Após mais de um ano, famílias finalmente conseguiram sepultar as adolescentes assassinadas por Raimundo Gregório, ou apenas, “Ivan, o Terrível”, como ficou conhecido no meio policial. Os restos mortais estavam passando por exames de DNA na polícia científica de Curitiba e foram concluídos apenas na última semana. Por coincidência, dias depois que um programa nacional de TV divulgou o caso. Dmitria foi enterrada na quinta-feira. Já, Iara, teve velório e sepultamento no último domingo. A mãe dela, Maristela Pacheco, quer agora justiça. Não irá descansar até ver o assassino condenado.
Dilmércio Daleffe
Vítimas do impiedoso assassino “Ivan, o Terrível”, as adolescentes Iara Pacheco e Dmitria Vieira, finalmente foram sepultadas no cemitério municipal São Judas Tadeu em Campo Mourão. Dmitria teve o enterro sem velório, ainda na quinta-feira. Presentes apenas membros da família. Já Iara foi velada em uma das salas do Prever na tarde do último domingo. Depois, os parentes e amigos presenciaram o ritual de sepultamento. Foi uma cerimônia marcada pela emoção e fúria da mãe, Maristela Pacheco. Até agora ela não entende os motivos do crime.
Com o caixão lacrado, familiares fizeram um velório de quase quatro horas. Era um desejo da mãe de Iara. Durante todo o tempo, dona Maristela alternava momentos de calma e desespero. Reflexo do sentimento de amor pela filha caçula, morta aos 20 anos de idade, num crime escandalosamente bárbaro. Para se chegar ao dia do enterro, Maristela teve que aguardar quase um ano os exames para comprovar se a ossada era mesmo da filha. Durante todo este tempo, o túmulo da menina já estava pronto.
Maristela teve uma etapa de se sua angústia sanada. Ela precisava realizar o enterro da filha. “Agora estou mais calma, mais aliviada”, disse. Mesmo assim, será uma ferida aberta por toda a sua vida, uma tragédia sem poder voltar no tempo, um crime sem desculpas, uma mãe sem a filha. A partir de agora, Maristela seguirá os passos da justiça. Quer saber sobre o julgamento de “Ivan” e, um dia, ficar frente a frente com o assassino no tribunal do Fórum. “Vou ser forte e aguardar o julgamento. Quero justiça. Ele vai ter que pagar pelo que fez”, afirmou. Ainda ontem, a avó de Dmitria disse que a família prefere não mais comentar sobre o caso. As certidões de óbito das duas meninas devem sair nos próximos 20 dias.
O caso
Depois de chorarem diante da brutalidade do assassinato das duas jovens Iara e Dimitria, as famílias vinham adoecendo pelo constrangimento e humilhação em não poderem enterrá-las. Descobertas numa fossa aos fundos do Colégio Estadual Vinicius de Moraes, em Campo Mourão, no último ano, as duas ossadas já haviam sido enviadas à perícia, em Curitiba. Mesmo assim, os familiares não entendiam o porquê de tanta demora. Passados mais de um ano, coincidentemente, bastou uma única matéria sobre o caso em rede nacional para que os restos mortais fossem identificados. Maristela Pacheco, mãe de Iara, já até havia construído o túmulo da filha.
O drama vivido por dona Maristela teve início em janeiro de 2010, quando a filha saiu de casa com míseros R$50 para comprar pão. Ela nunca mais voltou. Depois disso, descobriu que restos mortais da melhor amiga da filha, Dimitria, que também estava desaparecida, haviam sido encontrados no colégio onde estudava. Dias depois veio a confirmação: outra ossada, desta vez, com pertences de Iara, também foi achada. A partir daí o mundo de Maristela partiu-se ao meio. A mulher que sempre lutou pelo bem estar da família, desmoronou.
Na última semana exames de DNA do Instituto Médico Legal (IML) de Curitiba, confirmaram que as ossadas encontradas na fossa do colégio estadual Vinícius de Moraes, em agosto do ano passado, são mesmo das jovens Dimitria e Iara. O caso ficou conhecido nacionalmente como “Ivan o Terrível”. A confirmação permitirá que o assassino vá a julgamento, podendo pegar até 30 anos de prisão, em regime fechado.
segunda-feira, 31 de outubro de 2011
Natalino será um palhaço para sempre
Aos 69 anos de idade, Natalino Moreira leva uma vida tranqüila dentro do Lar dos Velhinhos de Campo Mourão. Como o palhaço “Biro-Biro”, ele levou alegria a milhares de pessoas durante vários anos. Mas, mesmo com toda a felicidade do mundo, acabou esquecendo de pensar nele próprio. Seguiu no caminho do álcool e acabou abandonado pela família.
Dilmércio Daleffe
Natalino Moreira é uma das pessoas mais felizes do mundo. Durante muito tempo atuou como palhaço de circo. Era o palhaço “Biro-Biro”. Sua missão consistia em semear alegria entre as crianças. Fazia rir, brincava com todos e quase sempre tirava gargalhadas da platéia. Mantinha uma vida diferente. Aflorava e desafiava os sentimentos humanos. Hoje, asilado no Lar dos Velhinhos de Campo Mourão, ele encontra nos pequenos detalhes motivos de sobra para continuar sorrindo. Ele é espetacular. Sorridente todo o dia, faz piada de tudo e, ainda, se diverte com a rotina da instituição. Sem ele, o local não seria tão alegre. Nos últimos dias tem dito que está meio amarelo. Está comendo ovo demais. No entanto, apesar das gargalhadas, Natalino esconde uma história triste, de alcoolismo e abandono. Foi recolhido das ruas de São Paulo depois de se entregar ao álcool. Um irmão o salvou. A alegria do palhaço não morreu.
Aos 69 anos de idade, Natalino Moreira é um senhor que “sofre” de alegria. Em três anos de asilo, nunca ninguém o viu triste pelos cantos. “Estou aqui há um tempão e nunca recebi meu salário. Vou botar o Lar no pau”, brinca ele. Em quase toda a entrevista as piadas foram inevitáveis. Difícil até saber quando falava a verdade. Natalino nasceu no interior de São Paulo, na cidade de Cândido Mota, no ano de 42. Veio ao mundo exatamente no dia 25 de dezembro – Natal - por isso o nome. Conta que os pais eram da roça. Mais tarde foram morar na cidade. O pai, Benedito, transformou-se em bilheteiro da loteria federal. Já a mãe, Catharina, era apenas dona de casa.
Ainda na sua infância, viu a família montar uma companhia de circo – o Circo Teatral Compadre Moreira. Passaram juntos a percorrer o país com as apresentações. Numa das paradas, em Uraí – Norte do Paraná -, Natalino foi comer um pastel num barzinho de um português e acabou apaixonando-se pela filha dele. O nome era Maria. Natalino roubou a mocinha e, juntos, fugiram para Londrina. Com o tempo os dois casaram e tiveram duas filhas. Trabalharam na companhia e, anos depois, cansados da atividade, foram morar em São Paulo. Lá, Natalino trabalhou como pintor. Também foi zelador de um edifício chamado Iracema. Possui muitas lembranças daquele tempo.
