No alto do morro, bem no topo, uma pequena igrejinha descansa solitária. Ela está no município de Ribeirão Claro, norte pioneiro do Paraná. À beira da estrada, encontra-se abandonada. Quase sem teto, imagens a mercê, quase ninguém pra orar.
sábado, 16 de novembro de 2013
segunda-feira, 4 de novembro de 2013
quinta-feira, 10 de outubro de 2013
Nicolau foi o primeiro e o último ferreiro
Dilmércio Daleffe
Ele tinha um desejo. Queria morar e prosperar em Campo
Mourão. Então, ao lado da mulher e filhos, deixou a pequena Mallet, no Paraná,
para estabelecer-se sob a poeira vermelha. Chegou ainda na década de 50 e,
aqui, ficou até morrer. Nicolau Szapak fez história. Foi o primeiro e também o
último ferreiro da cidade. Iniciou consertando fogões a lenha, fazendo
talhadeiras e desenvolvendo pequenas ferramentas. Antes de deixar a vida,
continuava a labuta, mas agora, construindo churrasqueiras e criando
escapamentos. Ucraniano, Nicolau morreu há 11 anos. No entanto, sua história
jamais desapareceu. Ela está guardada na memória dos amigos e pessoas que o
conheceram. Embora tivesse um ofício simples, foi responsável por inúmeras
lições. Sem medo de errar, pode-se afirmar que o velho ferreiro teve
participação fundamental na formação da comunidade mourãoense, principalmente,
através de seu maior legado: a honestidade.
Uma comunidade é construída a partir de valores e da
formação de seu povo. E Campo Mourão, teve sua construção moral através de
famílias pioneiras que aqui vieram. Um destes desbravadores foi Nicolau. Chegou
em 53, ao lado da esposa Emília. Veio acreditando ser uma cidade promissora.
Tanto acreditou que jamais foi embora. Naquele ano, surgiu com um facão na mão.
As estradas ainda eram precárias e, vez em quando, picadas em meio ao mato
tinham que serem feitas. Aqui, instalou-se num casebre onde é hoje a esquina da
Avenida Manoel Mendes de Camargo e a Rua Mato Grosso – mais especificamente
onde está hoje o estacionamento da Dipar.
Junto a casa, montou a ferraria. A partir disso, passou a
trabalhar e colaborar com o desenvolvimento da cidade. Fazia de tudo, como
instrumentos e ferramentas em ferro. Até ouro derretia na forja. Teve seis
filhos. A eles, insistiu numa educação rígida, repleta de ensinamentos. Sua
filha mais nova, Hanucia, não esquece aquelas palavras. “Pregava muito sobre
honestidade. Jamais me esqueci de suas lições”, disse. O homem, apesar do pouco estudo, tinha uma
enorme sabedoria. Adorava ler. E diante das revistas e jornais, devorava cada
um. Foi também um colecionador de amigos e jamais identificou um inimigo. Um
deles foi Estefano Domanski. Até hoje lembra do amigo com ternura. “Ele se foi.
É a vida. Mas não esqueço das nossas pescarias. Era um homem generoso, honesto,
amigo. Adorava contar uma piada. Nos divertíamos bastante”, conta ele.
Domanski lembra que Nicolau era um artista. Fazia com o
ferro o que muitos não fazem nem no papel. “Ele me deu uma machadinha. Era tão
boa que não precisava afiar”, disse. Hanucia também tem lembranças de objetos
que o pai fazia. Aliás, mesmo doente, Nicolau não se afastava da ferraria. Era
sua paixão, seu hobbie, sua vida. “Ele viveu para o seu trabalho. Tanto é que
não ligava para bens materiais. Se quisesse tinha ficado rico. Mas preferiu
apenas viver. E viveu à família e aos amigos”, ressalta. A filha não esquece de
uma frase dita pelo pai: “Se um dia aplicar seu dinheiro, invista na terra, porque
ela floresce. Já os materiais, estes apodrecem”. A educação deixada por Nicolau
foi tão intensa que Hanucia ainda preserva parte dos ensinamentos.
Culturalmente, ela nunca deixou de falar a língua ucraína. Além disso, continua
a passar para outras gerações as pinturas em pessankas – ovos coloridos a mão.
Embora não gostasse de se meter em política, o velho
ferreiro havia sido vereador em Mallet. Mas em Campo Mourão, esqueceu-se
daquele passado. Preferia a vida pacata e zen a revolta do povo. Dizia que um
bom prefeito é aquele que faz o bem para sua cidade, principalmente, depois de
eleito.
Nicolau é um patrimônio de Campo Mourão. Como desbravador e
pioneiro, deixou um legado moral invejável. Suas lições de educação e
honestidade sem dúvida alguma tiveram influência na comunidade. Assim como
grandes empresas deixam rastros de progresso, Nicolau ajudou a florescer o
futuro. Fez sua parte. Mas ao contrário de muitos, preferiu olhar apenas à
frente. Sempre acreditou na cidade. E como diz a própria filha, teve orgulho de
ter morrido nas terras de Campo Mourão. Nicolau, o ferreiro, viverá para
sempre.
Darci Deitos é uma página aberta
Dilmércio Daleffe
Sim, ele tinha defeitos. Mas quem não os têm? Um humor nem
sempre para cima. Uma cara quase nunca boa. Era feito de carne, osso e alma,
como todos nós. Mas ele deixou a vida. Darci Deitos morreu na última
terça-feira, dia 08 de outubro. Era considerado como uma espécie de segundo pai
para muitos dos amigos de seus filhos. Chegava mansinho, chamando de “guri”. “Como
vai? O que tem feito?”. Perguntava sobre a vida, queria saber dos planos
futuros. Dava conselhos. Coisas da vida.
É bem certo que a maioria dos humanos se vai fechando todas
as páginas do livro de suas vidas. Mas Darci deixou seu livro aberto. As
páginas escritas por ele estão lá, arreganhadas, pra todo mundo ver. Quem o conheceu
sabe que foi uma figura sem igual. Politizado, buscou ainda cedo um sentido
maior a sua jornada. Assim, encontrou na vida pública espaço para a política.
Foi deputado estadual e depois deputado federal constituinte. Atuou ao lado de
grandes políticos. Era do velho MDB.
Sempre paralelamente à política, foi empresário hoteleiro.
Jamais abandonou Campo Mourão. Aqui fez sua parte. O tempo passava, mas seu
espírito continuava jovem. Tanto é que Darci acompanhava a vida dos filhos.
