iretama.
Dilmércio Daleffe
Vanessa Pereira da Costa acaba de ser mamãe. Ela possui apenas 15 anos de idade, uma menina que há pouco deixou as bonecas de lado. Mora em Roncador, mas foi obrigada a ter o pequeno João Victor na vizinha Iretama - pouco mais de 31 quilômetros de distância. Ao invés de um “roncadorense”, nasceu mais um filho de Iretama. Assim vem acontecendo desde fevereiro, quando o único hospital de Roncador perdeu o credenciamento, sendo forçado a paralisar quase todos os atendimentos, incluindo partos. Sogra de Vanessa, Terezinha Medeiros disse que a família teve gastos desnecessários com combustível e alimentação. “Não precisávamos gastar nada se o hospital daqui tivesse funcionando. Foi um transtorno que podia ser evitado”, disse. Assim como adorava suas bonequinhas, Vanessa agora amará seu filho. É a regra da vida. O fato de ter parido em outra cidade é mesmo esquisito, mas é só um detalhe. Afinal de contas, até a comida foi bem elogiada. Mas o que a mais nova mamãe não entende é o porque a população está submetida a distância. Até quando as gestantes de Roncador terão seus filhos em Iretama? Como um município de mais de 11 mil habitantes ficou sem uma unidade hospitalar?
A situação é um pouco difícil de explicar até mesmo pelos diretores da Saúde de lá. Num resumo geral, as instalações físicas do prédio alugado pelo município – o antigo hospital São Luis – não foram aceitas pelos olhos sempre vigilantes da Regional da Saúde. Disseram que a sala do necrotério tinha que mudar de local, que outra sala tinha que ser maior e assim por diante. Com as notificações, o hospital está realizando as reformas necessárias. “Acreditamos que em alguns meses tudo voltará ao normal. A crise está perto do fim”, diz Cristina Salomão, diretora de Saúde de Roncador. Desde que o problema teve início, a equipe do prefeito Agnaldo está sendo obrigada a fazer verdadeiros malabarismos para conseguir atender bem a comunidade.
Mas o histórico hospitalar da cidade é mais complicado do que parece. Até o ano de 2002, o município contava com dois hospitais particulares – o São Luis e a Policlínica São Carlos. Em 2003 o São Luis parou com os trabalhos. A Policlínica passou a atuar sozinha até 2007, quando também chegou a anunciar seu fechamento. Na época, o proprietário alegou que tinha prejuízos. Certamente foi verdade, uma vez que a tabela do Sistema Único de Saúde – SUS – não vem colaborando com a medicina do país, há muitos anos. Foi então que a prefeitura decidiu comprar as instalações da Policlínica.
Um ajuste de conduta firmado entre o município e o Ministério Público fez com que a Policlínica continuasse a atender, mesmo com a precariedade do prédio. Para isso, a prefeitura teria que promover adequações físicas, a fim de tornar a estrutura apta aos atendimentos. Uma ampla reforma seria necessária, praticamente do piso ao teto. Numa primeira avaliação concluiu-se que a obra custaria cerca de R$1 milhão. Uma emenda de R$250 mil, já aprovada, também acabou sendo bloqueada pelo governo federal. Em suma, o município não teria dinheiro para concluir a reforma. O jeito então foi locar o antigo hospital São Luis, levando pacientes, papelada e os demais problemas juntos. O ápice da crise hospitalar do município aconteceu no dia 26 de fevereiro deste ano, quando a cidade passou a ficar oficialmente sem nenhuma unidade médica.
Enquanto as reformas acontecem, a unidade vem servindo como um centro de triagem. Ou seja, é o primeiro atendimento à população. A partir dali os pacientes são encaminhados para baixa complexidade– atendimentos em Iretama, média – em Campo Mourão, ou alta complexidade – direcionamentos para Maringá, Londrina e Curitiba. Dados indicam que mensalmente o município faz encaminhamentos de 1,2 mil pessoas. Somente para Iretama são cerca de oito pacientes levados por dia, de ambulância ou de carro baixo. No começo do ano até o veículo funerário colaborou, mas somente uma única vez. “O importante é que o paciente foi levado a tempo”, lembrou Salomão. Ela explicou que as ambulâncias estavam em viajem.
Embora ainda não se saiba ao certo quando a cidade terá novamente seu hospital funcionando, equipamentos da pediatria e o centro de raio-x, estão parados, às moscas. Dinheiro público a mercê do tempo. Além disso, enfermeiros e médicos de Roncador estão atuando em Iretama, pagos pelos roncadorenses. Trata-se de uma situação adversa a qualquer município. Uma síndrome capaz de aleijar, no mínimo deixar marcas. De acordo com informações, a Saúde está gastando R$50 mil a mais, todo mês com a situação, cerca de R$300 mil até agosto.
Já o prédio do antigo hospital Policlínica São Carlos, pertencente ao município, está lacrado há mais de sete meses. Parte da mobília e alguns equipamentos continuam juntos aos “fantasmas” do local. Corredores solitários, lixo pelo chão e um vazio jamais visto. Em breve, tudo deve ser transformado em repartição pública. Só para ilustrar a história da menina Vanessa, do início da matéria, a prefeitura de Roncador informou que mensalmente 15 gestantes têm filhos na vizinha Iretama. Ou seja, 15 roncadorenses transformados em filhos de Iretama.
Regional explica situação
A situação de Roncador não é tão simples de ser resolvida, informa Nilma Ladeia de Carvalho Dias, Diretora da 11ª Regional de Saúde. De acordo com ela, além das reformas apresentadas no projeto, no caso do antigo hospital São Luis, o município ainda terá que buscar um novo credenciamento do SUS. “Primeiro terão que apresentar as reformas conforme o projeto. Uma vez aprovadas as obras através da vigilância sanitária, terão que correr atrás de novo credenciamento”, explicou.
O pesadelo do BHC
Dilmércio Daleffe
Sem saber o que fazer com o Hexaclorobenzeno, inseticida popularmente conhecido como BHC e que tem sua comercialização proibida desde a década de 80, dezenas de produtores rurais do município de São Jorge do Ivaí (município a 100 quilômetros de Campo Mourão) estão deixando o produto ao relento ou enterrando grande número de sacos contendo o pó tóxico ao redor de toda a cidade. De acordo com a Empresa Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), o composto químico pode contaminar o lençol freático e o manancial de água que abastece a cidade.
"Aqui, se juntar todo o BHC existente nas propriedades, é capaz de lotar umas três carretas", adverte César Miguel Candeo dos Santos, da Emater. Segundo ele, os estoques do produto na cidade até hoje, são herança dos tempos do café, quando os produtores utilizavam o BHC para eliminar a broca. Santos explica que, após o abandono dos cafezais em toda a região, já no início dos anos 80, o produto deixou de ter serventia, passando a ser um problema aos agricultores. "Quem não enterrou, está tendo dor de cabeça para se livrar do composto", diz. Segundo ele, em praticamente todas as propriedades existem restos do produto.
João Valter Guidelli, 50, herdou a propriedade do pai há vários anos e, junto com ela, cerca de uma tonelada de BHC. "Eu nunca usei esse produto. Quero é sumir com ele, mas não sei a quem entregar", alega. Até pouco tempo, ele armazenava os sacos em um galpão, na cidade. No entanto, a Secretaria de Agricultura e Abastecimento (Seab) exigiu que ele removesse o inseticida para sua fazenda. "Fizeram eu comprar sacos plásticos e armazenar o pesticida na propriedade. Até hoje ele está lá", explica.