Mas parte de suas memórias não estão mais vivas. Foi uma etapa triste de sua caminhada. Uma época em que, segundo seu sobrinho, Antônio Carlos Arantes, prefere esquecer, fazer de conta que nunca aconteceu. Natalino bebia muito e se entregou ao álcool. Se distanciou da mulher e das duas filhas. Acabou na rua, como um andarilho. Nas avenidas da capital paulista, ele era apenas mais um “doente”. Não tomava banho e vivia sob as marquises e praças da cidade. Sempre em busca de um gole a mais, uma outra dose.
Um dos sete irmãos, que morava em Campo Mourão, decidiu ir atrás de Natalino. Não queria que o irmão acabasse na rua. Descobriu seu paradeiro e o trouxe para cá. Sem poder deixá-lo em casa, buscou ajuda do Lar dos Velhinhos Frederico Ozanan. Desde 16 de julho de 2008, Natalino foi aceito na instituição. Está lá até hoje. Distante do álcool transformou-se em uma verdadeira personalidade local. É a alegria em pessoa. Motivo de satisfação aos outros internos. Afinal, quem não deseja ficar ao lado dele?
Embora a alegria transborde frequentemente, Natalino jamais recebeu a visita das filhas ou da esposa. Ele parece fantasiar sua vida. Diz que está de férias. Mas insiste em dizer que tem paixão em semear a alegria entre as pessoas. Também tem aversão a banhos. A turma do Lar é que sofre. “Eu não gosto de tomar banho porque economizo água pra fazer o feijão”, brinca mais uma vez. Além da alegria, um velho crachá do metrô de São Paulo também insiste em acompanhá-lo, nunca saiu de seu pescoço. Mas enquanto se diverte com tudo, mantém esquecido um lado negro capaz de inibir sua felicidade. Tomara que continue assim. O palhaço não morreu.
Dilmércio Daleffe
Natalino Moreira é uma das pessoas mais felizes do mundo. Durante muito tempo atuou como palhaço de circo. Era o palhaço “Biro-Biro”. Sua missão consistia em semear alegria entre as crianças. Fazia rir, brincava com todos e quase sempre tirava gargalhadas da platéia. Mantinha uma vida diferente. Aflorava e desafiava os sentimentos humanos. Hoje, asilado no Lar dos Velhinhos de Campo Mourão, ele encontra nos pequenos detalhes motivos de sobra para continuar sorrindo. Ele é espetacular. Sorridente todo o dia, faz piada de tudo e, ainda, se diverte com a rotina da instituição. Sem ele, o local não seria tão alegre. Nos últimos dias tem dito que está meio amarelo. Está comendo ovo demais. No entanto, apesar das gargalhadas, Natalino esconde uma história triste, de alcoolismo e abandono. Foi recolhido das ruas de São Paulo depois de se entregar ao álcool. Um irmão o salvou. A alegria do palhaço não morreu.
Aos 69 anos de idade, Natalino Moreira é um senhor que “sofre” de alegria. Em três anos de asilo, nunca ninguém o viu triste pelos cantos. “Estou aqui há um tempão e nunca recebi meu salário. Vou botar o Lar no pau”, brinca ele. Em quase toda a entrevista as piadas foram inevitáveis. Difícil até saber quando falava a verdade. Natalino nasceu no interior de São Paulo, na cidade de Cândido Mota, no ano de 42. Veio ao mundo exatamente no dia 25 de dezembro – Natal - por isso o nome. Conta que os pais eram da roça. Mais tarde foram morar na cidade. O pai, Benedito, transformou-se em bilheteiro da loteria federal. Já a mãe, Catharina, era apenas dona de casa.
Ainda na sua infância, viu a família montar uma companhia de circo – o Circo Teatral Compadre Moreira. Passaram juntos a percorrer o país com as apresentações. Numa das paradas, em Uraí – Norte do Paraná -, Natalino foi comer um pastel num barzinho de um português e acabou apaixonando-se pela filha dele. O nome era Maria. Natalino roubou a mocinha e, juntos, fugiram para Londrina. Com o tempo os dois casaram e tiveram duas filhas. Trabalharam na companhia e, anos depois, cansados da atividade, foram morar em São Paulo. Lá, Natalino trabalhou como pintor. Também foi zelador de um edifício chamado Iracema. Possui muitas lembranças daquele tempo.
Mas parte de suas memórias não estão mais vivas. Foi uma etapa triste de sua caminhada. Uma época em que, segundo seu sobrinho, Antônio Carlos Arantes, prefere esquecer, fazer de conta que nunca aconteceu. Natalino bebia muito e se entregou ao álcool. Se distanciou da mulher e das duas filhas. Acabou na rua, como um andarilho. Nas avenidas da capital paulista, ele era apenas mais um “doente”. Não tomava banho e vivia sob as marquises e praças da cidade. Sempre em busca de um gole a mais, uma outra dose.
Um dos sete irmãos, que morava em Campo Mourão, decidiu ir atrás de Natalino. Não queria que o irmão acabasse na rua. Descobriu seu paradeiro e o trouxe para cá. Sem poder deixá-lo em casa, buscou ajuda do Lar dos Velhinhos Frederico Ozanan. Desde 16 de julho de 2008, Natalino foi aceito na instituição. Está lá até hoje. Distante do álcool transformou-se em uma verdadeira personalidade local. É a alegria em pessoa. Motivo de satisfação aos outros internos. Afinal, quem não deseja ficar ao lado dele?
Embora a alegria transborde frequentemente, Natalino jamais recebeu a visita das filhas ou da esposa. Ele parece fantasiar sua vida. Diz que está de férias. Mas insiste em dizer que tem paixão em semear a alegria entre as pessoas. Também tem aversão a banhos. A turma do Lar é que sofre. “Eu não gosto de tomar banho porque economizo água pra fazer o feijão”, brinca mais uma vez. Além da alegria, um velho crachá do metrô de São Paulo também insiste em acompanhá-lo, nunca saiu de seu pescoço. Mas enquanto se diverte com tudo, mantém esquecido um lado negro capaz de inibir sua felicidade. Tomara que continue assim. O palhaço não morreu.
Órfãs de Ivan, o Terrível, enterrarão suas filhas
Dilmércio Daleffe
Maristela Pacheco vivia, até ontem, a angústia em não saber se a filha, Iara, estava viva. Ela havia desaparecido em janeiro de 2010. Na época a mãe, desesperada, chegou a prometer ajoelhar-se aos pés do delegado, caso elucidasse o mistério. Meses depois a polícia descobriu duas ossadas em uma fossa aos fundos de uma escola de Campo Mourão. Dados preliminares indicavam se tratar de Iara e de outra desaparecida, Dmitria Vieira. A busca e a conseqüente agonia chegaram ao fim. É que o laudo da perícia científica da polícia, em Curitiba, confirmou se tratar das duas jovens. Como prometido, dona Maristela foi até o delegado chefe da 16ª Sub Divisão Policial, José Aparecido Jacovós, e ajoelhou-se a seus pés.
