segunda-feira, 31 de outubro de 2011

A perseverança de Lucy Pianoski

Lucy Pianoski é uma mulher guerreira. Trabalha informalmente há mais de 26 anos e conseguiu a independência financeira sem a ajuda de nenhum marmanjo. Tem casa e moto, é manicure, atende encomendas de comida, faz artesanato e, ainda, dedetiza ambientes de vez em quando. Viva a liberdade.



Dilmércio Daleffe

Lucy Pianoski acorda diariamente às 6 horas da manhã. Ela sabe que quanto mais cedo lavar o rosto, mais tempo terá ao trabalho. E o seu pensamento consiste apenas nisso. Aos 47 anos de idade, aprendeu não depender de nenhum homem. Lições do passado, sabedoria no presente. Sem arrependimentos, meteu mãos e pernas no trabalho. A jornada é contínua desde os seus 21. Incansável, ela já sustentou um filho, atualmente casado. O outro ainda está na faculdade, em Guarapuava. Ela poderia servir de exemplo a milhares de outras brasileiras, guerreiras que sobrevivem do próprio esforço sem a ajuda dos ex-companheiros. Poderia também continuar casada, dependente do marido. Mas preferiu pela liberdade e acabou vencendo pela escolha. Se o país fosse infestado de “Lucys”, a realidade seria diferente.

Bem cedinho, ainda com os primeiros raios de sol, Lucy inicia o preparo para a entrega de várias encomendas da semana. Comida. Faz de tudo um pouco. Tortas de maçã, comida japonesa, pão de queijo, bolo gelado, além de mais uma dezena de itens. Quem prova, repete. Quem compra, faz novo pedido. Entrega em toda cidade com a sua moto preta, sempre limpa, impecável. Lucy é caprichosa até nos pequenos detalhes.

Pianoski é um nome ucraniano. Lucy descende do leste europeu. Seus avós vieram ao Brasil ainda jovens. Os pais nasceram por aqui. Ela foi criada na zona rural de Luiziana. Cresceu entre os pés de milho e café das décadas de 60 e 70. Aprendeu desde cedo o ofício do trabalho, exemplo dos antepassados. Já em Campo Mourão, casou muito cedo, ainda aos 18. Um ano depois teve o primeiro filho. Mas o matrimônio não deu certo e separou-se aos 21. “Quando pedi a separação, escutei ele dizer que não ia agüentar muito tempo. Disse que eu não iria conseguir me sustentar. Jamais esqueci aquela frase”, lembra.

Quando termina as entregas do dia, Lucy segue em outra atividade. De casa em casa, ela faz mãos e pés das madames. É manicure, ofício realizado desde quando ainda era mocinha. Tem fila de espera. O quite com esmaltes vai atrás da moto. Entre unhas e cutículas, a conversa flui gostosa. Ela é também uma parceira de boas prosas com as clientes. Além disso, quando sobra um tempo a mais, Lucy faz dedetização. Fez um curso e aprendeu a lidar com o veneno. Quando uma madame necessita, lá vai ela a condenar as baratas da casa. Uma a uma, todas são mortas.

Ela nunca teve a carteira de trabalho registrada. Com o trabalho informal, Lucy já comprou a casa própria. A moto também já está quitada. Aquela história contada pelo ex-companheiro serviu de lição. Passou sobre as “pragas” e nem percebeu. Mesmo com apenas o primeiro grau, ela vem faturando bem. Muito bem, diga-se de passagem. Afinal, é uma espécie de “Pereirão”, personagem interpretada pela atriz Lília Cabral na novela das 9h. Quem trabalha, tem. Aprendeu a lição na guerra do dia a dia.

Incansável trabalhadora, Lucy agora descobriu que a vida não é só trabalho. Depois de lavar o rosto, vai até o Parque do Lago e caminha quase três quilômetros. Solteira desde os 21, ela também gosta de namorar, embora não tenha encontrado, ainda, a pessoa certa. “Ainda vou encontrar. Mas não sou daquelas que fica procurando. Tenho paciência”, diz. Mas voltando ao trabalho, Lucy também é artista. Aceita encomendas de artesanato. Ou seja, pinta e borda. Mais um dinheirinho no bolso. Ela não para. Ou melhor, para sim, no domingo. Mas só depois de dar uma geral na casa. Coisas de Lucy.

Nenhum comentário:

Postar um comentário