De acordo com Alvir Jacó, responsável pela fiscalização do uso e comércio de agrotóxicos pela Seab, hoje, nenhum programa está recolhendo produtos de propriedades rurais do estado. Segundo ele, há quatro anos, o governo recolheu alguns inseticidas e os incinerou. "Ainda neste ano um programa do governo federal deve retirar os insumos proibidos do campo", disse. Até que isso aconteça, os agricultores devem continuar armazenando o pesticida sob galpões. Jacó também informou que, segundo estimativas, cerca de 500 toneladas de produtos como BHC ainda estão depositados em áreas do interior do Paraná.
(Gazeta do Povo - 2004)
Sem saber o que fazer com o Hexaclorobenzeno, inseticida popularmente conhecido como BHC e que tem sua comercialização proibida desde a década de 80, dezenas de produtores rurais do município de São Jorge do Ivaí (município a 100 quilômetros de Campo Mourão) estão deixando o produto ao relento ou enterrando grande número de sacos contendo o pó tóxico ao redor de toda a cidade. De acordo com a Empresa Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), o composto químico pode contaminar o lençol freático e o manancial de água que abastece a cidade.
"Aqui, se juntar todo o BHC existente nas propriedades, é capaz de lotar umas três carretas", adverte César Miguel Candeo dos Santos, da Emater. Segundo ele, os estoques do produto na cidade até hoje, são herança dos tempos do café, quando os produtores utilizavam o BHC para eliminar a broca. Santos explica que, após o abandono dos cafezais em toda a região, já no início dos anos 80, o produto deixou de ter serventia, passando a ser um problema aos agricultores. "Quem não enterrou, está tendo dor de cabeça para se livrar do composto", diz. Segundo ele, em praticamente todas as propriedades existem restos do produto.
João Valter Guidelli, 50, herdou a propriedade do pai há vários anos e, junto com ela, cerca de uma tonelada de BHC. "Eu nunca usei esse produto. Quero é sumir com ele, mas não sei a quem entregar", alega. Até pouco tempo, ele armazenava os sacos em um galpão, na cidade. No entanto, a Secretaria de Agricultura e Abastecimento (Seab) exigiu que ele removesse o inseticida para sua fazenda. "Fizeram eu comprar sacos plásticos e armazenar o pesticida na propriedade. Até hoje ele está lá", explica.
De acordo com Alvir Jacó, responsável pela fiscalização do uso e comércio de agrotóxicos pela Seab, hoje, nenhum programa está recolhendo produtos de propriedades rurais do estado. Segundo ele, há quatro anos, o governo recolheu alguns inseticidas e os incinerou. "Ainda neste ano um programa do governo federal deve retirar os insumos proibidos do campo", disse. Até que isso aconteça, os agricultores devem continuar armazenando o pesticida sob galpões. Jacó também informou que, segundo estimativas, cerca de 500 toneladas de produtos como BHC ainda estão depositados em áreas do interior do Paraná.
(Gazeta do Povo - 2004)
sábado, 16 de julho de 2011
O sangue nas veias da educação
Máquinas, enfermeiros, medicamentos, camas, soro. É neste ambiente hospitalar que uma professora vem alfabetizando renais crônicos do Instituto do Rim de Campo Mourão.
DIlmercio Daleffe
Pedrina dos Santos Nunes, de 43 anos de idade, sai às 5h da manhã de sua casa, em Luiziana, pelo menos três vezes por semana, para submeter-se as sessões de hemodiálise no Instituto do Rim, em Campo Mourão. Lá, além do tratamento de saúde, do carinho de médicos e dos enfermeiros, ela encontrou a atenção de uma professora: Salete Rosnoski Nantes. Até março deste ano, Pedrina era analfabeta. Hoje, já sabe ler e escrever. O aprendizado aconteceu entre máquinas e tubos, na própria cama em que passa quase quatro horas deitada realizando a diálise. A clínica transformou-se em uma sala de aula.
Bóia fria desde criança, Pedrina plantava, capinava e roçava sob o sol forte. Sua vida nunca foi fácil. Filha de um pai antigo, daqueles que pregava que a mulher não precisava estudar, foi logo tirada da escola, sendo impedida de alcançar um dos direitos básicos de todo cidadão: saber ler e escrever. Foi numa outra difícil jornada – das sessões de hemodiálise – quando descobriu que poderia ser igual às outras pessoas. Através de uma simples prancheta, Pedrina alçou um vôo jamais imaginado. “Ano que vem volto para a escola para aprender mais”, afirmou.
Salete, a professora, faz parte do Paraná Alfabetizado, um programa cujo principal objetivo é levar a alfabetização a locais distintos, para pessoas excluídas da educação no estado. Ela chegou ao Instituto do Rim através do médico Dênis Rogério Aranha da Silva, que buscou informações para levar o projeto à clínica. Hoje, segundo a gerente administrativa do Instituto, Ana de Fátima Moraes da Silva, o sucesso do programa é unânime entre os pacientes. “Vamos fazer de tudo para que a professora continue conosco. Além de ser uma grande distração aos renais crônicos, o resultado é muito especial”, disse.
Há um ano e meio, Benedita de Paula Ferreira, de 64 anos de idade, vem realizando sessões de hemodiálise. Ela acorda às 4h da manhã e viaja de Terra Boa até Campo Mourão três vezes por semana para permanecer quatro horas em diálise. No seu caso, a professora colaborou para que revisasse seus conhecimentos, uma vez que já sabia ler e escrever. “Não é fácil ficar quatro horas em uma cama. As aulas me distraem. É muito bom”, disse.
Também de Terra Boa, o estudante Marcos Vinícius, de apenas 23 anos de idade já é um veterano em matéria de diálise. Ele também já sabia ler e escrever, mas as aulas serviram como uma espécie de revisão. “Eu nunca imaginei encontrar uma professora aqui dentro. Tem sido bom para todos nós”, informou. Maria Madalena Guerreiro Moreira, 39 anos, é de Campo Mourão e também enfatizou a importância de Salete na clínica. “Ela é nossa amiga. Nos dá força e estímulo”, disse.
Para a professora, além das aulas o mais importante é estimulá-los a continuar na luta em que enfrentam. “É uma alegria para mim vê-los aprender. É uma satisfação pessoal”, revelou. Segundo ela, a idéia é continuar no programa no próximo ano, principalmente, em decorrência do sucesso obtido em 2009. Resultado das aulas, os pacientes receberam há uma semana os certificados do curso. Todos, sem exceção, conseguiram ler o que havia sido escrito em seus diplomas.
DIlmercio Daleffe
Pedrina dos Santos Nunes, de 43 anos de idade, sai às 5h da manhã de sua casa, em Luiziana, pelo menos três vezes por semana, para submeter-se as sessões de hemodiálise no Instituto do Rim, em Campo Mourão. Lá, além do tratamento de saúde, do carinho de médicos e dos enfermeiros, ela encontrou a atenção de uma professora: Salete Rosnoski Nantes. Até março deste ano, Pedrina era analfabeta. Hoje, já sabe ler e escrever. O aprendizado aconteceu entre máquinas e tubos, na própria cama em que passa quase quatro horas deitada realizando a diálise. A clínica transformou-se em uma sala de aula.
Bóia fria desde criança, Pedrina plantava, capinava e roçava sob o sol forte. Sua vida nunca foi fácil. Filha de um pai antigo, daqueles que pregava que a mulher não precisava estudar, foi logo tirada da escola, sendo impedida de alcançar um dos direitos básicos de todo cidadão: saber ler e escrever. Foi numa outra difícil jornada – das sessões de hemodiálise – quando descobriu que poderia ser igual às outras pessoas. Através de uma simples prancheta, Pedrina alçou um vôo jamais imaginado. “Ano que vem volto para a escola para aprender mais”, afirmou.