Fazia questão, quando podia, de estar presente nas festas dos amigos de seus
filhos. Metido a cozinhar também mantinha alguns rituais. Somente os mais
chegados degustaram suas iguarias. E elas eram boas.
Sérgio Kffuri, amigo de velha data, lembra de histórias
memoráveis do amigo. Lembra do velho fusca branco o qual iam até Engenheiro
Beltrão namorar as mocinhas. Darci tinha um ciúme doentio daquele carro. Certa
vez levou quatro amigos até a cidade. O objetivo era adentrar um bailinho. Mas
não permitiram a entrada dos mourãoenses. Então, Darci decidiu acabar com a
festa. Foi até o poste e desligou a chave geral. Depois disso, o jeito foi
correr até o carro e fugir da cidade. Desesperados, os cinco amigos já dentro
do fusca, começaram a sentir um cheiro de merda. Com ciúmes do fusquinha, Darci
fez um a um sair do carro pra ver quem havia pisado no coco de cachorro.
Ninguém pisou em nada. Darci então olhou a sola do próprio sapato e viu um
tolete de merda. Com raiva tirou os sapatos e os atirou pela janela do carro.
Esquecendo-se que o restante da bosta continuava na pedaleira do fusca, meteu o
pezão sem sapato no acelerador e veio embora.
Outra vez, em Curitiba, Darci voltava de uma festa ao lado
de Max – seu filho – e outros amigos. Parou o carro ainda na rua, no
Champagnat. Era madrugada e, naquela avenida, quase ninguém. Mas acontece que
existem coisas que só aconteciam com Darci. E aquele dia não foi diferente. Ao
sair do carro, a chave caiu de sua mão. Ela poderia ter caído dentro do carro,
ou até, no asfalto. Mas não. As chaves caíram dentro de um bueiro. E daí? Eram
as chaves da casa, do carro, de tudo. Então, uma única alma foi avistada ao
longe, andando sentido ao carro. Era um rapaz, de 18 ou 19 anos. Darci não
pensou duas vezes: “Max, vai lá e oferece um dinheiro aquele malaco. Fala pra
ele vir pegar a chave”, disse. O sujeito aceitou o desafio e depois de alguns
minutos conseguiu retirar a tampa de concreto. Mas a cena inesquecível foi ver
pai e filho segurando as pernas daquele malaco. Como num filme, de madrugada, o
sujeito estava dependurado para apanhar a chave, e conseguiu.
Muitas outras histórias envolvendo Darci continuam sendo
contadas. E elas serão eternizadas. Graças a Deus, pudemos conhecê-lo. Mas o
seu jeito sistemático, às vezes ranzinza, nunca será esquecido. Darci era do
bem e queria o melhor a sua sociedade, a sua cidade, ao seu povo. Como já dito,
suas páginas não foram fechadas. O livro de sua vida está aberto a todos. E
como foi bom lê-lo...
domingo, 22 de setembro de 2013
Os sonhos de Cleuza são infinitos
Quanto vale um
sonho? Para Cleuza, seu sonho não tem preço. Afinal, para ter sua habilitação,
fez até promessa em Aparecida do Norte. Já foram nove tentativas, nove
reprovações. Como auxiliar de cozinha, os amigos brincam dizendo ser melhor ela
pilotar apenas o fogão.
Dilmércio Daleffe
Sonhos existem para renovar esperanças. E desde os
primórdios, o ser humano é movido por seus desejos. Assim, cada pessoa, em seu
interior, imagina suas conquistas. E sonhar, além de bom, não custa nada. É
desta maneira que Cleuza – nome fictício da mulher que não quer ser
identificada – vem imaginando suas glórias. Há um ano, ela vem lutando para ter
o direito de dirigir o veículo da família. O único problema é passar pela prova
da baliza, no Detran. Nos últimos 12 meses, foram nove tentativas, todas
frustradas. Sua persistência é tão
grande que foi até Aparecida do Norte pedir. “Fui lá e fiz promessa. Ainda vou
tirar minha carteira de motorista”, disse.
Cleuza é uma auxiliar de cozinha de 43 anos de idade. Mulher
simples, batalha todos os dias para o sustento de sua família. Ela de um lado,
o marido de outro. E, juntos têm três filhos. Ao mesmo tempo em que trabalha, não
para de pensar na bendita carteira de motorista. “As vezes nem eu acredito que
já reprovei tantas vezes”, disse. Na verdade, ela já possui habilitação, mas de
moto. Quer agora a carteira de carro. Cleuza trava a batalha para poder ser
mais independente na vida, não depender tanto da ajuda do marido. “Se eu
tivesse a carteira poderia fazer minhas coisas sozinha, sem atrapalhar ele”,
explicou.
O maior dilema de Cleuza é adentrar aos portões do Detran e
se desesperar. Segundo ela, mesmo sabendo fazer as manobras, bate uma
ansiedade, uma pressão na prova. “Nas aulas perto do cemitério faço a baliza em
até dois minutos, sem bater em nada. Mas quando é pra valer, acabo errando”,
diz. Em uma das nove vezes ela até passou na baliza. Mas daí, acabou reprovando
na direção de rua. Parece até coisa do destino.
Preocupada com seu drama, foi parar em Aparecida do Norte.
Lá, pediu, orou e fez promessa pra quando passar nos testes. “Levei uma foto
minha ao lado do carro pra ser abençoada. Deus vai me ajudar”, revelou. Segundo
ela, quando isso acontecer, vai ter churrasco e fogos de artifício. Mas
enquanto o milagre não vem, o jeito é treinar mais e mais vezes. Falando nisso,
daqui uma semana, uma nova prova será realizada. Será a décima tentativa. Caso
não passe novamente, terá de pilotar apenas seu fogão. Cleuza continua a
sonhar.
sexta-feira, 20 de setembro de 2013
quarta-feira, 18 de setembro de 2013
Felício morreu distante da felicidade
Felício morreu
sem Deus, sem misericórdia e sem saúde. Era um cara normal, de apenas 50 anos. Desenvolveu obesidade mórbida depois de uma desilusão amorosa.
Diante de tanto sofrimento, não conseguiu que identificassem os sintomas que o
levaram à morte. Agora ele se foi. Seus sonhos acabaram. A família clama por justiça.
