sábado, 9 de fevereiro de 2013

2013: o ano em que o mosquito acabou com o carnaval

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Dilmércio Daleffe

José Luiz Lutz sempre curtiu o carnaval. Ainda na década de 90, ao lado da esposa, Iramir, não perdia uma só noite de folia. Naquela época os foliões se reuniam no Peabiru União Clube e a farra terminava somente depois do sol raiar. Ele e a mulher, inclusive, receberam seis troféus de casal folião na cidade. Tempos de ouro que não voltam mais. Mas este ano algo mudou. José não verá o carnaval. Peabiru está calada. A tristeza imperou devido a um inseto. Uma porcaria de mosquito. Um bicho quase imperceptível, mas que causou uma tragédia na cidade. Transmissor da dengue, ele é responsável pela aparição de 30 casos da doença, por dia. Uma calamidade pública responsável até por uma morte. Sensibilizado por uma recomendação da Secretaria Estadual de Saúde, para que evitasse eventos com aglomeração humana, o prefeito Claudinei Minchio decidiu cancelar o carnaval.

A decisão tomada agora vem cercada de polêmica. Isso porque parte das pessoas não aceita, enquanto outras aprovam a medida. O aposentado Leonildo Simoneli aprovou a atitude da prefeitura. Para ele, a saúde pública tem que estar em primeiro lugar. “Acho bom não ter a festa. Penso que a dengue poderia ser levada para outras cidades da região”, disse. Outro homem que preferiu não ser identificado, relatou que o mosquito nada tem a ver com o carnaval. Ele acredita que o inseto não seria capaz de provocar picadas durante à noite. Além disso, ultimamente, a folia, segundo ele, vem atraindo delinqüentes e gente que não presta. “Acho bom não ter a festa”, revelou. Os dois entrevistados já tiveram dengue.

Polêmicas à parte, a questão é que a cidade sempre conviveu com o carnaval. Uma paixão sincera e de longa data. A folia é comemorada antes mesmo do município ser emancipado. Depois, as famílias passaram a pular no Peabiru União Clube – PUC. Naquele tempo, ainda tocavam as marchinhas. Não existia a violência dos dias atuais e qualquer abraço entre as pessoas era motivo para a alegria. E era neste contexto em que José e Iramir tornaram-se conhecidos pela felicidade de brincar o carnaval. São hoje personagens épicos de uma festa memorável.

Cleonice Lazaretti Cabreira, chefe da divisão Cultural da prefeitura de Peabiru, conta que os bailes de salão foram terminando na época em que os foliões passaram às ruas. Isso aconteceu em 2002, quando a prefeitura realizou o carnaval na Avenida Raposo Tavares. Foi então que blocos surgiram, iniciando um movimento existente até os dias de hoje. Ou melhor, até 2012, mas que voltará em 2014 – se a dengue der uma trégua. Um dos blocos precursores na cidade foi os “Cara de Pau”.

Anualmente a festa de rua dura quatro dias. São cerca de 15 blocos atraindo cerca de 3 mil pessoas à área central da cidade. Mais que uma festa, trata-se de um evento familiar. São centenas de pais e mães levando seus filhos. Reflexo de uma tradição antiga, existente apenas em Peabiru. Hoje a cidade tem o melhor carnaval da região, não dando chances, nem de perto, para Campo Mourão. Entre os blocos da cidade destacam-se o “Chuta que é Macumba”, “Únicos”, “5 C”, “Monumentos da Avenida”, “Skolpira”, “Brahmaloucos”, “Os Xurupinga”, “Os Pai da Pinga”, “Os Pudim”.


Farra terminava somente depois do sol raiar.