Salete, a professora, faz parte do Paraná Alfabetizado, um programa cujo principal objetivo é levar a alfabetização a locais distintos, para pessoas excluídas da educação no estado. Ela chegou ao Instituto do Rim através do médico Dênis Rogério Aranha da Silva, que buscou informações para levar o projeto à clínica. Hoje, segundo a gerente administrativa do Instituto, Ana de Fátima Moraes da Silva, o sucesso do programa é unânime entre os pacientes. “Vamos fazer de tudo para que a professora continue conosco. Além de ser uma grande distração aos renais crônicos, o resultado é muito especial”, disse.
Há um ano e meio, Benedita de Paula Ferreira, de 64 anos de idade, vem realizando sessões de hemodiálise. Ela acorda às 4h da manhã e viaja de Terra Boa até Campo Mourão três vezes por semana para permanecer quatro horas em diálise. No seu caso, a professora colaborou para que revisasse seus conhecimentos, uma vez que já sabia ler e escrever. “Não é fácil ficar quatro horas em uma cama. As aulas me distraem. É muito bom”, disse.
Também de Terra Boa, o estudante Marcos Vinícius, de apenas 23 anos de idade já é um veterano em matéria de diálise. Ele também já sabia ler e escrever, mas as aulas serviram como uma espécie de revisão. “Eu nunca imaginei encontrar uma professora aqui dentro. Tem sido bom para todos nós”, informou. Maria Madalena Guerreiro Moreira, 39 anos, é de Campo Mourão e também enfatizou a importância de Salete na clínica. “Ela é nossa amiga. Nos dá força e estímulo”, disse.
Para a professora, além das aulas o mais importante é estimulá-los a continuar na luta em que enfrentam. “É uma alegria para mim vê-los aprender. É uma satisfação pessoal”, revelou. Segundo ela, a idéia é continuar no programa no próximo ano, principalmente, em decorrência do sucesso obtido em 2009. Resultado das aulas, os pacientes receberam há uma semana os certificados do curso. Todos, sem exceção, conseguiram ler o que havia sido escrito em seus diplomas.
quinta-feira, 14 de julho de 2011
A desilusão bate a porta de um professor
Dilmércio Daleffe
A vida do professor José Carlos Paraguaio nunca foi fácil. Pobre, negro e com os pais analfabetos, teve que trabalhar desde os nove anos de idade em uma garapeira, nas ruas de Peabiru. Também foi sorveteiro e, já aos 16, depois da morte do pai, se transformou em servente de pedreiro para colaborar com as despesas da casa. Ainda na construção civil foi promovido a pedreiro, função desempenhada até meados dos anos 90. Hoje, aos 54 anos de idade, ele se afastou dos tijolos para construir uma sólida carreira nos bancos da educação. Depois da faculdade, fez pós graduação, mestrado e doutorado. Paraguaio agora é doutor em Ciências da Educação. No entanto, vive um drama: a Fecilcam não quer reconhecê-lo.
Paraguaio, apesar do nome é um brasileiro legítimo. Os pais, já falecidos, vieram de Minas Gerais e se fixaram em Peabiru. Lá viveram da lavoura e, mais tarde, pararam na cidade. Pode até parecer contraditório, mas toda a paixão educacional exalada pelo professor foi movida pelos próprios pais, analfabetos. “Sempre meu pai me orientou a estudar. Mesmo sem saber ler e nem escrever, era uma pessoa extremamente refinada. Tinha bons modos na mesa e conversava de igual para igual com colegas mais esclarecidos”, lembra Paraguaio.
O professor jamais foi rico. Nem pretensões para isso ele teve. Mas como todo bom brasileiro sempre almejou uma vida com qualidade a sua família, nada mais que isso. E foi com a educação, acreditando na dignidade de sua profissão, que buscou incrementar rendimentos maiores. Ou seja, terminando o mestrado e o doutorado, os professores ganham mais. Mas não é isso que vem acontecendo com ele.
Percurso
Durante toda a sua vida, Paraguaio jamais parou os estudos. Ele trabalhava e estudava ao mesmo tempo. Já aos 27 anos, lecionava em escolas rurais de Peabiru. Foi também nesta época, em 83, que iniciou o curso de Pedagogia na Fecilcam. Formou-se em 86. Depois disso fez mais um ano de habilitação para o magistério em uma faculdade de Mandaguari. Concluiu a pós-graduação em Filosofia também na Fecilcam. Em 90 começou a lecionar na faculdade, mas só em 91 foi efetivado após prestar concurso. Terminou o mestrado em 2004 em Ciências da Educação no Paraguai. Foi lá também, em 2007, na Universidad Politécnica y Artística del Paraguai – Assunción (UPAP) que concluiu o seu doutorado. E foi aí que o problema todo começou.
O transtorno
Depois de ter finalizado o mestrado, em 2004, Paraguaio voltou a Campo Mourão. Somente em 2005, após o Congresso Nacional aprovar uma lei reconhecendo o acordo de Admissão de Títulos e Graus Universitários no Mercosul (Argentina, Paraguai, Brasil e Uruguai), o professor protocolou seu título de mestrado na Fecilcam. Antes disso, seu título conquistado no Paraguai não tinha valor no Brasil. No entanto, segundo ele, o diretor da instituição, Antônio Carlos Aleixo, não se posicionava a respeito. Bastava aprovar ou reprovar.
A demora pelo reconhecimento, que também geraria maiores rendimentos ao professor, acabou o abalando psicologicamente. Visivelmente abatido, os alunos o questionaram. Foi então que eles decidiram se manifestar a direção da Fecilcam, pedindo uma posição sobre o assunto. O título de Mestre foi negado. Paraguaio então entrou com mandato de segurança contra a faculdade, que foi obrigada – em janeiro de 2006 - a reconhecer o mestrado e, consequentemente, a pagar retroativamente o professor.
A luta não parou aí. Um ano depois, Paraguaio finalizou o seu doutorado, também no Paraguai e fez o mesmo trâmite. Mais uma vez protocolou a progressão de Doutor na Fecilcam. Novamente, foi negado. Ele entrou na justiça mais uma vez e acabou ganhando a causa. Acontece que a direção da faculdade recorreu e os vencimentos como Mestre e Doutor foram cancelados em março de 2009. “Tive o reconhecimento de Doutor por apenas cinco meses. Até hoje, aguardo a decisão da justiça”, comenta.
Vivendo de sonhos frustrados
“Pensando em um rendimento mensal melhor, fizemos dívidas. Hoje, até os estudos de meus três filhos estão comprometidos”, afirma José Carlos Paraguaio. Ele conta que desde o reconhecimento de seu mestrado passou a oferecer melhores condições de vida a sua família, principalmente, aos filhos. Um deles continua a fazer inglês, não parou, mas as mensalidades deixaram de serem pagas por falta de condições. O mais velho só continua a faculdade de engenharia de produção na Fecilcam porque o curso é gratuito. “Fomos privados de muita coisa e quem está sendo sacrificado são meus filhos”, diz.
O que mais deixa Paraguaio indignado é olhar para trás e lembrar de todo o sofrimento que teve para concluir os títulos no Paraguai. Ele lembra que, mesmo sem condições, viajava duas vezes ao mês até Salto Del Guairá para estudar. Saía com o velho Chevette até Goioerê e, de lá, ia de carona com outros professores até o país vizinho. “Para pagar a defesa da tese um colega me deu o dinheiro, porque eu não tinha. Até mesmo os custos da viagem de Goioerê para o Paraguai meus amigos não cobraram. Foi muito difícil aceitar aquela situação”, disse. O processo continua em trâmite no Supremo Tribunal Federal.