Dilmércio Daleffe
No dicionário de nomes
próprios, Felício significa feliz e indica uma pessoa de personalidade
agradável e generosa. Isso na teoria. Na prática, Felício Jorge Franco Abdalla,
teve motivos de menos para não conhecer o termo felicidade. Morto na
segunda-feira, ele foi sepultado na manhã de ontem, numa cerimônia simples, sem
reconhecimentos e sem glórias. De origem síria, o homem morreu sozinho, depois
de uma guerra contra ele próprio. Lutando contra a balança, pesava 270 quilos.
Quase não mais se locomovia. Morreu pobre, sem amigos, sem Deus e, de acordo
com a filha, Liz, desassistido pela Saúde brasileira. Seu quadro era
assustador. Com feridas abertas nas pernas, larvas o consumiam. Fora isso,
apresentava problemas cardíacos e respiratórios. Mesmo a filha clamando por uma
internação, médicos insistiam dizendo ser desnecessária. E, diante de um
festival de equívocos, Felício acabou morto. Morreu por falência múltipla de
órgãos, edema agudo no pulmão e uma pneumonia grave.
Os problemas de
Felício tiveram início há quase seis anos. Com tendência para engordar, ele
desenvolveu a conhecida obesidade mórbida depois de ter se separado da amásia,
com quem teve uma filha, Sabrina. Acontece que não conseguia suportar o fato de
ficar sem a mulher. A partir de então, passou a descontar a tristeza e solidão
na comida. Ainda “gordinho”, iniciou uma jornada sem volta. Comia tanto que seu
peso explodiu. E as consequências logo apareceram. Experiente motorista de
caminhão, afastou-se do trabalho e, após tanta insistência para voltar com a
mulher, decidiu deixar a cidade de Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul. Foi morar
com um irmão, num sítio no município de São José, em Santa Catarina.
Lá, com feridas nas
pernas ocasionadas pelo peso, passava a maior parte do tempo sobre a cama. Nas
idas e vindas até Ponta Porâ, novamente em busca de sua paixão, perdeu uma
cirurgia bariátrica. E como sua situação só se agravava, atendeu ao pedido de
sua outra filha, Liz Dalmi Abdalla de Jesus. Fruto do primeiro casamento e
residente em Campo Mourão, ela o chamou para vir morar na cidade. Atendendo ao
seu desejo, Felício deixou as areias de Santa Catarina há apenas três meses e
veio até as terras vermelhas do Paraná. Passou a morar com a moça, seu genro e
duas netas. Mas aqui as coisas só se agravaram.
Liz conta que mesmo
cuidando do pai, as feridas das pernas não cicatrizavam. Um dia, ao verificar
sua pele, notou ovos de insetos que saiam dos machucados. Então o levou até o
postinho de saúde e lá descobriram que uma das pernas estava repleta de larvas.
Elas consumiam o membro, o que fazia exalar um cheiro forte, podre. O quadro
era a explicação da febre incessante do pai. Tomando medicamento para combater
as larvas, sua cama amanhecia com sangue e “bichos” aos montes, conta a filha.
Mas na última semana, mais
precisamente na quarta-feira, dia 11, Liz decidiu ir até o posto de saúde
novamente e pedir uma internação ao pai. É que agora ele reclamava de falta de
ar. Segundo ela, do posto, Felício foi encaminhado ao 24 horas. Lá, após uma
espera de quase oito horas, uma médica teria negado a internação. “Ela disse
que não era caso para internação. Disse que existiam casos mais graves. Se
referia apenas as larvas de sua perna. Mas em nenhum momento falou sobre a
falta de ar. Ninguém examinou ou pediu exames de seu pulmão”, afirmou. Sem
receber a atenção que queria, a família voltou para casa. Liz disse ter se
sentido humilhada, principalmente, por não ter conquistado um direito básico a
todo cidadão brasileiro: saúde.
Na quinta, sexta e
sábado, Liz levou o pai até o posto de saúde para tomar os remédios
(Cefalexina) receitados pela equipe do 24 horas. Mas a febre voltou forte e a
falta de ar só piorava. No domingo, Felício caiu de sua cama e, não conseguindo
mover as pernas, Liz acionou a equipe de socorristas do 193. Com o peso, eles
não conseguiram removê-lo. Chamaram mais dois policiais militares para ajudar.
Mesmo assim, ainda foram necessários outros homens do Corpo de Bombeiros para
leva-lo até a Central Hospitalar. O cheiro era tão forte que os socorristas
adentraram a casa de Felício com máscaras. “Suas pernas estavam apodrecendo. O
cheiro era forte demais. Além disso ele começou a ter bolhas e secreções em
todo o corpo. A situação do meu pai não era nada boa”, disse Liz. Segundo ela,
ele estava tão deprimido com a própria situação que culpava Deus. “Ele dizia
que Deus havia o abandonado”.
Levado até o hospital,
Felício não suportou e morreu na manhã de segunda-feira. De acordo com a
certidão de óbito, morreu por pneumonia grave. Ali, naquela cama fria de
hospital, todos os sonhos do ex-motorista de caminhão haviam sido encerrados.
Ele tinha o desejo de melhorar a vida das filhas, dar um futuro decente as
netas. Mas não teve tempo. Deixou a vida aos 50 anos de idade. Para a família,
a saúde brasileira o abandonou.
“Nada vai trazer meu
pai de volta. Eu sou pobre e também pago impostos e vejo que nada se faz nesta
cidade. Tudo continua sempre igual. Vemos nas eleições o povo se vendendo por
um tanque de gasolina, uma cesta básica e nada muda de novo. Até quando vamos
ver a mesma cena”? questiona Liz. Ela denunciou o caso ao Ministério Público e
aguarda justiça. A secretária de Saúde de Campo Mourão, Patrícia Chandoha, foi
procurada ontem e preferiu não se manifestar. Segundo ela, vai verificar a
situação, ver os pareceres e prontuários antes de falar sobre o assunto.
domingo, 8 de setembro de 2013
Refugiado político, José Daniel virou profeta
O uruguaio José Daniel é
um refugiado político que optou seguir sozinho pelas estradas brasileiras. Na
contramão da sociedade, decidiu isolar-se do mundo para refletir sobre ele
próprio, o mundo, a vida. Com um cajado na mão e uma roupa branca,
segue de cidade em cidade em busca de um objetivo ainda não definido. Deseja apenas viver, mas do jeito dele.