Depois de chorarem diante da brutalidade do assassinato das duas jovens Iara e Dimitria, as famílias vinham adoecendo pelo constrangimento e humilhação em não poderem enterrá-las. Descobertas numa fossa aos fundos do Colégio Estadual Vinicius de Moraes, em Campo Mourão, no último ano, as duas ossadas já haviam sido enviadas à perícia, em Curitiba. Mesmo assim, os familiares não entendiam o porquê de tanta demora. Passados mais de um ano, coincidentemente, bastou uma única matéria sobre o caso em rede nacional para que os restos mortais fossem identificados. Maristela Pacheco, mãe de Iara, já até construiu o túmulo da filha. Na próxima semana, finalmente, poderá realizar o ritual de velório e sepultamento.
O drama vivido por dona Maristela teve início em janeiro de 2010, quando a filha saiu de casa com míseros R$50 para comprar pão. Ela nunca mais voltou. Depois disso, descobriu que restos mortais da melhor amiga da filha, Dimitria, que também estava desaparecida, haviam sido encontrados no colégio onde estudava. Dias depois veio a confirmação: outra ossada, desta vez, com pertences de Iara, também foi achada. A partir daí o mundo de Maristela partiu-se ao meio. A mulher que sempre lutou pelo bem estar da família, desmoronou.
Maristela tem hoje 52 anos. Ainda é nova, mas o fato a envelheceu décadas. Trata-se de uma mulher que a vida não poupou das dificuldades. Enfrentou diversos obstáculos culminando agora com o drama em não conseguir sepultar a filha. Nascida em Roncador, em 59, perdeu a mãe no próprio parto. O pai ela jamais conheceu. Foi criada pela parteira, que também morreu anos depois de seu nascimento. Trabalhou como bóia fria para sustentar a família e não teve tempo de estudar. Até hoje, é analfabeta. Casou-se, mas o marido, na época taxista, foi assassinado em Cascavel. Mais recentemente, perdeu parte da visão, reflexo do diabetes. Descobriu quase ao mesmo tempo o início de hanseníase e um câncer de pele. Definitivamente, a vida não foi gentil para dona Maristela.
Ontem, o seu mundinho parece ter desabado novamente. Ao mesmo tempo em que lutava pelo resultado dos exames, não queria receber a confirmação de que se tratava mesmo da filha. “Eu precisava saber se era a Iara. Mas quando fiquei sabendo que era mesmo, não quis acreditar. No fundo ainda tinha esperanças de que ela estivesse viva por aí”, disse. Na próxima semana, assim que o IML fornecer os restos mortais da filha, ela fará um breve velório e, depois, o seu sepultamento. É pouco perto do carinho e amor que tinha pela menina. Sobre o algoz que tirou sua filha, Ivan, ela deseja que ele apodreça na cadeia. “Quero vê-lo definhar lá dentro, até morrer. O castigo maior virá de Deus”, afirmou.
Dimitria
Marieta Ferreira mostra no rosto as marcas do sofrimento. Aos 58 anos de idade, ela também aguardava a conclusão dos exames da criminalística de Curitiba. Dmitria, a neta, tinha apenas 16 anos quando desapareceu, ainda em 2008. Além da tragédia da perda, também o drama da demora. “Não tenho nem palavras. Não está sendo fácil. Precisamos somente fazer o sepultamento para que ela descanse em paz”, afirma.
O caso da aposentada é um pouco pior. Se ela ainda vivia a angústia da perda da neta através das mãos sujas de “Ivan”, encontra noutro neto de quase três anos, a alegria em viver. Pasmem, o netinho é filho do mesmo “Ivan”, fruto de um relacionamento com a filha de Marieta. Ou seja, ao mesmo tempo em que o suposto assassino tirou uma neta, lhe deu outro. Trata-se de uma tragédia do destino não mencionada nem mesmo nos melhores roteiros de cinema. Marieta disse ontem que também pretende realizar o sepultamento da neta.
“Ivan, o Terrível”
Ainda ontem, a TRIBUNA teve acesso ao impiedoso assassino das duas jovens. Ao contrário dos criminosos do tipo 171 – aqueles que tentam driblar as investigações – Ivan confessou novamente os dois crimes. “Nem precisava fazer os exames. Eu mesmo já havia confirmado as duas mortes”, disse. Frio, ele disse que sente remorso diante dos fatos e, que um dia, espera que as famílias o perdoem. “Deus perdoa todo mundo. Porque não me perdoaria também”, questionou. Sobre a morte de Dmitria, Ivan disse que a matou para se defender. Explicou que, após consumir drogas, ela teria ficado sem controle, nervosa e extremamente violenta. “Matei ela por isso”, disse. Ainda hoje, Ivan terá a primeira audiência no Fórum.
Ossadas encontradas em fossa são de Dimitria e Iara
Walter Pereira
Exames de DNA do Instituto Médico Legal (IML) de Curitiba, confirmaram que as ossadas encontradas na fossa do colégio estadual Vinícius de Moraes, em agosto do ano passado, são mesmo das jovens Dimitria Laura Vieira Gênero, 16 e Iara Pacheco de Oliveira, 20. O caso ficou conhecido nacionalmente como “Ivan o Terrível”. A confirmação permitirá que o assassino vá a julgamento. O autor do crime, o próprio zelador do colégio, Raimundo Gregório da Silva, 52, mais conhecido como Ivan, confessou na época, à polícia, ter matado e queimado os corpos das vítimas. Ele está detido na 16ª Subdivisão Policial de Campo Mourão. No entanto, seu julgamento ainda não ocorreu porque o DNA dos ossos encontrados não havia sido confirmado.
De acordo com o delegado chefe da 16ª SDP, José Aparecido Jacovós, o laudo estava pronto há 10 dias, mas chegou somente ontem à delegacia local. “Nós já tínhamos certeza que se tratava das duas meninas desaparecidas até porque tínhamos a confissão de Raimundo. Encontramos as roupas das vítimas escondidas no forro do colégio e documentos delas na casa dele”, frisa.
Jacovós comenta que agora, com a confirmação do laudo, será possível a família enterrar os ossos e ter a certidão de óbito, que até então não havia como fazer. “Agora temos certeza que este maníaco será condenado pelo Tribunal do Júri.” A pena de Ivan pode chegar até 60 anos de prisão. Ele deverá responder por duplo homicídio qualificado. As ossadas deverão ser entregues ao IML local e, posteriormente, às famílias em até uma semana para o sepultamento. O delegado acredita que no máximo até o fim de janeiro do próximo ano, Ivan seja julgado. As ossadas de cada uma das vítimas serão identificadas através de um exame biométrico. Existia também a hipótese de um terceiro corpo, mas os exames detectaram apenas o das duas estudantes.
Conforme o Instituto de Criminalística, a demora para conclusão dos exames ocorreu porque estava muito difícil confirmar o DNA das ossadas. O material precisou passar por várias análises. Segundo a assessoria de comunicação da Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), foram feitas 16 tentativas para chegar ao resultado final e gastos R$ 13 mil nos testes de DNA. Ao todo foram dez meses de trabalho.De acordo com o responsável pelo setor de DNA do Instituto de Criminalística, Hemerson Bertassoni Alves, os ossos das meninas foram encaminhados para análise em outubro do ano passado, mas por falta de recursos para compra de reagentes, os exames tiveram início só em dezembro.
