Em 30 anos, a pequena Altamira do Paraná já conviveu com quatro cemitérios – sendo um deles um protótipo. A situação chegou ao ponto de, em alguns casos, famílias terem realizado remoções de ossos por duas vezes. Tudo seria um verdadeiro drama. Mas a população aprendeu a brincar com a realidade.
Dilmércio Daleffe
Aos 65 anos Dilair dos Santos sai diariamente da modesta casinha de alvenaria para sentar-se em um banquinho improvisado. Com idade avançada, tornou-se um prazer parar as atividades do dia e descansar um pouco. Mas o cenário é de horror. O banco está ao lado dos restos de um antigo túmulo. Até a cruz em concreto lá existe. Dilair mora no conjunto Vila Esperança, em Altamira do Paraná, num terreno íngreme, onde até pouco tempo era o cemitério da cidade. Ao lado de sua residência, uma mulher que preferiu não ser identificada, relatou que há cinco anos, quando perfuravam uma fossa, retiraram o crânio de um defunto. “Hoje dou risada. Mas no dia assustou um pouco”, conta. Pior para o servidor Márcio Alves da Silva. Ao fazer o muro, encontrou um caixão. “Avisei a prefeitura e eles logo vieram retirá-lo”, disse.
Drama ou não, as famílias são personagens de uma situação bastante peculiar na pequena Altamira do Paraná, cidadezinha de pouco mais de quatro mil habitantes, distante 130 Km de Campo Mourão. Lá, mesmo com uma incidência média de um morto a cada 60 dias – segundo dados de uma das duas funerárias locais – a população já foi testemunha da implantação de quatro cemitérios ao longo de seus 30 anos de emancipação. Detalhes curiosos de um verdadeiro roteiro de cinema. É que, por causa de todo o enredo, muitas famílias já tiveram o constrangimento de remover restos mortais de parentes por até duas vezes.
O primeiro cemitério de Altamira do Paraná foi construído ainda na década de 60, quando o local era apenas um distrito. Mas em 1983 acabou sendo desativado para a construção de um hospital. Os restos mortais que ali estavam foram removidos a outro local. Ou seja, ao segundo campo santo. Na verdade, trata-se do terreno onde hoje reside dona Dilair, o servidor Márcio e a moradora que não quis ser identificada. Os sepultamentos realizados ali ocorreram de 1983 até meados de 1997. Acontece que não foi um bom endereço aos falecidos, principalmente, por ser inclinado demais. Além disso, a cidade começou a crescer em sua direção.
Com o tempo, o campo santo estava entre as casas e, ainda, sem nenhuma espécie de isolamento, sem muro nem nada. Ou seja, vivos e mortos começaram a misturar-se. O prefeito da época então adquiriu um novo terreno a fim de mudar o cemitério. Este seria o terceiro. Mas como o processo demorou e o tempo passou, o prefeito terminou seu mandato sem concluí-lo. Um novo gestor assumiu a prefeitura. Mas ao invés de dar prosseguimento ao projeto, optou desta vez por um novo terreno: o quarto cemitério. Trata-se do atual São João Batista, que funciona desde 1999 e já abriga mais de 300 túmulos.
No terreno que serviu para o segundo cemitério hoje moram quase vinte famílias. O espaço foi cedido pela prefeitura a moradores humildes, com baixa renda. Mas as casas foram construídas sobre antigos túmulos. Restos mortais continuam aflorando nos quintais das casas. Mas nada disso assusta os moradores. Acostumados com a situação, eles aprenderam a rir diante do cenário de horror.
Outro aspecto interessante de Altamira é o fato da cidade de quatro mil habitantes manter duas funerárias – Campo Mourão possui apenas uma. De acordo com Lucas Aparecido Pachinski, filho de um dos proprietários, vez em quando uma só pessoa morre num período de dois meses. “Se dependêssemos só da venda de caixões certamente não sobreviveríamos”, disse. Segundo ele, o negócio continua porque fazem planos funerais, o que movimenta financeiramente o estabelecimento.
Mortos passaram por duas remoções
Com as mudanças de cemitérios, várias famílias tiveram que fazer a remoção dos restos mortais de seus entes, “queridos ou não”, por até duas vezes. Mesmo não querendo ter o nome revelado, uma mulher disse que removeu os ossos do pai ainda na década de 80, do primeiro para o segundo cemitério. “Lembro que foi num carrinho de mão”, disse. Anos mais tarde, já depois de 2000, os restos mortais saíram novamente para o atual campo santo. “Ele quase não teve descanso”, brincou ela. Um servidor público que também não quis ter o nome divulgado, informou que o seu sogro passou pelo mesmo transtorno. “Ele estava enterrado no primeiro local. Retiramos seus ossos e passamos para o segundo. Há cerca de dez anos, fizemos outra remoção, agora para o São João Batista”, disse. Nos dois casos, os falecidos agora estão em paz. Pelo menos até que um quinto cemitério saia do papel.
Com relação a essa linda foto do Cemitério, tomei a liberdade de postá-la em meu Facebook com o seguinte comentário:
ResponderExcluirEste é o lugar em que todos, absolutamente todos nós seres mortais, ricos e pobres, brancos e nêgros, poderosos, políticos, reis, presidentes, famosos e anônimos, iremos habitar para sempre e nesta viagem NADA LEVAREMOS ! (Ricardo Coelho).
Pababéns pelo Blog,
Ricardo Coelho