Dilmércio Daleffe
Quando o chão desaparece e a sorte some, o jeito é respirar
e continuar a viver. E é assim que o uruguaio José Daniel, de 59 anos, vem
fazendo. Refugiado político de seu país, atravessou a fronteira já, há três
anos e percorreu quase todos os países da América do Sul. Mas, somente este ano
chegou ao Brasil. Na verdade, trata-se de um andarilho, um nômade. Um homem
extraordinariamente culto, que fala sobre medicina oculta, astros, Deus,
harmonização da natureza. Um sujeito diferente, que prefere livros a bebida,
conversa a discussão. José Daniel transformou-se num profeta. Hoje, caminha só
numa estrada sem destino. Mesmo vendo as placas e, seguindo sem direção, diz
não estar perdido, embora ainda procure a si mesmo.
José foi encontrado carregando um cajado e vestido com uma
roupa comprida, toda branca. Usava um chapéu surrado, de cor azul. Seus pés
vestiam chinelos improvisados com elásticos coloridos. Sua barba grisalha escondia
o rosto de um homem sofrido, marcado pelo tempo. À sua frente, um saquinho de
papel com algumas moedas e notas de R$2. Um cartaz escrito em espanhol o
anunciava como um profeta. Ao lado, encostada no poste, uma bicicleta antiga
que segurava sua mochila de viagem. Mas se ele, apenas por si só já chama a
atenção, ouvi-lo é uma surpresa ainda maior.
Falando baixinho, quase em sussurros, numa tentativa
frustrada de português, José conta que viaja com sua magrela estrada a fora
carregando uma carriola. Nela vão seus livros, objetos, esperanças. E é ali
onde ele também passa suas noites. Com uma coberta velha, dorme tranquilo em
seu interior. Não depende de ninguém pra descansar. Comida jamais faltou. Para
isso, ele inventa umas esculturas, distribui pequenas mensagens bíblicas e
assim vai ganhando uns trocados. Viaja sozinho, lendo, divagando, refletindo,
numa paz de dar inveja. “Ser profeta não significa ser sábio. Qualquer um pode
ser profeta. Para isso basta ter persistência”, disse.
José está sozinho no mundo há pelo menos três anos. Foi uma
decisão sua e, apenas sua. Na solidão de seus botões, acredita num mundo honesto,
de paz, harmonioso. E é por isso que continua a andar. Está atrás de sua
verdade, dele mesmo. “Meu objetivo é fortalecer minha espiritualidade. É me
encontrar. Descobrir a mim”, disse. A princípio pensa-se num homem fora de si,
maluco, enlouquecido. Mas não é bem assim. Em pouco mais de uma hora de
conversa, não demonstrou nada de louco. Pelo contrário. Ele sabe o que deseja.
Busca o litoral brasileiro, mais especificamente, Santa Catarina. Lá, quer
encontrar sua companheira e iniciar uma família.
Conta que ainda em Montevidéu – capital do Uruguai – ganhava
a vida como engenheiro de som e iluminador profissional de teatro. Mas era
contra o governo do Presidente José Mujica. Então, segundo ele, foi perseguido,
sendo forçado a deixar seu país. A partir daí, descobriu que a estrada era seu
destino. E foi desta maneira, com a solidão e a leitura, que foi buscando a si
mesmo. “O bem e o mal existem. Mas eles estão escondidos dentro de cada um de
nós. Alguns deixam o mal escapar. Outros, o bem”, disse.
Mesmo com demônios aflorados, a humanidade é feita a imagem
e semelhança de Deus, disse José. Mas, segundo ele, a paz só aparecerá depois
que cada um descobrir a sua verdade interna. “O homem necessita descobrir-se.
Caso contrário, a paz não virá”, acredita. Fora suas meditações, o profeta é
como qualquer outro homem. Afinal, não é nenhum Deus. Tem fome, sente sede e
necessita do capital para sobreviver. O
que muda são apenas suas atitudes. E os caminhos pelos quais percorre. É um
homem de paz, em busca de paz. Mas pelo que se vê, ao invés de caminhar sobre
as flores, vem encontrando vias repletas de espinhos.
terça-feira, 3 de setembro de 2013
Casarim encerrou sua jornada. Pedro Henrique começará a dele
O empresário Iderlando Casarim,
após ter queimado mais de 50% de seu corpo, e ficar três meses internado, não
resistiu e morreu na manhã de domingo. No dia do acidente, ele foi socorrido
pela jovem Ranielle Batista dos Santos que, mesmo grávida, teve atitude para
abafar as chamas de seu corpo com um cobertor. Quando os destinos de duas
pessoas resolvem ser cruzados, ainda mais com ações nobres, o mundo parece
ficar mais saudável.
Dilmércio Daleffe
Foi uma segunda-feira amargurada para Ranielle Batista dos Santos. A
menina de apenas 19 anos acordou cedo em Luiziana, apanhou o ônibus e seguiu
rumo a Campo Mourão, onde trabalha numa loja de roupas. Ao chegar à empresa,
notou que do outro lado da rua, uma placa de luto estampava a corrente do Sushi
bar. Acontece que ali mesmo, ainda em junho deste ano, ela socorreu o
empresário Iderlando Casarim. Ao mexer com álcool, ele teve mais de 50% do corpo
em chamas. Então, correu para rua tentando apagar o fogo. Ao vê-lo,
desesperado, a menina não pensou duas vezes e pegou algumas cobertas para
tentar abafar as chamas. E conseguiu. Uma ação heróica, ainda mais para uma
grávida de seis meses. Mas ontem, ela viu que toda sua atitude foi em vão. O
empresário não suportou os ferimentos e, depois de quase três meses lutando pela vida
num hospital de Londrina, não resistiu.
“É um dia muito ruim pra mim. Mesmo que meu filho venha a nascer hoje,
não terei como comemorar”, revelou a jovem ontem. Abalada com a morte do
empresário, ela nem ligou a caixa de som que, todos os dias, é ligada com
música em frente ao estabelecimento onde trabalha. Ranielle explica que, embora
não tivesse uma amizade com Casarim, os dois se viam quase todos os dias. Eram
vizinhos e colegas de trabalho. Mas o fato de ter ajudado o empresário, naquela
manhã de junho, de alguma forma, aproximou os dois. “Vou carregar aquela cena,
o seu sofrimento, comigo para o resto da vida. Tento, mas não consigo esquecer
o drama que ele passou”, diz Ranielle.