“Não serei coadjuvante de um equívoco”
“Como sou ordenador de despesas, se eu cometer um ato irregular, ou concordar com um, tenho que responder administrativa e judicialmente”, afirmou Antônio Carlos Aleixo, Diretor da Fecilcam. De acordo com ele, tanto a faculdade como a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) determinam que para reconhecer título adquirido no exterior há necessidade de convalidação numa instituição nacional. Aleixo explica que existe um acordo entre os países do mercosul e que, se não for bem interpretado, faz crer que o reconhecimento é automático.
Segundo Aleixo, trata-se de um acordo de 2005, cujo próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva o reconheceu através de um decreto. “Vários professores do Brasil, da nossa região, Cascavel, Mato Grosso, estão interpretando o acordo do jeito deles. Não desejo entrar no mérito da qualidade dos cursos. Legalmente, nossa assessoria jurídica, à época, orientou para não reconhecer. Não reconheci”, afirmou.
Ele também explicou que o professor estava recebendo como doutor, mas a Procuradoria Geral do Estado, em Campo Mourão, passou a fazer a defesa do Estado e o Tribunal de Justiça cassou o título, uma vez que existem inúmeros pareceres para o não-reconhecimento. “O professor tem atribuído a mim a responsabilidade. Mas ele sabia que esses cursos não eram seguros”, lembrou Aleixo. Ele disse que já se colocou à disposição do professor para inseri-lo em um curso de mestrado no Brasil. “Paraguaio se negou”, disse. Aleixo finaliza dizendo que o acordo foi mal interpretado. “Não serei coadjuvante de um equívoco”, disse.
Sombras escondidas sob o canavial
DILMÉRCIO DALEFFE
Josuel Ribeiro, de 32 anos, e Valdete Lopes da Silva, 48, têm muito mais em comum do que a profissão de cortadores de cana. Separados há mais de 26 anos, os dois voltaram a se reencontrar em pleno trabalho, por obra do destino, numa usina canavieira de Engenheiro Beltrão, no Paraná. Ele vem todos os dias de Barbosa Ferraz até a empresa. Ela, começou recentemente a percorrer o trecho entre Paiçandu e Engenheiro Beltrão. O que não sabiam era que a vida havia lhes reservado um raríssimo momento de felicidade: o reencontro entre mãe e filho.
Tudo começou nos primeiros dias de agosto. Sem saber do paradeiro do filho, Valdete saiu de Paiçandu – na região de Maringá - ao lado do atual marido, Nelson Leonardo da Cruz, em um ônibus fretado que seguia até a usina. Os dois haviam sido recrutados para trabalhar no corte de cana. No caminho, Nelson insinuou que Valdete iria encontrar o filho, uma vez que, antes de se separarem, moravam na região da usina. Ao invés do coletivo seguir até a sede da empresa, parou em uma frente de trabalho para apanhar alguns rurícolas. A surpresa começou ali mesmo. Dentre tantos rostos no canavial, Valdete observou que um deles se assemelhava com a feição de um irmão dela. “Os olhos dele me chamaram a atenção”, disse a mãe. Foi então que ela se aproximou de Josuel e comprovou que era mesmo o filho que procurava.
Um abraço forte e as lágrimas do reencontro comoveram os que estavam presentes. “Foi um momento especial para os dois. Algumas pessoas se emocionaram mesmo”, conta o motorista João Batista. Segundo ele, no começo Josuel não acreditou na história. No entanto, depois que viu as coincidências, acabou aceitando. “Foi uma coincidência muito grande. Acho que a vida quis assim”, disse a mãe. O fato de Josuel ser surdo e mudo, facilitou ainda mais o reconhecimento da mãe. “Eu também não sabia como ele era. Mas quando nos vimos pela última vez, ele já tinha este problema”, disse.
A HISTÓRIA
Valdete conta que deixou Barbosa Ferraz quando tinha cerca de 18 anos de idade. Na época, ela havia se separado do marido, Dirceu José Ribeiro. Assim, ela foi embora com as duas filhas. Já o marido permaneceu na cidade com Josuel e o outro filho, Moisés. Com o passar do tempo, a mãe se distanciou dos dois, ficando separada por 26 anos. Na região de Maringá, casou-se novamente, passando a viver sem nunca mais ter tido notícias dos dois filhos. Na região onde permaneceu, Josué cresceu sem a mãe, aprendeu a trabalhar e também se casou. Hoje ele tem um filho. Mesmo com um problema de deficiência, o bom humor nunca o abandonou, fazendo amigos por onde anda.
Nos últimos dois anos, Josuel começou a cortar cana-de-açúcar para a usina. Esforçado, acorda ainda de madrugada, pega um ônibus em Barbosa Ferraz e percorre cerca de 50 quilômetros até a empresa. Há poucos dias, Valdete também começou a fazer o mesmo que o filho, apesar de nem imaginar. “De uma só vez ganhei um emprego e o filho. Espero poder reencontrar Moisés em breve”, disse ela. Mais novo que Josuel, Moisés não deu mais notícias para o irmão. Mesmo assim, Valdete acredita poder encontrá-lo em breve. “A vida nos separou e já tratou de nos unir. Porque não vou rever meu outro filho?”, questiona.
segunda-feira, 11 de julho de 2011
As órfãs de "Ivan, o terrível"
Maristela: túmulo pronto aguarda restos mortais da filha
Dilmércio Daleffe
Depois de chorarem diante da brutalidade do assassinato das jovens Iara Pacheco de Oliveira e Dimitria Laura Vieira, as famílias agora adoecem pelo constrangimento e humilhação em não poder enterrá-las. Descobertas numa fossa aos fundos do Colégio Estadual Vinicius de Moraes, em Campo Mourão, no último ano, as duas ossadas já foram enviadas à perícia, em Curitiba. Mesmo assim, os familiares não entendem o porquê de tanta demora. Maristela Pacheco, mãe de Iara, já até construiu o túmulo da filha. No entanto, a lentidão dos exames só aumenta sua angústia. “Não agüento mais tanto tempo. Sinto que estou morrendo. Quero apenas sepultá-la e acabar com este sofrimento”, afirma. No próximo mês, a descoberta da polícia completa um ano.
O drama vivido por dona Maristela teve início em janeiro de 2010, quando a filha saiu de casa com míseros R$50 para comprar pão. Ela nunca mais voltou. Depois disso, descobriu que restos mortais da melhor amiga da filha, Dimitria, que também estava desaparecida, haviam sido encontrados no colégio onde estudava. Dias depois veio a confirmação: outra ossada, desta vez, com pertences de Iara, também foi achada. A partir daí o mundo de Maristela partiu-se ao meio. A mulher que sempre lutou pelo bem estar da família, desmoronou.
Maristela tem hoje 52 anos. Ainda é nova, mas o fato a envelheceu décadas. Trata-se de uma mulher que a vida não poupou das dificuldades. Enfrentou diversos obstáculos culminando agora com o drama em não conseguir sepultar a filha. Nascida em Roncador, em 59, perdeu a mãe no próprio parto. O pai ela jamais conheceu. Foi criada pela parteira, que também morreu anos depois de seu nascimento. Trabalhou como bóia fria para sustentar a família e não teve tempo de estudar. Até hoje, é analfabeta. Casou-se, mas o marido, na época taxista, foi assassinado em Cascavel. Mais recentemente, perdeu parte da visão, reflexo do diabetes. Descobriu quase ao mesmo tempo o início de hanseníase e um câncer de pele. Definitivamente, a vida não foi gentil para dona Maristela.
