segunda-feira, 5 de março de 2012
Amarildo foi "engolido" pela própria inocência
Dilmércio Daleffe
Amarildo Araújo Pereira tinha apenas 19 anos e como sonho queria ajudar a mãe. Veio de uma família de trabalhadores pobres, da lavoura, mas que sempre cultuavam os caminhos do bem. Nasceu com um distúrbio mental, descrito pelo irmão apenas como uma “mancha” no cérebro. Não fazia mal a ninguém, tão pouco a ele próprio. Inocente, decidiu sair à noite para dar uma volta na cidade. Naquela dia, 17 de fevereiro, de acordo com familiares, foi abocanhado por falsos colegas que se intitulavam amigos da família. Já, dentro de um bar, segundo a mãe Aurinete, foi forçado a beber. Enquanto um coro gritava “bebe”, Amarildo ingeria quase um litro e meio de cachaça. Segundo o irmão, foram oito copos americanos de álcool. O corpo franzino do rapaz não suportou. Levado já desmaiado a sua casa, morreu 20 minutos depois, ainda dentro da ambulância. Amarildo encerrou sua vida sem conseguir ajudar a mãe. Hoje ela chora a perda do filho.
Na pequena Rancho Alegre, município distante 81 km de Campo Mourão, não se fala em outra coisa. Para a população o caso resume-se a uma barbárie jamais vista. O assunto é tão forte que as pessoas mal querem comentar. Os que falam, não se identificam. No entanto, para a família da vítima, o fato não pode ser esquecido. Aurinete quer justiça. “Eles tiraram uma vida. Vão ter que pagar pelo que fizeram”, afirma. Ela já não possui mais lágrimas. Descreve o ocorrido com sofrimento, mas sem chorar. Sua dor já extravasou a alma.
A família mora numa pequena casa em alvenaria azul, na Rua Aracajú, número 25. Apenas três cômodos para abrigar mãe e cinco filhos. A vida é bastante modesta. Difícil a cada dia, mas o suficiente para não passarem fome. Viúva, Aurinete recebe pensão do marido. Os outros filhos, com idade entre 15 e 26 anos, estão desempregados. Mês a mês, o sufoco está presente. Mesmo sendo um imóvel simples, é honesto, próprio e o bastante para a família. Conta a mãe que ali sempre foram felizes. Agora não mais. O sorriso de Amarildo foi embora.
O rapaz vivia como numa fábula. Embora tivesse um pequeno distúrbio, levava a vida como todos os outros. Cresceu vendo a mãe e o pai trabalhar na roça. Transformou-se num trabalhador de verdade. Para ajudar na casa, sempre buscou alguns biscates. Há algum tempo chegou ter carteira registrada. Ele fazia limpeza em máquinas agrícolas e estava contente. Mas por algum motivo decidiu sair da empresa. Mais recentemente, conseguiu uma data vazia onde fez uma plantação de verduras. Todos os dias voltava trazendo comida à mãe. Ela se orgulhava disso. Devido ao seu problema, Amarildo media um metro e trinta de altura. Tinha um corpo franzino e, vez em quando, mostrava crises de nervosismo. Nunca encontrou os caminhos errados e adorava os seis irmãos. Seu erro foi ser inocente, um ser indefeso. No entrave entre céu e terra, acabou engolido por demônios.
Segundo relatos do irmão Élcio, no dia em que morreu, Amarildo foi cedo até sua horta. Varreu, plantou e podou. Voltou para casa com verduras. Orgulho para mãe. Depois disso limpou o quintal e almoçou. Permaneceu toda a tarde em casa, na companhia da família. Á noite, por volta da 10h, saiu. Passou em frente a um bar e acabou sepultando sua história. Élcio diz que algumas pessoas o chamaram para beber. Ele teria aceitado, embora dissesse estar sem dinheiro. Mas os outros o incitaram. Disseram que dinheiro não era problema. O rapaz então bebeu. Quando não agüentava mais álcool, tentou ir embora, mas foi impedido. Ofereceram mais cachaça e ele, inocentemente, bebeu. Élcio afirma que o local estava lotado. No entanto, apenas quatro clientes teriam sido os responsáveis pela bebedeira. “Essas pessoas são do nosso convívio. São amigos da família. Até agora ninguém veio se desculpar”, disse.
O rapaz de 19 anos teve a morte descrita como “causa desconhecida”. Por este motivo o corpo pode vir a ser exumado. “Temos que saber as causas de sua morte. Se for preciso haverá uma exumação”, disse o delegado de polícia Fábio Machado dos Santos. Segundo ele, o caso ainda está sendo investigado. O policial também confirmou saber da existência de um suposto vídeo que mostraria cenas de Amarildo sendo “induzido” a beber no dia de sua morte. “Tudo será analisado”, disse.
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