Ainda ontem, a menina foi até o velório de Casarim. Lá, ela foi abraçada
e muito elogiada pelos familiares do empresário. No entanto, foi Ranielle quem
acabou consolando a família. Disse para que não chorassem, porque Deus sabia o
que estava fazendo. Hoje, ela está numa gestação de oito meses e três semanas.
“Posso ter meu bebê a qualquer momento”, explicou. Agradecido com sua atitude,
o irmão de Iderlando, que mora em Londres, na Inglaterra, ajudará com presentes
ao recém nascido. Não se trata de compaixão, mas sim, gratidão. De rosto
angelical, Ranielle mede apenas 1,59 de altura. Mas pode considerar-se uma
gigante nas atitudes. Católica, acredita fielmente em Deus, e, nos anjos. Nos
próximos dias, ou horas, a moça ganhará seu primeiro filho, Pedro Henrique. São
as contradições do mundo. Enquanto Casarim cumpriu sua jornada, uma nova vida
está surgindo. Pedro Henrique virá em forma de um anjo, nos braços de outro anjo.
O fato
Empresário do ramo da gastronomia, Iderlando decidiu eliminar o mato em
frente ao seu restaurante de uma forma diferente: com álcool. Primeiro jogou
uma quantidade e depois ateou fogo. Como não deu certo, jogou mais com o
recipiente próximo ao corpo. Acontece que as chamas ocasionaram a explosão do
líquido que segurava. Como resultado, teve cerca de 50% do corpo queimado.
Sozinho no local, Iderlando teve tempo para proteger o rosto e correr em busca
de socorro até a rua. Seus gritos eram ouvidos longe. Naquele instante muita
gente viu a cena, mas não tiveram atitude suficiente para ajudar. Apenas duas
pessoas socorreram o empresário: primeiro Ranielle e depois um homem ainda não
identificado. Juntos, os dois abafaram as chamas do corpo com a ajuda do
cobertor levado pela moça.
Iderlando Casarim viveu intensamente
Pode-se dizer que Iderlando viveu para seus amigos. Não tinha muitos,
mas cultivava cada um deles, sempre, com um belo sorriso. Vaidoso, era
impecável com suas camisas. Também adorava um bom perfume. E desta forma,
também era um galanteador. Ele até dizia que se achava parecido com o ator
espanhol Antônio Banderas. Brincalhão, adorava uma piada. Mesmo em tempos
ruins, sem grana, dava um jeito. Ele não esquentava muito a cabeça. Já fez de
tudo na vida. Mas por último havia sido vendedor de carros e dono do
restaurante Sushi Bar. Deixou apenas um filho, Bruno, hoje com 23 anos.
Iderlando foi intenso enquanto viveu. Seu sorriso, o alto astral, deixarão
saudades.
domingo, 1 de setembro de 2013
Fernanda e Renato casaram-se no hospital
Renato era um cara como tantos
outros até pouco tempo. Namorava, trabalhava e vivia intensamente todos os dias
de sua vida. Mas há quase um ano, levou um tiro no pescoço. Ficou 11 meses
internado entre a vida e a morte. Depois, descobriu ter ficado tetraplégico.
Saiu do hospital esta semana. Mas antes, casou-se com a mulher que ama, Fernanda.
A cerimônia aconteceu entre os aparelhos e camas do Hospital Cajuru, de
Curitiba. Renato e Fernanda estão voltando pra casa.
Dilmércio
Daleffe
Fernanda
e Renato se conhecem há seis anos. Da amizade brotou a paixão. Ela,
trabalhadora de uma gráfica. Ele, operário da construção civil. Tinham uma vida
simples, longe de regalias e do luxo das famílias poderosas. Pobres, e sem
recursos, construíram sua casa aos fundos do lote dos pais dele. Um lar sem
tijolos. Apenas com paredes de compensados. Mas no seu interior, um teto feito
à base da honestidade e da sinceridade de um grande amor. Mas há 11 meses, a
vida parou. No dia 5 de outubro de 2012, numa ação inexplicável, um homem
drogado atirou contra Renato. O disparo no pescoço o deixou tetraplégico. A
partir daí, tudo mudou, com exceção da paixão e do amor.
Fernanda
Nalon, aos 20 anos de idade, é obcecada pelo companheiro. Tinha apenas 14
quando uma paixão avassaladora a uniu com Renato. Destinos cruzados, vidas
passadas, seja lá o que tenha sido, foi forte demais. Renato Tarachuk tem hoje
27 anos. Sempre foi pobre, mas honesto. Desde que ajoelhou-se a ela, sabia que
o futuro seria ao seu lado. E foi desta maneira, que numa tarde de domingo, no
município de Bituruna – Sul do Paraná – os dois saíram juntos para ir até a
chácara de um amigo. Estavam namorando, rindo, se distraindo, quando aquele
homem drogado atravessou seus caminhos. Armado, apontou o revólver e, sem mais
nem menos, numa grande infelicidade, disparou contra o pescoço de Renato. Após
ser atingido, ainda saiu do carro e caminhou por alguns metros. Mas naquele
instante, a vida tomaria um rumo jamais imaginado.
Em estado
grave, Renato conseguiu uma vaga na UTI do Hospital Cajuru, da Pontifícia
Universidade Católica, de Curitiba. Lá permaneceu sob os cuidados de uma equipe
médica dedicada, contradizendo hoje, o que parte da população brasileira
condena sobre médicos sem instrução, mercenários ou até, sem caráter
humanitário. Foram 11 meses numa batalha entre a vida e a morte, com inúmeras
paradas cardíacas. Vivendo entre a esperança e a dúvida, entre as lágrimas de
dor, e de felicidade. Mas na guerra fria da vida, sobrou e prevaleceu o amor.
Quase um
ano dentro do hospital, Fernanda viajou poucas vezes à sua casa. Abriu mão de
sua vida particular para permanecer ao lado do cara que amava. Naqueles
corredores sem fim, não conseguiu enumerar suas orações. Enquanto rezava,
Renato batalhava pela própria vida. Foi um guerreiro por si só, como dizem os
médicos. “Somos muito apegados a Deus. Não fosse ele, Renato não estaria vivo”,
acredita Fernanda.
Mas
diante de tanto sofrimento, e do dia em que ouviu as duras e frias palavras de
que não mais andaria, Renato se revoltou. Ele não consegue perdoar aquele
sujeito que disparou o gatilho. Renato é mais uma vítima da violência urbana.