Mas parece que o sofrimento ainda não acabou. Morando em uma casinha pequena, sem luxo, no antigo projeto mutirão, orgulha-se das paredes sem tinta. “Tá meio feia, mas foi construída com muito esforço. Aquela calçada ali ó, fui eu mesma quem construí”, mostra ela. Maristela agora vive com a neta de 16 anos. A garota veio para afastar sua depressão. “Já pus a corda em meu pescoço, mas desisti. Estou morrendo aos poucos. Quero viver a tempo de enterrar minha filha junto ao pai dela”, disse. Juntas, as duas passam o mês com R$550, o suficiente para apenas sobreviverem.
Dona Maristela disse que, se a renda tivesse dois zeros a mais, a perícia de Curitiba já havia saído há muito tempo. No mínimo respeitado o prazo dado pelo Instituto Médico Legal (IML), de Campo Mourão. “Eles disseram que eu ia poder enterrar a Iara com 60, no máximo 90 dias. Já faz quase um ano”, lembrou. Devido ao prognóstico, ela se adiantou, emprestou dinheiro do banco e construiu o túmulo da filha. Esta semana ela se encorajou e visitou o local. Nem no Dia de Finados foi ao cemitério. Mesmo sem o corpo da filha, ela se ajoelhou, acendeu duas pequenas velas, orou e chorou.
Dimitria
Marieta Ferreira mostra no rosto as marcas do sofrimento. Aos 58 anos de idade, ela também aguarda a conclusão dos exames da criminalística de Curitiba para enterrar a neta, Dimitria. Ela tinha apenas 16 anos quando desapareceu, ainda em 2008. Além da tragédia da perda, agora o drama da demora. “Não tenho nem palavras. Não está sendo fácil. Precisamos somente fazer o sepultamento para que ela descanse em paz”, afirma.
O caso da aposentada é um pouco pior. Se ela ainda vive a angústia da perda da neta através das mãos sujas de “Ivan”, encontra noutro neto de quase três aninhos, a alegria em viver. Pasmem, o netinho é filho do mesmo “Ivan”, fruto de um relacionamento com a filha de Marieta. Ou seja, ao mesmo tempo em que o suposto assassino tirou uma neta, lhe deu outro. Trata-se de uma tragédia do destino não mencionada nem mesmo nos melhores roteiros de cinema. “Me agarro em Deus todos os dias para que me de forças. A situação é difícil”, diz.
Marieta tem muitas semelhanças com Maristela, a começar com o nome, ambos se parecem. Ela também perdeu o marido há quase oito anos. Há 16 anos, uma de suas filhas, mãe de Dimitria também morreu. Ambas levam uma vida simples, com muitas dificuldades, são aposentadas e, juntas, lutam para conseguir realizar o enterro das meninas que “Ivan” levou. Elas são as órfãs de um assassino impiedoso. Um matador tão frio que queimou um dos corpos e jogou as cinzas na horta em que crianças da escola se alimentavam. Mas até quando vão ter que esperar?
De acordo com a assessoria de imprensa da Secretaria de Segurança Pública do Paraná, a demora para saber se os ossos são mesmo das duas garotas se deve a deterioração do material. Os restos mortais teriam sido, primeiramente, queimados, depois submersos em uma fossa. Aliado a tudo isso ainda soma-se o fator umidade. Diante do quadro, séries de baterias já foram realizadas, mas nada que obtivesse êxito. Nenhuma previsão foi dada sobre o caso.
Entenda o caso
Em agosto de 2010, duas ossadas foram descobertas numa fossa aos fundos do Colégio Estadual Vinicius de Moraes. Há indícios de que as vítimas foram esquartejadas antes de serem jogadas na fossa. As suspeitas recaíram sobre o zelador da unidade, Raimundo Gregório da Silva, 52 anos, mais conhecido como “Ivan”. Já na polícia, ele confessou os dois crimes. Quando Dimitria desapareceu, ela teria avisado a avó que iria viajar a Arapongas em companhia de Silva, a quem se dizia amiga. Procurado pela avó, Silva explicou que a garota havia fugido com o namorado para São Paulo (SP).
Tempos depois, a avó, familiares e amigos da estudante receberam mensagens de celular, supostamente enviadas por Dimitria. Informada dos recados, a polícia deu o caso por encerrado. Após analisar o inquérito, a polícia civil percebeu alguns pontos que não casavam e resolveu investigar novamente o zelador. Chamado para depor, Silva afirmou que considerava a estudante como uma filha e que constantemente a presenteava com roupas e calçados. Silva disse ao delegado que também recebia mensagens de Dimitria. No entanto, horas após o zelador ser liberado da delegacia, o pai de Dimitria recebeu uma mensagem de celular, supostamente enviada pela filha, avisando que ela estava na Itália e pedindo para que a queixa contra o zelador fosse retirada.
Avisada do fato, a polícia orientou o pai a retornar a mensagem, pedindo para que Dimitria respondesse três perguntas que só ela conhecia as respostas. A mensagem foi respondida, mas sem as respostas solicitadas. Só então os policiais perceberam que a resposta havia partido de um telefone situado no código de área 44. A Justiça expediu ordem de busca e apreensão na casa do zelador. Durante as buscas, a polícia encontrou o celular usado para enviar as mensagens e fotos de adolescentes nuas. Silva desapareceu, mas foi preso em Sarandi. Depois de encontrar roupas e documentos de Dimitria escondidos dentro do forro do colégio, a Polícia Civil acabou localizando uma fossa desativada ao lado da casa ocupada por Silva. Depois de retirar a terra e quebrar a tampa, que estava concretada, a polícia encontrou restos de duas ossadas.
Dilmércio Daleffe
Depois de chorarem diante da brutalidade do assassinato das jovens Iara Pacheco de Oliveira e Dimitria Laura Vieira, as famílias agora adoecem pelo constrangimento e humilhação em não poder enterrá-las. Descobertas numa fossa aos fundos do Colégio Estadual Vinicius de Moraes, em Campo Mourão, no último ano, as duas ossadas já foram enviadas à perícia, em Curitiba. Mesmo assim, os familiares não entendem o porquê de tanta demora. Maristela Pacheco, mãe de Iara, já até construiu o túmulo da filha. No entanto, a lentidão dos exames só aumenta sua angústia. “Não agüento mais tanto tempo. Sinto que estou morrendo. Quero apenas sepultá-la e acabar com este sofrimento”, afirma. No próximo mês, a descoberta da polícia completa um ano.
O drama vivido por dona Maristela teve início em janeiro de 2010, quando a filha saiu de casa com míseros R$50 para comprar pão. Ela nunca mais voltou. Depois disso, descobriu que restos mortais da melhor amiga da filha, Dimitria, que também estava desaparecida, haviam sido encontrados no colégio onde estudava. Dias depois veio a confirmação: outra ossada, desta vez, com pertences de Iara, também foi achada. A partir daí o mundo de Maristela partiu-se ao meio. A mulher que sempre lutou pelo bem estar da família, desmoronou.
Maristela tem hoje 52 anos. Ainda é nova, mas o fato a envelheceu décadas. Trata-se de uma mulher que a vida não poupou das dificuldades. Enfrentou diversos obstáculos culminando agora com o drama em não conseguir sepultar a filha. Nascida em Roncador, em 59, perdeu a mãe no próprio parto. O pai ela jamais conheceu. Foi criada pela parteira, que também morreu anos depois de seu nascimento. Trabalhou como bóia fria para sustentar a família e não teve tempo de estudar. Até hoje, é analfabeta. Casou-se, mas o marido, na época taxista, foi assassinado em Cascavel. Mais recentemente, perdeu parte da visão, reflexo do diabetes. Descobriu quase ao mesmo tempo o início de hanseníase e um câncer de pele. Definitivamente, a vida não foi gentil para dona Maristela.
