Pedro teve uma história de sofrimento. Perdeu a família e nunca mais viu as filhas. Ficou sozinho no mundo. Foi acolhido pela mãe, duas irmãs e uma sobrinha. Todas morreram. Jogado às ruas, tornou-se alcoólatra e indigente. Como um verdadeiro mendigo, Pedro perdeu até sua sombra.
Dilmércio Daleffe
Pedro Olegário da Silva Borges já foi o cara. Teve bons empregos, casa, família, felicidade. Trabalhador desde os tempos em que era criança, orgulha-se de sua trajetória. Mas o destino foi cruel demais. Pregou-lhe algumas peças difíceis de acreditar. Tanto sofrimento acabou por destruí-lo. Sem casa, família e emprego, Pedro foi convidado às ruas. Tornou-se indigente. Dormia sob marquises e bebia diariamente. Jogou-se no abismo do álcool. Pedro até entende o que aconteceu. Só não admite as mortes pelas quais passou. Todos a quem recorreu acabaram morrendo. Um relato inacreditável.
Muitas são as histórias, mas poucas como as de Pedro. Seu drama começou por volta de 2002, época em que morava e cuidava da mãe de 88 anos. Naquele tempo, já havia tido duas mulheres e, consequentemente, duas filhas, uma com cada companheira. Mas quis a vida que Pedro se desprendesse dos relacionamentos. Nunca mais viu as filhas. A mãe estava muito doente, mas era ela quem acolheu o filho. Pedro fazia pequenos bicos e mal tinha renda para se manter. A mãe morreu no mesmo ano. O filho ficou sozinho no mundo.
Foi então que uma irmã, Tereza, solidária com a situação de Pedro, o convidou para morar em sua casa. Numa residência simples, sem luxo, ele permaneceu por dois anos. Mas Tereza caiu doente e morreu em 2004. Angustiado, até quis ir embora, mas a sobrinha, Ana Sila, insistiu que ficasse na casa. Ainda solteira, aos 40 anos, a moça também ficou enferma, vindo a morrer em 2006. Pedro não acreditou no que acontecia. Era sua sina. “A maldição de Pedro Borges”.
Novamente sozinho Pedro foi, agora, chamado a morar com a irmã mais velha, Dinaura, em Luiziana. Ficou na cidade apenas dois anos. Em 2008, a irmã faleceu. Mais uma vez, quem socorreu Pedro acabou morrendo. A sina continuava. Ele retornou a Campo Mourão, trabalhando como caseiro em pelo menos duas chácaras. Os empregos não duraram. Passou a fazer bicos, como limpar terrenos baldios. Mas sem casa e sozinho, o mundo deu as costas a Pedro. Desanimado, caiu definitivamente pelo álcool.
Passou a beber pelas manhãs. À tarde, já estava em outra dimensão. Esqueceu-se das horas e não mais se preocupou em dormir. Até banho não tomava. Pedro havia perdido até sua própria sombra. Não tinha auto estima, muito menos compaixão de si mesmo. Deixou a barba crescer, suas roupas transformaram-se em trapos e, até os cães de rua eram melhor tratados. Muitas foram as humilhações, conta ele. “O banco da praça era meu escritório”, disse.
Pedro jamais estudou. Hoje, aos 59 anos, mostra as mãos calejadas pelo trabalho. Já fez de tudo. Mesmo não gostando de lembrar do passado, admite que foi um tempo de sofrimento. Sua decadência moral durou menos de dois anos. Foi quando se esqueceu de Deus. Ia a igreja apenas para dormir em suas escadarias.
Mas nem tudo dura para sempre. Hoje, depois de receber ajuda, saiu das ruas. Está bem vestido, com astral elevado. Há mais de 90 dias não ingere álcool. Depois de uma aventura sem igual, disse com a voz amarrada que gostaria de rever as filhas. Uma tem 35 e a outra 30. Faz mais de 20 anos que não as vê. “Eu devo ter netinhos e não os conheço”, disse. O destino é mesmo incerto. Depois de tudo o que passou, Pedro sobreviveu. Quem terá coragem em dizer que não encontrará seus netos?
Nenhum comentário:
Postar um comentário