Foi mais uma estatística das atrocidades cometidas num país sem leis severas,
não respeitadas, não cumpridas. “Queria que aquele homem estivesse no meu
lugar, passando por tudo o que estou vivendo. Ele acabou com minha vida”,
afirmou.
Um
casamento no hospital
Depois de
11 meses internado, Renato teve alta esta semana. Ele está feliz demais. Afinal,
nos últimos dias conseguiu sua aposentadoria, teve alta médica e, ainda, casou-se
dentro do próprio hospital. A coisa foi mais ou menos assim: sensibilizados com
a paixão do casal, a família de outro interno mobilizou médicos e enfermeiros
para a cerimônia. Então de uma “vaquinha” surgiram as alianças, a festa, o
vestido de noiva, o terno, o salão. As enfermeiras ainda organizaram o chá de
panela, também no hospital. Um pastor fez a cerimônia. Teve padrinhos, festa
animada, salgadinhos e muita emoção.
“Foi tudo
o que queríamos. Não tínhamos condições, e recebemos de coração. Agora voltamos
a nossa casa, casados”, disse Fernanda. A equipe médica também participou da
cerimônia. Afinal, o casal transformou o hospital em sua segunda casa, ficando
a relação médico paciente quase familiar.
Um dos
profissionais mais próximos de Renato foi o médico intensivista Juliano
Gasparetto. “Há mais ou menos um ano o Renatão ensinou a toda equipe o
significado da palavra superação. Após lutar contra o que seria considerado
impossível para muitos, ele teve que reaprender a respirar novamente, e
conseguiu”, disse. Gasparetto lembra que foi alvo de muitas brigas com o paciente,
principalmente, no início. “Imagine a sua revolta depois de saber que não iria
mais andar. E a primeira pessoa a vê-lo todos os dias era eu. Então era eu quem
ouvia sua indignação”, lembra. Numa metodologia de humanização, o casal
participava de todas as decisões do tratamento. “Eles opinavam e interagiam o
tempo todo. Inclusive, a família ficava na UTI. Participavam de tudo”, explica
o médico.
Renato
acaba de deixar o Cajuru. Devido ao ferimento da bala, terá que viver com
traqueostomia. Para melhorar sua qualidade de vida, ganhou um respirador, que o
acompanhará onde for. Segundo ele, mesmo brigando inúmeras vezes com o
intensivista, Gasparetto está além de um simples médico. “É um anjo da guarda
que carregarei comigo pro resto da vida. Me ajudou em todas as decisões. É um
grande profissional. Um grande médico. Um amigo”, disse.
Por fim,
Fernanda e Renato agora retornam à sua casa. Saúde é o que todos desejam. Na
casinha simples de compensados, lá permanecerão. Juliano Gasparetto continuará
sua jornada diária entre lençóis, aparelhos e pacientes sobre as camas de
hospital. Enquanto isso, na cadeia de Guarapuava, repousa o indivíduo que
ocasionou toda esta história. Apenas mais uma vítima do comércio de drogas. Um
usuário em potencial. Um reflexo do desleixo e descaso da violência urbana das
cidades brasileiras. Em pouco tempo, ele estará nas ruas novamente. E quantos
Renatos ainda pagarão por um país sem leis mais severas?
O
desabafo de um médico
“Após
inúmeras paradas cardíacas por disautonomia, um desmame ventilatório que gerava
discussões e "brigas" entre eu e o Renato, meus residentes e meus
amigos da fisioterapia, sempre comigo "rabugenteando" é claro, dias,
noites e fins de semana o tratando, hoje mais uma lição e duas palavras simples:
amor e um muito obrigado dito pelo Renato e pela Fernanda, foram o suficiente
para que eu repensasse vários dos meus conceitos e o motivo pelo qual saímos de
casa todos os dias para trabalhar. Superação e muito amor pelo que faz; porque
temos o treinamento para fazer o que ninguém faz - devolvemos as pessoas que já
estiveram entre a vida e a morte para suas vidas, para serem felizes.
Não há medicina,
não há o menor sentido no que fazemos, se a palavra humanização não for a regra
número um. Apesar de sermos uma unidade de trauma e termos tratado vários
pacientes com trauma raquimedular, o Renato, pra mim, é especial.
Depois de a mídia tentar jogar a Medicina Intensiva na lama com a sensacionalista história do Hospital Evangélico, hoje tivemos a oportunidade de mostrar o outro lado do que nós fazemos no dia-a-dia. Não foi na rede privada, Einstein ou no Sírio, foi no SUS mesmo; o mesmo SUS que o Governo tenta dizer que os médicos brasileiros não querem trabalhar. Parabéns a todos os profissionais do time do Hospital Universitário Cajuru e ao ator principal desta linda história, o Renato”.
Depois de a mídia tentar jogar a Medicina Intensiva na lama com a sensacionalista história do Hospital Evangélico, hoje tivemos a oportunidade de mostrar o outro lado do que nós fazemos no dia-a-dia. Não foi na rede privada, Einstein ou no Sírio, foi no SUS mesmo; o mesmo SUS que o Governo tenta dizer que os médicos brasileiros não querem trabalhar. Parabéns a todos os profissionais do time do Hospital Universitário Cajuru e ao ator principal desta linda história, o Renato”.
domingo, 25 de agosto de 2013
A Internet cruzou os destinos de Patrícia e Bruno
O que
poderia estar nas telas de cinema, acabou virando roteiro da vida real. Há 10
anos, Patrícia e Bruno se conheceram através da Internet. De tanto conversarem
virtualmente, se apaixonaram, mesmo nunca vendo o rosto um do outro. Em 2006,
os dois se casaram e hoje viraram três. É que a pequena
Sara chegou.
Dilmércio Daleffe
Outubro de 2003. Patrícia era uma estudante tímida de 17
anos em Campo Mourão. Bruno tinha 19 e já trabalhava com informática em São
José dos Campos, São Paulo. Até então, os dois não se conheciam. Mas um dia,
quase sem querer, se encontraram em frente ao computador. Faziam parte de um
grupo de conversas de um site evangélico. Juntos, teclaram trocando informações.
Não havia nenhum interesse maior que a amizade. Mas acontece que a vida é cheia
de surpresas e, meses depois, surgia uma vontade imensa de se verem. Hoje, dez
anos depois, Patrícia e Bruno se transformaram em três. A coisa funcionou
assim: a internet os aproximou. Deus os escolheu. Um pastor os casou. E a
pequena Sara chegou.