O DNA presente nos ossos das vítimas estava degradado, porque foi ubmetido ao calor e à umidade, quando o material foi incinerado e enterrado. “Foram utilizadas quatro técnicas diferentes de extração, todas validadas por protocolos internacionais. Esgotamos o material ósseo para a obtenção dos perfis genéticos”, explica.
Relembre o caso
Dimitria desapareceu em julho de 2008, já Iara estava, desde janeiro de 2010. As ossadas foram encontradas no dia 13 de agosto do ano passado dentro de uma fossa, nos fundos do colégio, no Cohapar, região do Lar Paraná. Raimundo trabalhava e morava no mesmo local onde as jovens estudavam. Ele tinha namorado uma tia de Dimitria. O que chamou a atenção da polícia foi o suspeito ter se aproximado da família dela, depois dos desaparecimentos. Segundo a polícia, o zelador passava recado sobre a situação das meninas. Dizia que recebia mensagens de Dimitria pelo celular e que ela estava morando na Espanha.
Diante dos indícios, a polícia conseguiu um mandado de busca e apreensão na casa dele. No local, foram encontrados vários filmes e revistas pornográficas e um celular em que tinha arquivada uma das mensagens que Dimitria supostamente teria enviado à família. Ao perceber uma fossa aterrada no quintal da casa do zelador, dentro da escola, a polícia também pediu que a terra fosse retirada do local. Durante o processo, foram encontrados ossos de dois corpos, que haviam sido incinerados. Também foram achados os pertences das meninas no forro do prédio da escola.O zelador informou ter atraído as duas vítimas até sua casa.
Após matá-las a golpes de marreta, ele as enterrou na horta da escola e, depois de um mês, as desenterrou, incinerou os ossos, e os jogou na fossa. A prisãoO acusado foi preso ainda na noite do dia 13, em Sarandi, região metropolitana de Maringá, quando chegava à residência de um dos filhos para pegar uma marmita. O zelador estava escondido em um matagal desde o início da manhã de sexta, quando policiais civis foram até a sua residência, nos fundos do colégio e encontraram roupas, celular e objetos das adolescentes.
A perseverança de Lucy Pianoski
Lucy Pianoski é uma mulher guerreira. Trabalha informalmente há mais de 26 anos e conseguiu a independência financeira sem a ajuda de nenhum marmanjo. Tem casa e moto, é manicure, atende encomendas de comida, faz artesanato e, ainda, dedetiza ambientes de vez em quando. Viva a liberdade.
Dilmércio Daleffe
Lucy Pianoski acorda diariamente às 6 horas da manhã. Ela sabe que quanto mais cedo lavar o rosto, mais tempo terá ao trabalho. E o seu pensamento consiste apenas nisso. Aos 47 anos de idade, aprendeu não depender de nenhum homem. Lições do passado, sabedoria no presente. Sem arrependimentos, meteu mãos e pernas no trabalho. A jornada é contínua desde os seus 21. Incansável, ela já sustentou um filho, atualmente casado. O outro ainda está na faculdade, em Guarapuava. Ela poderia servir de exemplo a milhares de outras brasileiras, guerreiras que sobrevivem do próprio esforço sem a ajuda dos ex-companheiros. Poderia também continuar casada, dependente do marido. Mas preferiu pela liberdade e acabou vencendo pela escolha. Se o país fosse infestado de “Lucys”, a realidade seria diferente.
Bem cedinho, ainda com os primeiros raios de sol, Lucy inicia o preparo para a entrega de várias encomendas da semana. Comida. Faz de tudo um pouco. Tortas de maçã, comida japonesa, pão de queijo, bolo gelado, além de mais uma dezena de itens. Quem prova, repete. Quem compra, faz novo pedido. Entrega em toda cidade com a sua moto preta, sempre limpa, impecável. Lucy é caprichosa até nos pequenos detalhes.
Pianoski é um nome ucraniano. Lucy descende do leste europeu. Seus avós vieram ao Brasil ainda jovens. Os pais nasceram por aqui. Ela foi criada na zona rural de Luiziana. Cresceu entre os pés de milho e café das décadas de 60 e 70. Aprendeu desde cedo o ofício do trabalho, exemplo dos antepassados. Já em Campo Mourão, casou muito cedo, ainda aos 18. Um ano depois teve o primeiro filho. Mas o matrimônio não deu certo e separou-se aos 21. “Quando pedi a separação, escutei ele dizer que não ia agüentar muito tempo. Disse que eu não iria conseguir me sustentar. Jamais esqueci aquela frase”, lembra.
Quando termina as entregas do dia, Lucy segue em outra atividade. De casa em casa, ela faz mãos e pés das madames. É manicure, ofício realizado desde quando ainda era mocinha. Tem fila de espera. O quite com esmaltes vai atrás da moto. Entre unhas e cutículas, a conversa flui gostosa. Ela é também uma parceira de boas prosas com as clientes. Além disso, quando sobra um tempo a mais, Lucy faz dedetização. Fez um curso e aprendeu a lidar com o veneno. Quando uma madame necessita, lá vai ela a condenar as baratas da casa. Uma a uma, todas são mortas.
Ela nunca teve a carteira de trabalho registrada. Com o trabalho informal, Lucy já comprou a casa própria. A moto também já está quitada. Aquela história contada pelo ex-companheiro serviu de lição. Passou sobre as “pragas” e nem percebeu. Mesmo com apenas o primeiro grau, ela vem faturando bem. Muito bem, diga-se de passagem. Afinal, é uma espécie de “Pereirão”, personagem interpretada pela atriz Lília Cabral na novela das 9h. Quem trabalha, tem. Aprendeu a lição na guerra do dia a dia.
Incansável trabalhadora, Lucy agora descobriu que a vida não é só trabalho. Depois de lavar o rosto, vai até o Parque do Lago e caminha quase três quilômetros. Solteira desde os 21, ela também gosta de namorar, embora não tenha encontrado, ainda, a pessoa certa. “Ainda vou encontrar. Mas não sou daquelas que fica procurando. Tenho paciência”, diz. Mas voltando ao trabalho, Lucy também é artista. Aceita encomendas de artesanato. Ou seja, pinta e borda. Mais um dinheirinho no bolso. Ela não para. Ou melhor, para sim, no domingo. Mas só depois de dar uma geral na casa. Coisas de Lucy.
Dilmércio Daleffe
Lucy Pianoski acorda diariamente às 6 horas da manhã. Ela sabe que quanto mais cedo lavar o rosto, mais tempo terá ao trabalho. E o seu pensamento consiste apenas nisso. Aos 47 anos de idade, aprendeu não depender de nenhum homem. Lições do passado, sabedoria no presente. Sem arrependimentos, meteu mãos e pernas no trabalho. A jornada é contínua desde os seus 21. Incansável, ela já sustentou um filho, atualmente casado. O outro ainda está na faculdade, em Guarapuava. Ela poderia servir de exemplo a milhares de outras brasileiras, guerreiras que sobrevivem do próprio esforço sem a ajuda dos ex-companheiros. Poderia também continuar casada, dependente do marido. Mas preferiu pela liberdade e acabou vencendo pela escolha. Se o país fosse infestado de “Lucys”, a realidade seria diferente.