Mas parece que o sofrimento ainda não acabou. Morando em uma casinha pequena, sem luxo, no antigo projeto mutirão, orgulha-se das paredes sem tinta. “Tá meio feia, mas foi construída com muito esforço. Aquela calçada ali ó, fui eu mesma quem construí”, mostra ela. Maristela agora vive com a neta de 16 anos. A garota veio para afastar sua depressão. “Já pus a corda em meu pescoço, mas desisti. Estou morrendo aos poucos. Quero viver a tempo de enterrar minha filha junto ao pai dela”, disse. Juntas, as duas passam o mês com R$550, o suficiente para apenas sobreviverem.
Dona Maristela disse que, se a renda tivesse dois zeros a mais, a perícia de Curitiba já havia saído há muito tempo. No mínimo respeitado o prazo dado pelo Instituto Médico Legal (IML), de Campo Mourão. “Eles disseram que eu ia poder enterrar a Iara com 60, no máximo 90 dias. Já faz quase um ano”, lembrou. Devido ao prognóstico, ela se adiantou, emprestou dinheiro do banco e construiu o túmulo da filha. Esta semana ela se encorajou e visitou o local. Nem no Dia de Finados foi ao cemitério. Mesmo sem o corpo da filha, ela se ajoelhou, acendeu duas pequenas velas, orou e chorou.
Dimitria
Marieta Ferreira mostra no rosto as marcas do sofrimento. Aos 58 anos de idade, ela também aguarda a conclusão dos exames da criminalística de Curitiba para enterrar a neta, Dimitria. Ela tinha apenas 16 anos quando desapareceu, ainda em 2008. Além da tragédia da perda, agora o drama da demora. “Não tenho nem palavras. Não está sendo fácil. Precisamos somente fazer o sepultamento para que ela descanse em paz”, afirma.
O caso da aposentada é um pouco pior. Se ela ainda vive a angústia da perda da neta através das mãos sujas de “Ivan”, encontra noutro neto de quase três aninhos, a alegria em viver. Pasmem, o netinho é filho do mesmo “Ivan”, fruto de um relacionamento com a filha de Marieta. Ou seja, ao mesmo tempo em que o suposto assassino tirou uma neta, lhe deu outro. Trata-se de uma tragédia do destino não mencionada nem mesmo nos melhores roteiros de cinema. “Me agarro em Deus todos os dias para que me de forças. A situação é difícil”, diz.
Marieta tem muitas semelhanças com Maristela, a começar com o nome, ambos se parecem. Ela também perdeu o marido há quase oito anos. Há 16 anos, uma de suas filhas, mãe de Dimitria também morreu. Ambas levam uma vida simples, com muitas dificuldades, são aposentadas e, juntas, lutam para conseguir realizar o enterro das meninas que “Ivan” levou. Elas são as órfãs de um assassino impiedoso. Um matador tão frio que queimou um dos corpos e jogou as cinzas na horta em que crianças da escola se alimentavam. Mas até quando vão ter que esperar?
De acordo com a assessoria de imprensa da Secretaria de Segurança Pública do Paraná, a demora para saber se os ossos são mesmo das duas garotas se deve a deterioração do material. Os restos mortais teriam sido, primeiramente, queimados, depois submersos em uma fossa. Aliado a tudo isso ainda soma-se o fator umidade. Diante do quadro, séries de baterias já foram realizadas, mas nada que obtivesse êxito. Nenhuma previsão foi dada sobre o caso.
Entenda o caso
Em agosto de 2010, duas ossadas foram descobertas numa fossa aos fundos do Colégio Estadual Vinicius de Moraes. Há indícios de que as vítimas foram esquartejadas antes de serem jogadas na fossa. As suspeitas recaíram sobre o zelador da unidade, Raimundo Gregório da Silva, 52 anos, mais conhecido como “Ivan”. Já na polícia, ele confessou os dois crimes. Quando Dimitria desapareceu, ela teria avisado a avó que iria viajar a Arapongas em companhia de Silva, a quem se dizia amiga. Procurado pela avó, Silva explicou que a garota havia fugido com o namorado para São Paulo (SP).
Tempos depois, a avó, familiares e amigos da estudante receberam mensagens de celular, supostamente enviadas por Dimitria. Informada dos recados, a polícia deu o caso por encerrado. Após analisar o inquérito, a polícia civil percebeu alguns pontos que não casavam e resolveu investigar novamente o zelador. Chamado para depor, Silva afirmou que considerava a estudante como uma filha e que constantemente a presenteava com roupas e calçados. Silva disse ao delegado que também recebia mensagens de Dimitria. No entanto, horas após o zelador ser liberado da delegacia, o pai de Dimitria recebeu uma mensagem de celular, supostamente enviada pela filha, avisando que ela estava na Itália e pedindo para que a queixa contra o zelador fosse retirada.
Avisada do fato, a polícia orientou o pai a retornar a mensagem, pedindo para que Dimitria respondesse três perguntas que só ela conhecia as respostas. A mensagem foi respondida, mas sem as respostas solicitadas. Só então os policiais perceberam que a resposta havia partido de um telefone situado no código de área 44. A Justiça expediu ordem de busca e apreensão na casa do zelador. Durante as buscas, a polícia encontrou o celular usado para enviar as mensagens e fotos de adolescentes nuas. Silva desapareceu, mas foi preso em Sarandi. Depois de encontrar roupas e documentos de Dimitria escondidos dentro do forro do colégio, a Polícia Civil acabou localizando uma fossa desativada ao lado da casa ocupada por Silva. Depois de retirar a terra e quebrar a tampa, que estava concretada, a polícia encontrou restos de duas ossadas.
sexta-feira, 8 de julho de 2011
Picareta a favor do crime
Criança olha entre o buraco construído pelos ladrões
Dilmércio Daleffe
Duas fileiras de tijolos e uma picareta. Isso foi o suficiente para que um bando ainda não identificado adentrasse ao interior do Banco Itaú, em Quinta do Sol, e roubasse todo o dinheiro de dois caixas eletrônicos. No entanto, ao invés de explosivos, apenas uma ferramenta de perfuração, sem barulho. A ação ousada aconteceu na madrugada de quinta-feira. Até ontem, a Polícia Civil não tinha nenhuma pista que indicasse o paradeiro dos meliantes. Acredita-se que a quadrilha seja de fora da cidade.
O plano foi pensado com todos os cuidados. Os bandidos utilizaram um terreno em obras ao lado do banco para quebrar duas paredes. A primeira da própria construção e a outra do prédio que abriga a agência. A picareta utilizada foi deixada para trás, uma espécie de recordação. Como praticamente não há vizinhos, somente comércio, ninguém ouviu o barulho. O bando também sabia que não existiam câmeras, apenas um alarme. Ele estava ativado, mas adentraram ao local exatamente atrás dos caixas, o que impossibilitou a leitura do sensor.
Sozinhos na agência, a ação durou pelo menos uma hora. A partir daí empregaram uma furadeira de precisão para perfurar a grossa espessura de aço dos dois caixas. Foram pelo menos 18 perfurações em cada uma, até construírem uma fenda de aproximadamente 20 centímetros de diâmetro. Os fios de aço resultantes do roubo ficaram jogados no interior do banco. O valor levado não foi divulgado. No entanto, informações da própria agência indicam não se tratar de uma quantia elevada. Sabe-se apenas que as notas não foram manchadas com aquela tinta avermelhada.
