segunda-feira, 13 de junho de 2011

Cidades a mercê da sorte e dos santos




Dilmércio Daleffe

Farol está praticamente no escuro, pelo menos em relação à segurança pública. Lá, além da Polícia Civil não mais existir nos últimos oito anos, são apenas quatro policiais militares para uma população de quatro mil habitantes. Ou seja, um PM para cada mil pessoas. Mas isso na teoria. Na prática, a situação é bem pior. Becker é um dos PMs que trabalha na cidade. Na segunda-feira, enquanto fazia a guarda do mini presídio feminino, não havia nenhum outro policial nas ruas. Dois estavam de folga e o quarto chegava à noite. Em resumo, os PMs são como o sol e a lua, nunca atuam juntos. Mesmo que atuassem não conseguiriam fazer muita coisa com uma só viatura.

Becker é um exemplo daqueles PMs dedicados ao trabalho. Mesmo assim, já mostrava um aspecto cansado, de exaustão. Conta ele que, além de realizar as funções da Polícia Civil, ainda cuida da cadeia e faz o leva e traz das detentas ao hospital. “Hoje levei uma presa até Campo Mourão. Depois voltei e levei outras duas ao hospital daqui”, disse. Enquanto saiu, o prédio da delegacia ficou sem a proteção policial. Foge quem quer. E falando nisso, somente neste ano foram duas as foragidas de Farol. Com a rotina estressante, Becker ainda sofre com os intensos trotes diários ao telefone. Enquanto dava entrevista, atendeu a uma ligação. Do outro lado o xingaram de “burro” e “porco”. “Aqui é assim”, lamentou.

O prédio se resume a uma edificação antiga, com muros altos e arame farpado. Algumas paredes estão rachadas devido à erosão da terra arenosa, nos fundos da delegacia. Na recepção três pequenas salas, uma delas com TV. As ocorrências são feitas ali mesmo, com o próprio Becker quando ele está no prédio. Hoje são 14 as detentas. Apenas mulheres. A população brinca com os PMs, dizendo que eles estão no paraíso. Mas qual paraíso é cercado com grades, arame farpado e mulheres criminosas? Sem chance.




Dina Cardoso, a prefeita da cidade, está preocupada. “Precisaríamos de pelo menos sete policiais”, afirma. De acordo com ela, foram muitas as solicitações ao governo para que a cidade tivesse maior efetivo. No entanto, recentemente, recebeu comunicado indicando uma luz – como um farol – no fim do túnel. Nos próximos meses, todas as detentas da cidade devem deixar o prédio local, desafogando um pouco o trabalho dos PMs no município. Católica, ela lembra que Farol não é violenta – o último assassinato ocorreu em setembro de 2010. “O Cristo que colocamos na entrada da cidade está nos abençoando. Nem mesmo registros de assaltos temos visto”, disse. Em relação ao número de vereadores da cidade, quando comparado ao de policiais, ela afirmou que não precisariam ser nove. “Poderia ser um pouco menos, sim”, disse.

Uma delegacia no parquinho

Em Luiziana, o prédio que acolhe os quatro únicos policiais militares nem ao estado pertence. Trata-se de uma edificação antiga, mantida pela própria prefeitura num local onde deveria conter um parquinho infantil. Sim, ao invés de existirem crianças brincando, conforme diz a placa ainda resistente ao tempo, encontra-se a sede da PM. O local se resume em tranqüilidade. Sem muitas ocorrências, até as duas celas foram desativadas. Lá, ao invés de presos, temos uma moto e algumas bicicletas. Todos os detidos são encaminhados a Campo Mourão. Por esse motivo, os PMs têm um trabalho a menos que outras delegacias da região.
Atualmente são pouco mais de sete mil habitantes em Luiziana para apenas quatro policiais. É muito pouco, mas ainda, o suficiente para atender os míseros chamados da população. De acordo com o único PM de plantão - ele não quis ser identificado -, o último assassinato ocorreu em 2010. Fora isso, não existem muitos outros fatos importantes por lá. “O que mais temos por aqui são afogamentos e suicídios”, disse. Ainda assim, são os PMs que fazem parte do trabalho que deveria ser da Polícia Civil, uma vez que a instituição não existe na cidade.


Católico e ministro da Eucaristia da igreja local, o prefeito Cláudio Pol concorda que o número de policiais na cidade é pequeno. “Deveria ser maior, sim. Mas já pedimos reforço ao governo do estado”, disse. Devoto de Nossa Senhora, ele carrega a imagem da santa até na tela do celular. “Eu tenho pedido proteção divina a nossa cidade. Mas só isso não adianta”, revela. Ele preferiu não repercutir sobre o fato do seu município manter mais vereadores a policiais.

A realidade

Para o delegado chefe da 16ª Sub Divisão Policial de Campo Mourão, José Aparecido Jacovós, em pelos menos três municípios da região – Farol, Janiópolis e Luiziana – a Polícia Civil deixou de atuar mais incisivamente. Ele explica que a instituição até existia há cerca de oito anos, quando o governador Roberto Requião decidiu acabar com os conhecidos “delegados calças-curtas”. Segundo ele, depois desta medida, a PM teve que suprir o atendimento às populações locais. No entanto, ele destaca que, mesmo assim, estas cidades continuam sendo atendidas pela 16ª SDP, apesar das dificuldades. “Nenhum inquérito está parado”, afirmou.

Juntas, Farol, Luiziana e Janiópolis possuem ao todo 13 policiais militares, nenhum policial civil e 27 vereadores. Em resumo, os três municípios mantém o dobro de vereadores em relação ao número de policiais. Para o Tenente Coronel Geraldo Moliani, comandante geral do 11º Batalhão de Polícia Militar de Campo Mourão, a situação realmente preocupa. No entanto, há uma boa expectativa de que, nos próximos meses, o efetivo comece a aumentar. Isso porque o governo do estado deve abrir treinamento em Maringá, equacionando aos poucos o déficit de homens na região. Dados indicam que atualmente, a PM do estado está defasada em pelo menos 8 mil homens.

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