Bem cedinho, ainda com os primeiros raios de sol, Lucy inicia o preparo para a entrega de várias encomendas da semana. Comida. Faz de tudo um pouco. Tortas de maçã, comida japonesa, pão de queijo, bolo gelado, além de mais uma dezena de itens. Quem prova, repete. Quem compra, faz novo pedido. Entrega em toda cidade com a sua moto preta, sempre limpa, impecável. Lucy é caprichosa até nos pequenos detalhes.
Pianoski é um nome ucraniano. Lucy descende do leste europeu. Seus avós vieram ao Brasil ainda jovens. Os pais nasceram por aqui. Ela foi criada na zona rural de Luiziana. Cresceu entre os pés de milho e café das décadas de 60 e 70. Aprendeu desde cedo o ofício do trabalho, exemplo dos antepassados. Já em Campo Mourão, casou muito cedo, ainda aos 18. Um ano depois teve o primeiro filho. Mas o matrimônio não deu certo e separou-se aos 21. “Quando pedi a separação, escutei ele dizer que não ia agüentar muito tempo. Disse que eu não iria conseguir me sustentar. Jamais esqueci aquela frase”, lembra.
Quando termina as entregas do dia, Lucy segue em outra atividade. De casa em casa, ela faz mãos e pés das madames. É manicure, ofício realizado desde quando ainda era mocinha. Tem fila de espera. O quite com esmaltes vai atrás da moto. Entre unhas e cutículas, a conversa flui gostosa. Ela é também uma parceira de boas prosas com as clientes. Além disso, quando sobra um tempo a mais, Lucy faz dedetização. Fez um curso e aprendeu a lidar com o veneno. Quando uma madame necessita, lá vai ela a condenar as baratas da casa. Uma a uma, todas são mortas.
Ela nunca teve a carteira de trabalho registrada. Com o trabalho informal, Lucy já comprou a casa própria. A moto também já está quitada. Aquela história contada pelo ex-companheiro serviu de lição. Passou sobre as “pragas” e nem percebeu. Mesmo com apenas o primeiro grau, ela vem faturando bem. Muito bem, diga-se de passagem. Afinal, é uma espécie de “Pereirão”, personagem interpretada pela atriz Lília Cabral na novela das 9h. Quem trabalha, tem. Aprendeu a lição na guerra do dia a dia.
Incansável trabalhadora, Lucy agora descobriu que a vida não é só trabalho. Depois de lavar o rosto, vai até o Parque do Lago e caminha quase três quilômetros. Solteira desde os 21, ela também gosta de namorar, embora não tenha encontrado, ainda, a pessoa certa. “Ainda vou encontrar. Mas não sou daquelas que fica procurando. Tenho paciência”, diz. Mas voltando ao trabalho, Lucy também é artista. Aceita encomendas de artesanato. Ou seja, pinta e borda. Mais um dinheirinho no bolso. Ela não para. Ou melhor, para sim, no domingo. Mas só depois de dar uma geral na casa. Coisas de Lucy.
segunda-feira, 24 de outubro de 2011
Os últimos passos de Sidnéia
Sidnéia da Luz morreu jovem, aos 32 anos de idade. Foi assassinada pelas mãos bárbaras de um criminoso impiedoso. Ainda nova conheceu as drogas. Passou a prostituir-se enquanto doava dois dos cinco filhos. Conheceu o crack e acabou pagando um preço alto demais pelo vício. Foi morta numa estrada rural e teve o corpo perfurado por inúmeros golpes. Ela não verá os filhos crescerem.
Dilmércio Daleffe
Sidnéia da Luz viveu pouco. Morreu aos 32 anos de idade vítima de um assassino impiedoso, possivelmente, sedento por vingança. Seu corpo foi encontrado jogado em uma estrada rural próximo ao Jardim Cidade Nova. Havia sido arrastado, deixando marcas de sangue por todo canto. Eram pouco mais de 23h do último dia 10 quando a polícia foi chamada. Sujo de lama, o corpo revelava indícios de uma imensa fúria e ódio, com cortes e facadas. Foram inúmeros os golpes. O seu algoz também passou com o veículo sobre ela. Ainda jovem, Sidnéia estava na estrada errada. Todos a avisaram. Mas ela não conseguia ouvir. Estava viciada em crack, perdida num caminho sem volta, obcecada por um vício letal. Era dependente de traficantes.
A jovem apresentava duas vidas. Uma saudável ao lado do companheiro – que pediu para não ter o nome revelado e, a outra, durante à noite, a base de programas sexuais e drogas. Era viciada desde a adolescência. Nunca conseguiu parar. Seus pais já eram mortos e a única irmã, afastou-se por conta da vida desregrada de Sidnéia. Mesmo assim, diante da distância, ainda havia o carinho, saudade e a compaixão. “Quero justiça pela minha irmã”, disse. A irmã – o nome não será revelado – reconheceu o corpo no Instituto Médico Legal no dia seguinte. Ela não acreditou na barbárie cometida contra Sidnéia. Ela desmoronou.
Sidnéia nasceu em 78, época das discotecas, do sucesso do grupo ABBA e no mesmo ano em que a cocaína começava a se tornar conhecida no Brasil. Por coincidência do destino, a mesma droga utilizada na produção do crack. Morta aos 32, deixou cinco filhos. Três moravam com ela e o companheiro, na área central da cidade. Outros dois ela doou. Muito abalado, o parceiro contou que a conhecia há oito anos. Moravam juntos, mesmo ele sabendo de seus vícios e rotinas noturnas. Diariamente, a moça acordava, lavava algumas roupas e saía sem dar detalhes. Voltava somente no outro dia. Passava a noite em locais desconhecidos, quase sempre usando drogas. Ele, um senhor com pelo menos o dobro de sua idade, é um cara bastante gentil, dócil e, pelo que se vê, cuidadoso com os filhos dela.
Foi vista pela última vez na tarde do dia em que foi assassinada, depois de colocar algumas roupas para secar num varal. Saiu dizendo que ia até a casa de uma amiga, no Jardim Cidade Nova. O companheiro nunca mais a viu. Pela manhã da terça ele escutou no rádio notícias que uma mulher havia sido encontrada morta. “Sabia que era ela. Mais cedo ou mais tarde isso ia acontecer”, disse o amásio. Ele sabia que a parceira mantinha uma vida obscura. Mas preferia não comentar. Por muitas vezes também dava dinheiro a Sidnéia. “Ela dizia que era para comprar algumas coisas. Nunca disse que eram para as drogas”, explicou. Por duas vezes o companheiro a internou em clínicas contra a dependência. Mas a droga era sempre mais forte. “Ela queria parar. Mas não conseguia”, disse.