Juliano Steph Scarabel é um dos maiores foliões da atualidade em Peabiru. Criador do bloco “Os Únicos”, ele também colabora na organização do evento. Aos 33 anos de idade, vê com tristeza a falta do carnaval. Mas entende que trata-se de saúde pública. “Será um vazio. Mas para o bem de toda a cidade”, disse. Para o próximo ano ele até sugere a criação de um novo bloco, “Os Dengosos”. Falando nisso, Tanto Cleonice como ele já foram picados pelo mosquito da dengue. Nessa história, inclusive, todos os entrevistados tiveram dengue. Talvez isso resuma a situação no município e, consequentemente, suas razões para o cancelamento do carnaval. Mas se vale como consolo, existe uma grande possibilidade, em breve, da prefeitura realizar um carnaval fora de época. E nessa, mosquito não será convidado.

Dengue, o que é?
Dengue é uma enfermidade causada por um vírus e tem como hospedeiro o homem, o qual apresenta manifestação da infecção num período de aproximadamente sete dias. O vírus da dengue, provavelmente, se originou de vírus que circulavam em primatas na proximidade da península da Malásia. O crescimento populacional aproximou as habitações da região à selva e, assim, mosquitos transmitiram vírus ancestrais dos primatas aos humanos que, após mutações, originaram nossos quatro diferentes tipos de vírus da dengue. A febre hemorrágica da dengue atinge pelo menos 500 mil pessoas/ano, apresentando taxa de mortalidade de até 10% para pacientes hospitalizados e 30% para pacientes não tratados. Mas para que o mosquito transmissor seja controlado é necessário que haja educação nos hábitos do terceiro mundo. Ou seja, as larvas do mosquito se proliferam basicamente na desorganização da população, como em quintais, terrenos baldios ou lixões. De uma certa forma, a doença só continua a existir aceleradamente pela má educação das pessoas.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Leonilda e seus dois Josés



Dilmércio Daleffe

Nesta história, definitivamente, coincidências não existem. Leonilda Sebastiana Chamberlain ainda era menina no ano de 57. Tinha apenas 13 anos quando começou a namorar José Macedo. Ela morava com os pais numa fazenda nos rincões de Terra Boa. Já José, aos 16 anos, residia em outra propriedade, onde é hoje o município de Farol. Aproximadamente 100 quilômetros separavam o casal. Mas como se gostavam, José pegava a magrela e andava pelas estradas ainda sem asfalto, sob sol e chuva. Em muitos trechos havia somente uma picada aberta. Mas como era o primeiro amor de sua vida, valia cada esforço, cada pedalada.

Leonilda e José Macedo: O amor brotou e em dobro 

Acontece que a vida traça rumos misteriosos. Ao mesmo tempo em que Leonilda namorava José Macedo, surgiu um outro José, agora o Silva. Ele mandava cartinhas românticas, falava de seus cabelos e dizia gostar dela. Mais tarde, os pais da menina e de José Silva, arranjaram um casamento entre os dois. Triste do outro José, o Macedo, que nada sabia. E em sua bicicleta, ele continuava a andar o trajeto por quase três anos atrás daquela que, para ele, seria a mulher de sua vida. Mas um dia, ele chegou até a moça e recebeu a fatídica notícia: “Está tudo acabado. Vou me casar com um outro rapaz”. Ele, sem entender, retornou destruído. Foi do paraíso ao inferno em poucos segundos. A menina de olhar profundo e sincero, casou-se com outro. Na verdade, Leonilda tinha dois Josés em sua vida. Gostava do Macedo, mas foi influenciada a casar-se com Silva.

Leonilda era uma moça da roça. Até se casar, morava com os pais na área rural. Em uma grande fazenda, vivia inocentemente. Não tinha grandes vaidades. Lavava roupas para os peões, colhia café, fazia pão e ajudava os pais. Era uma época saudável, sem malícia, sem devaneios. Mas um dia, botou aliança na mão e foi embora para a cidade grande. Ao lado de José da Silva, buscou São Caetano do Sul, ainda aos 17 anos.
José era mais velho. Chegando à cidade, arranjou emprego e logo “embuchou” Leonilda. Tiveram quatro filhos, todos criados com muito amor pela mãe. Mas inventou de beber e não quis mais parar. Muitas vezes ficava sem emprego, adotando os botecos como lar. Em casa, transformava o ambiente num inferno. Batia em Leonilda, rasgava suas roupas e a humilhava trazendo mulheres da vida. Tudo ocorria em frente aos filhos. Não foram poucas as idas da esposa ao hospital. Com hematomas, ela era espancada calada. Nunca o denunciava. Pouco a pouco o destino da mulher inocente vinha sendo traçado pelas mãos doentias de um alcoólatra.