Buraco feito nos caixas eletrônicos
Ainda ontem, as filas foram grandes na agência. Como era o último dia do pagamento aos aposentados, todo o atendimento teve que ser feito nos caixas convencionais. Os dois eletrônicos estavam inutilizados. Problemas de segurança, transtornos no atendimento. A unidade roubada jamais havia sido alvo de assaltos. A paz acabou até mesmo na tranqüila Quinta do Sol.
Dilmércio Daleffe
Duas fileiras de tijolos e uma picareta. Isso foi o suficiente para que um bando ainda não identificado adentrasse ao interior do Banco Itaú, em Quinta do Sol, e roubasse todo o dinheiro de dois caixas eletrônicos. No entanto, ao invés de explosivos, apenas uma ferramenta de perfuração, sem barulho. A ação ousada aconteceu na madrugada de quinta-feira. Até ontem, a Polícia Civil não tinha nenhuma pista que indicasse o paradeiro dos meliantes. Acredita-se que a quadrilha seja de fora da cidade.
O plano foi pensado com todos os cuidados. Os bandidos utilizaram um terreno em obras ao lado do banco para quebrar duas paredes. A primeira da própria construção e a outra do prédio que abriga a agência. A picareta utilizada foi deixada para trás, uma espécie de recordação. Como praticamente não há vizinhos, somente comércio, ninguém ouviu o barulho. O bando também sabia que não existiam câmeras, apenas um alarme. Ele estava ativado, mas adentraram ao local exatamente atrás dos caixas, o que impossibilitou a leitura do sensor.
Sozinhos na agência, a ação durou pelo menos uma hora. A partir daí empregaram uma furadeira de precisão para perfurar a grossa espessura de aço dos dois caixas. Foram pelo menos 18 perfurações em cada uma, até construírem uma fenda de aproximadamente 20 centímetros de diâmetro. Os fios de aço resultantes do roubo ficaram jogados no interior do banco. O valor levado não foi divulgado. No entanto, informações da própria agência indicam não se tratar de uma quantia elevada. Sabe-se apenas que as notas não foram manchadas com aquela tinta avermelhada.
Buraco feito nos caixas eletrônicos
Ainda ontem, as filas foram grandes na agência. Como era o último dia do pagamento aos aposentados, todo o atendimento teve que ser feito nos caixas convencionais. Os dois eletrônicos estavam inutilizados. Problemas de segurança, transtornos no atendimento. A unidade roubada jamais havia sido alvo de assaltos. A paz acabou até mesmo na tranqüila Quinta do Sol.
Vocação para herói
Dilmércio Daleffe
Quantos meninos sonham ainda em ser bombeiros quando crescerem? Quantos jovens brasileiros se espelham na figura honesta de um bombeiro? Talvez seja no simples desejo em seguir a carreira, o mais puro reflexo da dignidade destes policiais. Afinal, a atividade não deixa ninguém rico. Não se tornam pop stars, não ganham fama de bonitões. Trabalham vocacionados unicamente com o propósito de servir, de serem prestativos, de salvar, ajudar e quem sabe um dia, se transformarem em heróis da vida real. Se até algum tempo imaginava-se profissionais apenas de combate ao fogo, hoje são muito mais que isso. São patrulheiros da vida, de motocicletas moídas nas esquinas da cidade, da imprudência constante nas ruas, da violência desenfreada na porta dos bares. Eles são os anjos da guarda da população. Hoje é o dia nacional do Bombeiro. Celebrem.
Há 30 anos como bombeiro em Campo Mourão, o Sargento Nivaldo Rodrigues, 50, dedicou a vida a corporação. Já viu de tudo na profissão e ainda se orgulha de, mesmo podendo se aposentar, continuar a servir. De fala fácil, veio de Londrina ainda na década de 80 para “montar” o quartel mourãoense. Chegou solteiro. Trabalhava na Vila Urupês, no antigo almoxarifado da prefeitura. Á noite dormia no hotel Santa Maria. Mas de grão em grão, viu a guarnição crescer. Hoje são 28 membros instalados na cidade. Faltam mais 20, mas é o que têm. Paciência. Nivaldo é o mais antigo bombeiro de Campo Mourão e já atuou em todas as frentes possíveis. O quartel está bem montado. A tarefa está cumprida.
Em sua jornada presenciou momentos felizes e tristes. Mas um deles, por coincidência do destino, afetou sua vida. No dia 27 de dezembro de 2007, ás 16 horas, um chamado de socorro foi atendido pelos bombeiros. Um acidente na área central da cidade entre uma moto e um caminhão. Naquele dia, Nivaldo era o chefe do socorro. Ele enviou uma ambulância com três homens ao local da batida. Minutos depois, ele recebe uma ligação de um de seus filhos. “Pai, você já está sabendo do acidente do Danilo com um caminhão”? Danilo era o outro filho, condutor da moto acidentada. Foi ali, naquele instante que o chão sumiu. Todo um filme passou pela cabeça. O medo o tomou. Ao chegar ao local, notou que a situação era grave. A ambulância não estava mais ali. “Se não fosse tão grave, meus companheiros ainda estariam fazendo os primeiros socorros. Mas eles não estavam mais”, disse. Seguiu até o hospital a tempo de ver os companheiros de trabalho retirarem o filho do veículo. Era mesmo grave. Dias depois, Danilo, um menino de apenas 19 anos de idade, morreu. Vida de bombeiro não é fácil. Os dramas da vida também ocorrem com eles. Afinal, são de carne e osso. Sorriem e choram.
Nivaldo lembra de pequenas ocorrências que lhe renderam boas recordações. Há quase 20 anos foi acionado até o Jardim Copacabana, aos fundos de uma residência, onde um cão havia caído em um profundo poço. Nada demais para os outros. Só quem tem um animal em casa para saber a importância no salvamento do seu bicho. E lá foi ele buraco abaixo. Com a ajuda de cordas chegou ao fundo e encontrou o animal bastante cansado, lutando pela vida. Existia água e ele resistiu. Nivaldo subiu com o cachorro nos braços e, logo que tomou liberdade, começou a correr e latir. “Parecia que ele estava me agradecendo. Para a família, foi um grande alívio”, lembra o bombeiro.
O grande Cezar
O “grande” Cezar Galvão de Lima, 41, e apenas 1,62 metro de altura, está há 16 anos atuando como bombeiro em Campo Mourão. Na verdade, ele entrou sem poder. Uma regra não mais existente nos dias de hoje, impedia o ingresso de soldados com menos de 1,65 metro de altura. Acontece que ele passou no concurso, fez todas as provas e exames, mas ninguém, ninguém mesmo, chegou a medir sua altura. “Algum tempo depois, somente com um outro caso como o meu, é que fiquei sabendo desta regra. Mas já era tarde demais. Eu já era bombeiro”, disse. O rapaz reprovado pela altura chegou a perguntar para Cezar quem era o seu advogado.
Diplomado em administração de empresas, ele jamais exerceu a profissão. Escolheu ser bombeiro. A prática é melhor que a burocracia. Na verdade nem ele sabe ao certo porque optou pela atividade. Possivelmente seja pela vocação, escondida na sua consciência. Já experiente, Cezar também ressalva o espírito de equipe dos bombeiros, diferente dos meandros militares. “Aqui todos são iguais numa ocorrência. Na hora, trabalhamos como uma família, sem subordinação. Prezamos unicamente a vida”, disse.