Usuária de entorpecentes, mostrava o lado atordoado pela química na relação com os filhos. Informações dão conta que não dava muita atenção aos três, de 6, 10 e 12 anos de idade. Quem mais cuidava era ele, que mantém a guarda dos menores. Na maior parte do tempo, Sidnéia ficava fora, distante dos filhos. Quando voltava, não demonstrava ternura. Era uma relação fria, reflexo de uma mãe doente, viciada no crack. O companheiro disse que sentia muita dó de Sidnéia. Era mais uma relação paternal do que amor de casal. De acordo com a polícia, a vítima tinha uma passagem por furto.
Bastante chocado, o companheiro chorou ao descrevê-la. Não tinha palavras para resumir o que sentia. Estava completamente em transe, ofuscado pela tragédia. Uma tragédia anunciada. “Tinha muito carinho por ela”, disse. Para ele, a causa do crime pode e deve estar ligada a um provável acerto de contas entre Sidnéia e o traficante. A vítima poderia estar devendo na “boca”. Na última semana, policiais de Campo Mourão prenderam um rapaz de 35 anos. Ele é o principal suspeito de ter assassinado Sidinéia. No momento da abordagem, estava com uma moto roubada.
Sidnéia foi enterrada no dia 11, num túmulo simples, com uma cerimônia rápida no cemitério municipal de Campo Mourão. Foi sepultada sem glórias, sem tiros de canhões e sem homenagens. Presentes muitos conhecidos, os filhos, a irmã e o companheiro. Morreu nova, com toda uma vida pela frente e com filhos por educar. Mas esbarrou em obstáculos criados por ela própria. Foi morta pela indiferença de criminosos impiedosos, os mesmos que preferem ratos a seres humanos. Que criam os doentes e depois os consomem. Ainda com o sobrenome de “Luz”, Sidnéia morreu na escuridão.
Dilmércio Daleffe
Sidnéia da Luz viveu pouco. Morreu aos 32 anos de idade vítima de um assassino impiedoso, possivelmente, sedento por vingança. Seu corpo foi encontrado jogado em uma estrada rural próximo ao Jardim Cidade Nova. Havia sido arrastado, deixando marcas de sangue por todo canto. Eram pouco mais de 23h do último dia 10 quando a polícia foi chamada. Sujo de lama, o corpo revelava indícios de uma imensa fúria e ódio, com cortes e facadas. Foram inúmeros os golpes. O seu algoz também passou com o veículo sobre ela. Ainda jovem, Sidnéia estava na estrada errada. Todos a avisaram. Mas ela não conseguia ouvir. Estava viciada em crack, perdida num caminho sem volta, obcecada por um vício letal. Era dependente de traficantes.
A jovem apresentava duas vidas. Uma saudável ao lado do companheiro – que pediu para não ter o nome revelado e, a outra, durante à noite, a base de programas sexuais e drogas. Era viciada desde a adolescência. Nunca conseguiu parar. Seus pais já eram mortos e a única irmã, afastou-se por conta da vida desregrada de Sidnéia. Mesmo assim, diante da distância, ainda havia o carinho, saudade e a compaixão. “Quero justiça pela minha irmã”, disse. A irmã – o nome não será revelado – reconheceu o corpo no Instituto Médico Legal no dia seguinte. Ela não acreditou na barbárie cometida contra Sidnéia. Ela desmoronou.
Sidnéia nasceu em 78, época das discotecas, do sucesso do grupo ABBA e no mesmo ano em que a cocaína começava a se tornar conhecida no Brasil. Por coincidência do destino, a mesma droga utilizada na produção do crack. Morta aos 32, deixou cinco filhos. Três moravam com ela e o companheiro, na área central da cidade. Outros dois ela doou. Muito abalado, o parceiro contou que a conhecia há oito anos. Moravam juntos, mesmo ele sabendo de seus vícios e rotinas noturnas. Diariamente, a moça acordava, lavava algumas roupas e saía sem dar detalhes. Voltava somente no outro dia. Passava a noite em locais desconhecidos, quase sempre usando drogas. Ele, um senhor com pelo menos o dobro de sua idade, é um cara bastante gentil, dócil e, pelo que se vê, cuidadoso com os filhos dela.
Foi vista pela última vez na tarde do dia em que foi assassinada, depois de colocar algumas roupas para secar num varal. Saiu dizendo que ia até a casa de uma amiga, no Jardim Cidade Nova. O companheiro nunca mais a viu. Pela manhã da terça ele escutou no rádio notícias que uma mulher havia sido encontrada morta. “Sabia que era ela. Mais cedo ou mais tarde isso ia acontecer”, disse o amásio. Ele sabia que a parceira mantinha uma vida obscura. Mas preferia não comentar. Por muitas vezes também dava dinheiro a Sidnéia. “Ela dizia que era para comprar algumas coisas. Nunca disse que eram para as drogas”, explicou. Por duas vezes o companheiro a internou em clínicas contra a dependência. Mas a droga era sempre mais forte. “Ela queria parar. Mas não conseguia”, disse.
Usuária de entorpecentes, mostrava o lado atordoado pela química na relação com os filhos. Informações dão conta que não dava muita atenção aos três, de 6, 10 e 12 anos de idade. Quem mais cuidava era ele, que mantém a guarda dos menores. Na maior parte do tempo, Sidnéia ficava fora, distante dos filhos. Quando voltava, não demonstrava ternura. Era uma relação fria, reflexo de uma mãe doente, viciada no crack. O companheiro disse que sentia muita dó de Sidnéia. Era mais uma relação paternal do que amor de casal. De acordo com a polícia, a vítima tinha uma passagem por furto.
Bastante chocado, o companheiro chorou ao descrevê-la. Não tinha palavras para resumir o que sentia. Estava completamente em transe, ofuscado pela tragédia. Uma tragédia anunciada. “Tinha muito carinho por ela”, disse. Para ele, a causa do crime pode e deve estar ligada a um provável acerto de contas entre Sidnéia e o traficante. A vítima poderia estar devendo na “boca”. Na última semana, policiais de Campo Mourão prenderam um rapaz de 35 anos. Ele é o principal suspeito de ter assassinado Sidinéia. No momento da abordagem, estava com uma moto roubada.
Sidnéia foi enterrada no dia 11, num túmulo simples, com uma cerimônia rápida no cemitério municipal de Campo Mourão. Foi sepultada sem glórias, sem tiros de canhões e sem homenagens. Presentes muitos conhecidos, os filhos, a irmã e o companheiro. Morreu nova, com toda uma vida pela frente e com filhos por educar. Mas esbarrou em obstáculos criados por ela própria. Foi morta pela indiferença de criminosos impiedosos, os mesmos que preferem ratos a seres humanos. Que criam os doentes e depois os consomem. Ainda com o sobrenome de “Luz”, Sidnéia morreu na escuridão.
segunda-feira, 17 de outubro de 2011
João, o pastor que desafiou a Deus
Dilmércio Daleffe
João Marcos de Oliveira era um pastor. Orava, falava em nome de Deus e pedia aos fiéis que seguissem o caminho do bem. Sua missão durou sete anos em Goioerê. Mas um dia, ele foi vencido e, tudo o que pregava, voltou-se contra ele. Saiu da igreja e entrou no abismo das drogas. Usou maconha, álcool e se enterrou definitivamente nas pedras de crack. Esqueceu-se do criador. Conseguiu a incrível façanha de fumar R$800 em química tóxica numa só noite. Não contente, voltou ao traficante e ficou devendo mais dinheiro. A dívida foi cobrada. Numa noite, bandidos armados invadiram a casa da irmã, onde ele também morava. Sob ameaças de pistolas, levaram o que tinha de valor. Foi aí que caiu na real. Percebeu que seus atos começaram a fazer mal a outras pessoas. João voltou a crer em Deus.