Mais ou menos 35 anos depois de casados, a convivência terminou numa noite inquietante. Silva chegou em casa mais uma vez embriagado, agressivo, aterrorizador. Foi até a cozinha, deixou o gás do fogão vazar e quando ia explodir tudo, com a mulher e as crianças, foi impedido. José Carlos da Silva, um dos filhos, ainda lembra a cena. “Nós o expulsamos. Não permitimos mais que ele chegasse perto de nós”, revelou. E assim aconteceu. Cerca de sete anos mais tarde, chega a notícia de que José da Silva havia morrido vítima do álcool. A história do menino que roubou o lugar do outro José, que casou com Leonilda e a levou para São Paulo, chegava ao fim.

Coincidências não existem

Após ficar sem marido por 18 anos, Leonilda continuava sua jornada sozinha, mas voltada aos filhos. Todos eles, sem exceção, são muito apegados a ela. Dona de sua vida, decidiu em outubro de 2012 vir até Campo Mourão visitar uma irmã. Chegou cedinho à rodoviária e, com ajuda do filho, procurou a casa da parente. Após se perder, encontrou o endereço no Jardim Bandeirantes. E foi ali que tudo aconteceu. Ao ser recebida, ainda na garagem, o cunhado percebeu que, na calçada, um homem conhecido passava. Ao olhar para trás, Leonilda notou que o homem em questão era José Macedo, o primeiro José, o primeiro amor de sua vida. Mas como aquele homem apareceu horas depois da mulher chegar a Campo Mourão? Isso nem ele sabe explicar.

Casal acabou de voltar da lua de mel

Acontece que Macedo faz caminhadas diariamente pelas manhãs. Cada dia numa região diferente da cidade. Mas naquele 9 de outubro de 2012, ele decidiu andar pelo Jardim Bandeirantes. Passou no exato momento em que Leonilda chegava. Talvez até passasse despercebido. Mas como foi que o cunhado o reconheceu? Ninguém explica.

Macedo então foi convidado a entrar, deu um abraço na ex-namorada e iniciou uma conversa sincera. Sentados, falaram de suas vidas após 52 anos sem se verem e ele então perguntou: “Mas porque depois de tanto tempo sozinha você não casou”? Ela então respondeu: “Porque tava esperando você me pedir em casamento”, disse sorrindo.

José Macedo contou a ela que naquele dia, depois de levar o fora, ainda no ano de 1960, voltou arrasado pra casa. Ficou dias desconsolado. Mas o tempo passou e encontrou outra namorada, com quem casou e viveu por 51 anos, tendo sete filhos. Mas quis o destino que ele encontrasse com Leonilda somente agora, dois meses depois que sua esposa também falecesse. Agora viúvos, os dois não perderam tempo e já se casaram em dezembro, 52 anos depois de terem rompido o namoro. Coincidências não existem.

Hoje, os dois moram juntos. Acabaram de voltar da lua de mel. Ela decidiu permanecer em Campo Mourão. Os filhos aceitaram a união. Depois de tanto tempo separados, Leonilda acabou confessando que entre os dois Josés de sua vida, acabou optando pelo errado, e pagou por isso. A duras penas, sofreu por 35 anos. Mas agora está de volta. Reconquistou o grande amor, pediu perdão, reconheceu seus erros e está amando. “O amor brotou e em dobro”, afirmou a menina de 68 anos. E ainda existe alguém que irá dizer que coincidências existem? Ou os destinos eventualmente desviados são recolocados nos trilhos por obra de Deus? Ninguém sabe.