O destino parece ter sido traçado muito cedo ao casal.
Patrícia morava em Campo Mourão. Tímida, quase não saía de casa. Era a
companhia dos pais. A quase 900 quilômetros de distância, Bruno, dono de uma
timidez absurda, também nem imaginava gostar de alguém tão cedo. Mas como num
roteiro de cinema, naquele dia, naquela hora, algo os levou à frente do
computador. “Deus nos escolheu. Não tenho dúvida disso”, acredita Bruno. No
início, passaram apenas a se conhecer. Trocaram e-mails e, meses depois, se
declararam um ao outro. “Perdi a timidez e falei que estava apaixonada”, disse
Patrícia.
Conversa vai, conversa vem, os dois decidiram não trocar
fotografias. Gostando um do outro, eles tinham certeza que a paixão era sincera.
Acreditavam que, definitivamente, Deus já havia traçado seus caminhos. Patrícia
era de Bruno. Bruno era de Patrícia. O amor era tanto que nem mesmo as fotos
eram necessárias. Então, em março de 2004, ele veio a Campo Mourão. Chegou cedo
e foi até o hotel. Lá, estava aflito e, ao mesmo tempo, ansioso. Mas os minutos
passaram e logo Patrícia o chamou. O abraço foi forte. A emoção duradoura. A
paixão intensa. O amor verdadeiro. Ali, naquele momento, uma família havia sido
formada. Depois de quase sete meses conversando pelo computador, finalmente um
viu a fisionomia do outro.
Depois disso, Bruno Rodrigues de Sousa e Patrícia Moraes
Scattu Sousa, viajaram bastante para se conhecerem ainda mais. Tantas foram às vezes
que ele despediu-se na rodoviária de Campo Mourão, que o casal ficou conhecido
pelo pessoal que lá trabalha. “Todo mundo observava a choradeira. Então,
passaram a nos conhecer”, lembra Patrícia. À moda antiga, meses depois, Bruno
pediu a mão da moça em casamento. Foi outra choradeira. Em abril de 2006, a
cerimônia aconteceu.
Hoje, o casal mora em Porto Alegre, onde Bruno, 28, é
analista de negócios. Sara nasceu há três anos. Veio para celebrar a união
intensa do amor. A exemplo dos pais, também é bastante tímida. Desde seu
nascimento, Patrícia, 26, deixou o trabalho para dedicar-se à filha. Juntos, os
três seguem o caminho do bem, da amizade, da família. Vivem um para o outro,
numa jornada cujo caminho foi semeado por flores. Apenas flores. E viva a
Internet.
Tecnologia em meio ao amor
Bruno e Patrícia contam que iniciaram a relação numa época
em que a Internet ainda era precária. Não era banda larga e ainda dependia da
discagem – quem passou por isso lembra dos ruídos. Pra piorar não existia
Facebook, nem Orkut. “A Internet caía muito. Ficava desesperada pra falar com
ele”, diz Patrícia. Ambos acreditam que não fosse o dedo de Deus, não haviam se
conhecido. Mas também agradecem a net. O engraçado de tudo isso é que, perguntado
se Sara poderá utilizar o mesmo método para conhecer alguém, Bruno é enfático:
“não”.
sábado, 17 de agosto de 2013
Paulo Novaes e o caso das vacas magras
Paulo Novaes,
ex-prefeito de Goioerê, foi autuado esta semana (16\08) pelo Instituto Ambiental do Paraná
(IAP). Está sendo acusado por maus tratos a cerca de 40 vacas de sua
propriedade rural. Segundo laudo de um médico veterinário, os animais estão
doentes, tem alimentação inadequada e encontram-se com pouca água.
Dilmércio Daleffe
Ex-prefeito de Goioerê, Paulo Novaes, assinou ontem(16\08), termo
circunstanciado na delegacia de Polícia Civil, por maus tratos a cerca de 40
cabeças de gado de sua propriedade. O caso teve início após uma denúncia sobre
o “abandono” do rebanho. A pedido do Ministério Público, o Instituto Ambiental
do Paraná (IAP) fez averiguação no local e, mediante a um laudo emitido por um
médico veterinário, constatou que os animais encontram-se doentes,
principalmente, devido a precária alimentação e a falta de água.
De acordo com Claude Wilson dos Santos, policial militar ambiental,
ficou constatada a prática de maus tratos aos animais. “No laudo foi verificado
que a maioria está doente. Além disso, foi comprovada falta de água e uma
alimentação inadequada”, afirmou. Diante dos fatos, Paulo Novaes foi
encaminhado à delegacia, onde assinou termo circunstanciado. O policial ainda
informou que o ex-prefeito deverá responder por crime ambiental. Ele também
terá multa de R$1,5 mil por cada animal doente.
O caso teve início há cerca de 15 dias, depois que dois
animais foram encontrados à beira da rodovia, em frente a sua propriedade. No
acostamento, duas vacas doentes estavam deitadas já, sem forças para se
levantarem. Segundo explicou Simone Bortoluzzi, Presidente da Associação para
Melhores Amigos dos Animais (AMAA), entidade de Goioerê, os animais foram
abandonados. “Estavam sem água e sem comida”, disse. A partir disso, a
associação recolheu apenas uma vaca. A outra já havia morrido. O bicho ganhou
nome de Vitória e passou a ser cuidado. Ainda hoje requer cuidados. Depois do
episódio, o Ministério Público acatou a denúncia e decidiu fazer uma
averiguação. Então designou o IAP para ir até a propriedade.
Ontem (16\08), Novaes prestou esclarecimentos à polícia. Na saída,
disse que os animais não estão doentes, muito menos passando sede, nem fome. “Estão
fazendo um verdadeiro carnaval. Tudo por causa da política”, insinuou. Conhecido
pelo estilo de boa prosa, Novaes ainda agradeceu a presença da imprensa e se
disse satisfeito de ter seu nome levado a todo estado. Ainda aceitou convite
para ir até a propriedade mostrar a realidade dos animais. Saiu da delegacia sem
poder, uma vez que deveria prestar depoimento ao delegado.
No sítio, o que se viu foi uma propriedade antiga, com falta
de manutenção, sem caseiro e com animais doentes e magros. Ele ainda mostrou
ração. Mas conforme laudo do veterinário, com pouca eficiência. Uma das vacas
havia ganhado bezerro um ou dois dias antes, mas continuava com a placenta dependurada.