A história de João é dolorida. Sente ainda as feridas abertas por ele próprio. Estava na estrada certa, mas foi convencido a seguir por um atalho, que quase o matou. Pastor de uma igreja evangélica em Goioerê, por sete anos, João era como o chefe do local. Com o tempo, contratou um tesoureiro. Sua vida era falar em nome de Deus a inúmeras pessoas. Escutava seus problemas, tentava ajudar, pedia a Deus por graças. Mas um dia, foi convidado a prestar contas de supostas irregularidades em sua igreja. Segundo ele, foi acusado por desvios nas finanças. “Jamais peguei nada. O problema é que acreditei demais em certas pessoas”, disse. Dias depois, veio o julgamento. O tesoureiro saiu ileso. João foi removido à outra função.
Cabisbaixo e com o moral em queda, decidiu se afastar de vez da igreja. Voltou a ser como no passado, um usuário de drogas. Antes de ser pastor, João era um viciado, mas conseguiu a libertação diante das palavras de Deus. Deprimido, caiu pela segunda vez no caminho tortuoso da dependência química. Parou por duas vezes em clínicas de recuperação por força da família. “Eu fiquei internado para deixar minha família mais tranqüila. Mas não acreditava na recuperação. Eu tinha vontade de continuar com as drogas”, disse.
João saiu da clínica, mas não havia se curado. Já em Campo Mourão, passou a trabalhar em uma empresa de alimentação. Seu chefe também era usuário de drogas. A situação só se agravou. A dependência aumentou. Chegava ao fim do mês sem dinheiro para pagar o aluguel, uma vez que a grana já havia sido distribuída às mãos de traficantes. João estava sozinho, num caminho errado escolhido por ele mesmo. Deus estava distante, não pensava mais nas palavras que antes defendia.
Sem dinheiro, passou a morar de favor na casa da irmã e do cunhado. Mas a dependência o levou a entrar em dívida com traficantes. Míseros R$50 fizeram com que seus credores invadissem a casa e semeassem o terror. Levaram o que tinha de valor e deixaram um rastro de medo. A dívida foi enfim, paga.
Ainda atordoado buscou ajuda, pela terceira vez, agora com um pastor de Campo Mourão. João acordou. Desistiu do atalho escolhido e voltou ao caminho correto. Hoje, faz quatro meses que está livre do vício. Decidiu ler novamente a Bíblia e agora, ao contrário de antes, quer parar. “Acreditava não ter cura. Mas agora sei que Deus é mais forte. Ele quer que eu pare”, disse. No abrigo do pastor Adão Adriano, João quer seguir seus passos e também colaborar para salvar vidas. João, o pastor que um dia desafiou Deus, está novamente de mãos dadas com ele.
sexta-feira, 14 de outubro de 2011
Na guerra contra o mal, Micheli foi morta
Drogado e vivendo na prostituição desde os dez anos de idade com o nome de “Micheli”, o garoto MDSP está salvo. Ele foi acolhido por um pastor que lhe mostrou o caminho do bem. Sem mãe e com o irmão preso, ele agora deseja ter o amor do pai de volta.
Dilmércio Daleffe
Ele nasceu de uma família completamente desestruturada. Cresceu vendo o pai cair diante do vício do álcool. A mãe, jamais conheceu e o irmão mais velho está preso. Veio de São Paulo ainda criança e já, aos dez anos de idade, vestia-se como mulher para se prostituir nas esquinas escuras de Campo Mourão. Sua vida sempre foi uma decadência moral. Passou a usar drogas pesadas e, tantas foram às vezes, que começou a desenhar uma dívida impagável com traficantes. Seus programas tornaram-se obrigatórios apenas para quitar a conta com os bandidos. Até os 17 anos conheceu gente sem caráter, maníacos, viciados e toda a escória restante da sociedade. Mas na guerra entre o bem e o mal, ele acabou se salvando. Anjos apareceram e desafiaram as armas do diabo. Hoje, “Micheli”, como era conhecido, está livre. Parou com as drogas, faz orações diariamente e não quer mais saber de homens. “Sei que fiz coisas que não queria. Mas no futuro quero construir uma família ao lado de uma mulher”, disse.
Na verdade, “Micheli” era apenas um nome de guerra. Era utilizado anteriormente, quando ainda estava perdido, sem um caminho claro. Já se passou mais de um ano desde que abandonou as drogas. Mesmo assim, ainda não tem o amor de seu pai. Ele continua a beber. No próximo mês, MDSP – iniciais do menino – completa 18 anos. Pouco para quem muito viveu. A sua história é somente mais um retrato do fardo pesado das ruas da cidade. Enquanto a maioria da população dorme tranqüila, outra parte dela fica acordada. Prefere conviver na escuridão e desafiar as leis dos homens.
O menino tem traços de uma criança mal tratada, olhos grandes e negros, mas ainda uma adolescência a flor da pele. Gosta de brincar e vive sorrindo, mesmo do passado. Cresceu com a doença do vício e fez mal a ele próprio. Em casa, apanhava e jamais teve uma palavra de carinho. Um conforto fraternal. O lado homossexual era o grande dilema com o pai, pedreiro de profissão. Por inúmeras vezes sofreu calado diante aos espancamentos. Mas tudo tem limite. A última vez que ia apanhar, decidiu bater. Encarou o pai e bateu, muito. A partir daí, a relação entre os dois praticamente acabou.
MDSP sempre buscou saber informações sobre a mãe. O pai evita o assunto. Hoje, o menino não sabe nem ao menos se ela está viva. Sua única pista é que ela morava em São Paulo. Veio para Campo Mourão com o pai e o irmão mais velho – ele está preso por roubo. Ao lado do primogênito roubava a casa dos próprios amigos. Não tinha limites, muito menos bom senso. Enquanto estava sob a tortura do mundo químico das drogas, o garoto tatuou em uma das mãos a frase “Deus é fiel”. Nem ele sabe ao certo porque escreveu tal mensagem. No entanto, já podia ser um indício da guerra entre o bem e o mal que se iniciava.
Retomada pela vida
Há pouco mais de um ano, “Micheli” caminhava próxima a sua casa. Estava a caminho de uma “boca” para comprar cocaína. Usava um mini shorts, uma camiseta colada ao corpo e rebolava como uma mocinha. Na calçada, recebeu um convite de um pastor. Na verdade tratava-se de uma passagem com destino à vida. Era a sua redenção, sua libertação. Adão Adriano, pastor da Assembléia de Deus, pediu que fosse a sua casa para receber uma oração. “Eu sabia que aquele garoto estava perdido nas drogas. Por isso quis ajudá-lo”, disse. MDSP aceitou, sem compromisso. Nunca mais saiu do abrigo da Igreja. Foi lá que recebeu orações, se desintoxicou e hoje recorda o passado com arrependimentos.