Casado e com dois filhos, Cezar se lembra de um trágico acidente próximo a Mamborê, quando morreram 18 pessoas. Era um caminhão carregado com feijão que bateu contra um ônibus de passageiros. Tinha restos de gente espalhados pela rodovia. Uma cena surreal, mas que também faz parte do cotidiano dos bombeiros. Na profissão nem todas as ocorrências tem final feliz. Porém ele lembra de uma boa história. Há alguns anos, uma jovem obesa – ela pesava cerca de 120 quilos – caiu num poço da cidade de Mamborê. Ao chegar no local, desceram as cordas e com elas, Cezar. Ao encontrá-la, fez os primeiros socorros com a ajuda de um morador local, que o ajudou no resgate. Como os três não podiam ser resgatados ao mesmo tempo, foi um de cada vez. “A vítima foi içada primeiro. Em seguida o civil pediu para sair. Ele estava com medo de ficar por último”, lembra. O bombeiro se orgulha do trabalho. Muitas vezes as pessoas procuram a unidade para agradecer os guerreiros. “Isso é muito gratificante”, diz. Ah, já ia esquecendo: a “gordinha” teve final feliz.
O chefe da turma
Quem administra a luta diária dos bravos bombeiros é o Capitão Leandro Calegari, 15 anos de profissão. Trata-se de um “menino” de 34 anos. O cara é muito novo, mesmo. Medindo as palavras, as usa com cautela, embora saiba o que diga. Veio de Cianorte há quase seis anos. Hoje, se orgulha do quartel e diz que a sua turma está preparada para encarar qualquer desafio, mesmo incêndios em altos edifícios da cidade. Calegari frisa que os soldados fazem hoje um trabalho bastante preventivo, o que vem dificultando o início de incêndios.
Além de combater o fogo, tirar “gatinhos” de árvores e apanhar cobras em terrenos baldios, a figura do bombeiro vai muito além disso. Salvar vidas é o grande desafio. A maioria das ocorrências hoje, está ligada a acidentes no trânsito. Para isso, incansáveis treinamentos ocorrem regularmente para que os membros da equipe consigam prolongar a saúde dos acidentados até o hospital. Não bastasse todo o trabalho, a guarnição de Campo Mourão ainda é responsável por outros 24 municípios da região. “Para estar aqui a pessoa tem que ser vocacionada, ser bastante prestativa, gostar de ajudar”, diz o Capitão. Para entrar nos quadros da profissão basta passar em concursos abertos pelo governo. O salário inicial, no Paraná, gira em torno de R$2,1 mil. Isso hoje. Até meados da década de 90, não passava de dois salários mínimos.
sexta-feira, 1 de julho de 2011
Tristes histórias de um albergue
Dilmércio Daleffe
Com a chegada do frio intenso, aumenta a procura no albergue José do Patrocínio, em Campo Mourão. São cerca de 20 a 30 pessoas abrigadas diariamente. Elas carregam consigo histórias tristes, de abandono, alcoolismo, incompreensão pela vida. São seres humanos isolados, quase sempre sem compaixão pelos familiares. Em muitos casos, os albergados escondem a verdade deles mesmos. Têm medo de aflorar seus medos e dividir o alto peso da cruz que carregam. Chegam a ser invisíveis aos olhos do mundo.
Laércio de Oliveira é um senhor de 54 anos de idade. Não é velho, mas os estragos que vem proporcionando a si próprio, através do álcool, envelheceram seu rosto. Ele foi encontrado dormindo na rua, ao relento em plena noite fria, apenas com uma coberta fina. Mesmo tendo o amparo de familiares, segundo informa o pessoal do abrigo, ele prefere se diagnosticar como “sozinho”. Já foi cobrador de empresas, morou em Curitiba por 15 anos e, ao voltar a Campo Mourão, ganhou a vida vendendo frutas e hortaliças de casa em casa, em uma bicicleta cargueira.
Hoje, confessa que não agüenta mais beber. “Parece que eu não gosto mais de mim”, afirma. Deitado numa cama limpa, com cobertores aos montes e comida quente três vezes ao dia, ele está salvo do frio. Mas isso não basta. Laércio está muito doente. Com uma imensa ferida no pé, ele mal consegue se levantar. Ontem, o pessoal do abrigo é quem lhe deu banho. “Parece que o pé dele já está podre. Não sou médico, mas pelo que vi, é caso de amputação”, diz Jeferson Aparecido Alves, um voluntário que vem trabalhando para o albergue. Foi ele quem fez a limpeza da ferida.
Seo Laércio só poderá permanecer no albergue por mais um dia, assim é a norma. Depois disso nem ele sabe para onde irá. Ele parece estar numa espécie de alucinação, pois não tem noção do que fazer. “Não sei o que fazer. Não tenho escolha nenhuma. Talvez a melhor saída seria ser internado no asilo. Não sei mais cuidar de mim”, disse. De acordo com Moacir Moreira do Amaral, monitor do albergue, o pessoal da prefeitura ficou de pegar o albergado, ontem, para levá-lo até o hospital.
A manutenção do abrigo é feita por várias entidades da cidade, entre elas os Rotarys, o Lions, Igreja Católica e Igrejas Evangélicas. Além delas, o município participa com recursos de quase R$2 mil ao mês, informa José Américo dos Santos, presidente do albergue. Todos os valores são usados para as refeições, limpeza, lavanderia, água e luz. Não fosse o carinho dos dois únicos monitores do abrigo, Moacir e Jeferson, o local não seria tão cuidado como está.
O mistério de Waldomiro
“Fui muito bem recebido aqui. Tinha comida e cama quentinha o tempo todo. Nem vi o frio de ontem”, afirma Waldomiro Ferreira. Aos 82 anos de idade, ele conta uma história digna dos roteiros de cinema. Morador de Coxim, no Mato Grosso do Sul, diz que conheceu um sujeito na porta de sua casa se dizendo ser de Campo Mourão. Pedindo ajuda, o cara mostrou uma recente cirurgia, do peito até a virilha. Com pena, seo Waldomiro o colocou para dentro da residência. Lá permaneceu por seis meses. O sujeito dizia precisar ficar em Coxim até que a operação cicatrizasse bem. “Como ele não tinha dinheiro nem onde ficar, o deixei comigo. Sou humano e acreditei nele”, disse.
Waldomiro mora sozinho desde 1995, depois que a mulher e os quatro filhos morreram num acidente de carro. Após abrigar o sujeito, o suposto mourãoense decidiu voltar ao Paraná e, com ele, trazer o aposentado. De ônibus, ao chegar em Goioerê, Waldomiro acordou. Na poltrona vizinha não havia mais o, até então, amigo. Ele havia ido embora, fugido. Desapareceu ainda com a carteira e todos os documentos do matogrossense.
O coletivo seguiu até Campo Mourão. Sem saber o que fazer, Waldomiro foi levado até o albergue José do Patrocínio, onde contou toda a história. Após 18 dias na cidade, ontem ele recebeu o dinheiro de sua aposentadoria, comprou a passagem e foi embora. Pernambucano de Exu, ele deixou o estado ainda no colo dos pais, para ser criado em meio aos seringais do Acre. Por isso gosta de contar histórias. Antes de ir, deixou um mistério: segundo o aposentado, no dia 28 de julho voltará a Campo Mourão para trazer uma surpresa. Ninguém sabe do que se trata. Mais do que isso, ele não quis dizer o que significam as três letras impressas em sua jaqueta J.J.S. “Esta é a assinatura que levo por toda a minha vida. Em julho vocês saberão o que elas querem dizer”, disse.
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