Observou-se ainda secreção nos olhos de algumas vacas. Novaes mostrou
rapidamente o quadro aos jornalistas. No entanto, teve que ir embora acompanhado
pela Força Ambiental, escoltado, uma vez que saiu da delegacia sem prestar
depoimento ao delegado. Ele tem até o dia 5 de setembro para apresentar sua
defesa junto ao IAP.
Novaes foi prefeito de Goioerê entre os anos de 93 e 96.
Após deixar a prefeitura acumulou cerca de 80 processos. Por causa disso ainda
tem quase todos os bens interditados pela Justiça. Até a propriedade e o
rebanho estão bloqueados. “Sou fiel depositário dessas vacas aí. Se quiser
levar uma pode levar pra você”, disse. Não se sabe se foi brincando ou não.
domingo, 11 de agosto de 2013
Indignação e revolta às margens da Usina Mourão
O que fazer
para acabar com a poluição das margens da Usina Mourão? Quem são os verdadeiros
poluidores: proprietários ou pescadores? E o município, está fazendo sua parte?
Como se vê, muitas perguntas, poucas soluções.
Dilmércio Daleffe
A médica Maísa Campos Fernandes de Moraes acaba de adquirir
um terreno às margens da Usina Mourão. Mas ela está revoltada. Passou dois dias
fazendo uma limpeza no local e, de lá, retirou três sacos repletos de lixo.
Sujeira deixada por pescadores de final de semana. Garrafas de cerveja, pinga e
conhaque, vidros de perfume e remédios, latas de refrigerante e sardinhas, pets
de todos os tamanhos, além de um colchão de molas completamente enterrado.
“Estou indignada com o que vi”, disse. Maior foi apenas sua surpresa. É que
durante a limpeza, viu como a natureza é mais forte que o homem. No interior de
uma das dezenas de garrafas, já quase soterrada, uma planta conseguiu
adaptar-se e nasceu forte e verde. Em outro local, outro vasilhame de cerveja
acabou engolido por uma árvore. O vidro até hoje intacto, abraçado pela
natureza.
“Estou perplexa com o desrespeito do homem. E, ao mesmo
tempo, surpresa com o que a natureza pode fazer”, disse Maísa. Ela é médica em
Curitiba e comprou o terreno com o intuito de vir a morar em Campo Mourão nos
próximos anos. Segundo a médica, beleza natural como a do Parque dificilmente
se vê. “Quantas cidades do mundo gostariam de ter um lugar como esse e não
têm”, argumenta. Somente em sua propriedade foram retirados três sacos de 100
litros repletos de lixo. Todo material foi jogado em local adequado na cidade. Embora
distante de Campo Mourão, ela faz um apelo para que pescadores que leiam esta
reportagem não continuem a poluir a usina. “Que pelo menos levem toda sujeira
de volta à cidade. De nada adianta retirar os materiais das margens do lago e
sair jogando pela estrada. Ninguém tem o direito de poluir”, disse. Mas mal
sabe Maísa que seu trabalho apenas começou. Depois que o nível da água baixar,
terá mais lixo a retirar.
Planta nasceu e se desenvolveu no interior da garrafa |
Mas quem são os verdadeiros responsáveis pelo lixo
depositado no lago? Pescadores de final de semana ou os proprietários de lotes?
No caso do terreno da médica, certamente pescadores, uma vez que ali nunca foi
habitado. Mas para o Gerente do Parque Estadual Lago Azul, Rubens Lei Pereira
de Souza, tanto donos de imóveis quanto pescadores tem culpa. Para ele, falta
conscientização ambiental de ambas as partes. “Vemos que pescadores deixam
sujeira, sim. Mas os proprietários também poluem com queimadas. É necessário um
projeto de conscientização ecológica para que o local não seja destruído”,
disse.
Garrafa jogada acabou engolida por uma árvore |
Mas se pescadores e proprietários falham, para Rubens, a
prefeitura também leva sua culpa. De acordo com o gerente, mesmo pagando-se
IPTU no local, faltam mais locais para que a população deposite seu lixo. E
quando existe, o município demora a coletar. “Cobramos inúmeras vezes uma
posição da prefeitura quanto à coleta. Falta a elaboração de um projeto para
que o lixo seja recolhido regularmente”, afirmou. Em tempo: Segundo Rubens, 90%
do lixo da usina é reciclável e nada se faz para o mesmo ser reaproveitado. A
ideia dele é que, como na cidade, o município passe de chácara em chácara
recolhendo o material.
A palavra do município
Procurado, o secretário municipal de Obras e Meio Ambiente,
José Marin, disse que o gerente do Parque está equivocado. “Nós fazemos a
coleta regularmente, sim. No verão o caminhão passa duas vezes por semana,
enquanto que, em outros meses, uma vez na semana”, disse. Ele explica que o
município colocou recipientes em dois locais, um próximo à conhecida Associação
Banestado e outro na saída da estrada do DER, já quase na rodovia BR-487. “Cada
proprietário de terreno deve depositar seu lixo ali, ou até trazer de volta à
cidade. Mas a prefeitura não tem responsabilidade sobre outras áreas rurais”,
afirmou. Quanto ao lixo deixado por pescadores, Marin alega não poder fazer
muita coisa, uma vez que as margens da represa são de responsabilidade do
Parque Estadual Lago Azul. “Estamos abertos ao diálogo e sempre dispostos a
melhorar a coleta se for preciso”, salientou.
Cartilha voltada a pescadores está em desenvolvimento
Para se combater a inexistência de uma conscientização
ambiental, uma cartilha voltada a pescadores de final de semana está sendo
desenvolvida pelo Parque Estadual Lago Azul. Nela, estarão informações
essenciais para que a poluição seja minimizada. “Vamos orientá-los sobre
legislação, lixo, reciclagem e pesca. Até o final do ano estaremos distribuindo
ao redor do Parque”, informou Rubens. A iniciativa é positiva e de suma importância.
Mas em se tratando de brasileiros, não será surpresa se a cartilha passar a ser
um item poluidor a mais, ao lado das garrafas, pets e latas.
sexta-feira, 9 de agosto de 2013
Fotografias
Céu vermelho, folhas caindo, ventania.
Um ar frio, tempo seco, me admira.
Noite chega, cidade quieta, fico na minha.
Então surgem as sombras, rabiscos, fotografias.
quarta-feira, 7 de agosto de 2013
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