“Quero seguir o caminho do bem. Sempre orar e estar do lado de Deus”, disse o garoto. Praticamente convertido, ele também fala do lado homossexual, o qual diz ter deixado, esquecido. Num futuro, acredita construir uma família ao lado de uma bela mulher, ter filhos e seguir um destino justo, longe dos demônios que o assombraram. Quanto ao pai e ao irmão, quer trazê-los junto à igreja e também afastar o mal de suas vidas. Às vésperas dos seus 18 anos, “Micheli” foi morta, não existe mais. Nasceu MDSP.
Dilmércio Daleffe
Ele nasceu de uma família completamente desestruturada. Cresceu vendo o pai cair diante do vício do álcool. A mãe, jamais conheceu e o irmão mais velho está preso. Veio de São Paulo ainda criança e já, aos dez anos de idade, vestia-se como mulher para se prostituir nas esquinas escuras de Campo Mourão. Sua vida sempre foi uma decadência moral. Passou a usar drogas pesadas e, tantas foram às vezes, que começou a desenhar uma dívida impagável com traficantes. Seus programas tornaram-se obrigatórios apenas para quitar a conta com os bandidos. Até os 17 anos conheceu gente sem caráter, maníacos, viciados e toda a escória restante da sociedade. Mas na guerra entre o bem e o mal, ele acabou se salvando. Anjos apareceram e desafiaram as armas do diabo. Hoje, “Micheli”, como era conhecido, está livre. Parou com as drogas, faz orações diariamente e não quer mais saber de homens. “Sei que fiz coisas que não queria. Mas no futuro quero construir uma família ao lado de uma mulher”, disse.
Na verdade, “Micheli” era apenas um nome de guerra. Era utilizado anteriormente, quando ainda estava perdido, sem um caminho claro. Já se passou mais de um ano desde que abandonou as drogas. Mesmo assim, ainda não tem o amor de seu pai. Ele continua a beber. No próximo mês, MDSP – iniciais do menino – completa 18 anos. Pouco para quem muito viveu. A sua história é somente mais um retrato do fardo pesado das ruas da cidade. Enquanto a maioria da população dorme tranqüila, outra parte dela fica acordada. Prefere conviver na escuridão e desafiar as leis dos homens.
O menino tem traços de uma criança mal tratada, olhos grandes e negros, mas ainda uma adolescência a flor da pele. Gosta de brincar e vive sorrindo, mesmo do passado. Cresceu com a doença do vício e fez mal a ele próprio. Em casa, apanhava e jamais teve uma palavra de carinho. Um conforto fraternal. O lado homossexual era o grande dilema com o pai, pedreiro de profissão. Por inúmeras vezes sofreu calado diante aos espancamentos. Mas tudo tem limite. A última vez que ia apanhar, decidiu bater. Encarou o pai e bateu, muito. A partir daí, a relação entre os dois praticamente acabou.
MDSP sempre buscou saber informações sobre a mãe. O pai evita o assunto. Hoje, o menino não sabe nem ao menos se ela está viva. Sua única pista é que ela morava em São Paulo. Veio para Campo Mourão com o pai e o irmão mais velho – ele está preso por roubo. Ao lado do primogênito roubava a casa dos próprios amigos. Não tinha limites, muito menos bom senso. Enquanto estava sob a tortura do mundo químico das drogas, o garoto tatuou em uma das mãos a frase “Deus é fiel”. Nem ele sabe ao certo porque escreveu tal mensagem. No entanto, já podia ser um indício da guerra entre o bem e o mal que se iniciava.
Retomada pela vida
Há pouco mais de um ano, “Micheli” caminhava próxima a sua casa. Estava a caminho de uma “boca” para comprar cocaína. Usava um mini shorts, uma camiseta colada ao corpo e rebolava como uma mocinha. Na calçada, recebeu um convite de um pastor. Na verdade tratava-se de uma passagem com destino à vida. Era a sua redenção, sua libertação. Adão Adriano, pastor da Assembléia de Deus, pediu que fosse a sua casa para receber uma oração. “Eu sabia que aquele garoto estava perdido nas drogas. Por isso quis ajudá-lo”, disse. MDSP aceitou, sem compromisso. Nunca mais saiu do abrigo da Igreja. Foi lá que recebeu orações, se desintoxicou e hoje recorda o passado com arrependimentos.
“Quero seguir o caminho do bem. Sempre orar e estar do lado de Deus”, disse o garoto. Praticamente convertido, ele também fala do lado homossexual, o qual diz ter deixado, esquecido. Num futuro, acredita construir uma família ao lado de uma bela mulher, ter filhos e seguir um destino justo, longe dos demônios que o assombraram. Quanto ao pai e ao irmão, quer trazê-los junto à igreja e também afastar o mal de suas vidas. Às vésperas dos seus 18 anos, “Micheli” foi morta, não existe mais. Nasceu MDSP.
Cerqueira, o fotógrafo
Dilmércio Daleffe
Dono de uma brilhante carreira em Campo Mourão, o fotógrafo Nelson Cerqueira Pacheco vem colecionando imagens capazes de contar por si só, a história contemporânea da cidade. São fotografias únicas, com um olhar singular e um sentimento que só ele consegue transmitir. Uma delas, possivelmente, a sua marca maior, é do raio incidindo sobre a catedral. No entanto, hoje, são tantas as boas imagens captadas por ele que a sua qualidade extravasou os limites.
Nelson é natural de Muriaé, Minas Gerais. Veio para Campo Mourão há 27 anos, quando ainda era bancário. Trabalhava no Bradesco, mas cansado da atividade, decidiu voltar-se à fotografia. Fez uma espécie de auto análise. Foi então que na década de 80 largou a profissão e decidiu investir nas câmeras. Nunca mais parou. Começou com uma Olympus e hoje apaixonou-se pela Nikon. Quando um fato está acontecendo, lá está ele entre a multidão. Jamais perdeu um bom click. É, certamente, o melhor e mais experiente profissional da cidade.
Aos 52 anos de idade, Nelson entende a fotografia como a arte em captar uma fatia do tempo, das pessoas ou da natureza. Além disso, inserindo qualidade e impacto à imagem, eternizar aquele momento único. “A idéia é causar alegria e satisfação às pessoas”, diz. Nos 27 anos em que adotou a cidade, Nelson já captou inúmeros fatos em suas lentes. Boa parte da recente história de Campo Mourão acabou sendo resumida em fotos por ele. Foram pessoas, tempestades, políticos e tudo mais que atravessou seu caminho. O disparador sempre esteve pronto. Atualmente ele está voltado para as atividades esportivas da Fundação de Esportes de Campo Mourão – Fecam – onde, segundo ele, encontrou prazer. Mas se fosse falar sobre a foto preferida, discorreria um grande texto de uma imagem ainda na construção da Santa Casa. Afinal, a arte e a política muitas vezes caminham juntas.
segunda-feira, 3 de outubro de 2011
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