terça-feira, 5 de junho de 2018

Desabastecimento? Aonde?


Greve dos caminhoneiros

Desabastecimento? Aonde?

Família não viu desabastecimento com greve dos caminhoneiros

Dilmércio Daleffe



Um fogão a lenha. Galinheiro no quintal. Feijão e arroz plantados no próprio sítio. Leite entregue em casa direto do produtor. Crise de abastecimento? Aonde? É o que pergunta Valdenor Vieira. Aos 80 anos, o aposentado e produtor rural passou a última semana como qualquer outra. Não teve transtornos com a paralisação dos caminhoneiros, muito menos viu os problemas enfrentados nas médias e grandes cidades brasileiras. “Crise para mim é quando estamos doentes”, diz.

Vieira mora em Piquirivaí, comunidade distrital oito quilômetros de Campo Mourão. Reside com a esposa Maria Aparecida e com uma filha. E é ali, na casa simples, sem luxo, onde se vê a riqueza distribuída pelo quintal. Uma horta com manjericão, alecrim, cheiro verde e inúmeras outras hortaliças. Ao canto, um pequeno galinheiro com os bichos produzindo os ovos tão requisitados por estes dias. Num velho freezer sem motor, um estoque com feijão, arroz, amendoin e diversos grãos armazenados em pets de refrigerantes. Frutas espalhadas por estantes e, até no chão. Tudo vindo da propriedade rural da família. Até mesmo mel das Jataís ele apanha sem maiores dificuldades. Encostado na parede, uma leva de lenha bravamente guardada para a esposa fazer biscoitos e o pão caseiro. O velho fogão e forno a lenha a postos, sempre, como uma poesia nos tempos modernos.

Nascido no Ceará em 1938, Vieira chegou à comunidade ainda em 67. Sempre manteve um dos pés na zona rural. Mas também trabalhou com secos e molhados na própria Piquirivaí. No entanto, hoje ele vê a importância da sobrevivência do homem em virtude do campo. “Aqui não nos falta nada. Temos tudo devido à proximidade rural. Se um vizinho não tem algo, emprestamos. O leite chega em casa. Gas não precisamos. Combustível para que, se andamos a pé”, questiona. Em tempo – Piquirivaí possui duas avenidas. Para ir até o sítio, o aposentado percorre os dois quilômetros a pé, quase todos os dias.



A fartura é tanta que, segundo ele, a conta mensal do mercado não chega a R$300. Compra-se apenas o necessário, como açúcar e outros produtos indispensáveis à limpeza da casa. Até mesmo o óleo de cozinha não é comprado. “Usamos banha de porco. Mais saudável e não precisamos comprar”, lembra. No último sábado a família decidiu fazer uma feijoada. Mercado? Não. O feijão veio do sítio. A carne de porco do vizinho. A couve da horta.

Vieira é um cearense de prosa baixa e calma. Conta histórias detalhadamente num tom pacífico. Não ofende ninguém. Só agradece. Religioso, é devoto de Nossa Senhora Aparecida. Aliás, não o visite entre as 17h e 18h. É neste horário em que fica isolado em sua casa para orar. “Rezo para mim, minha família e meus amigos. Agora, rezo mais para as pessoas más. É necessário”.  

Talvez pela fé, Vieira acredite num futuro em que o homem tenha que retornar as suas origens. Ou seja, no campo. “Vive-se hoje num mundo de aparências. Tudo gira pelo dinheiro. E é por isso que a crise recente mexeu com o país. Se o homem retardasse os seu ritmo, talvez, esta crise não teria acontecido”, afirma. Segundo ele tem-se que aprender viver mais com menos coisas. E mais qualidade de vida. “A crise quem faz somos nós mesmos”, assegura.

Na vida simples e segura que ele e a família levam, aprendeu a ter muitos amigos. Somente compadres são 72. Isso significa que a casa vive cheia de visitas. Por esta razão a dispensa tem que estar sempre cheia de comida. “Podia ter a paralisação dos caminhoneiros durante um ano. Nossa vida não iria mudar em nada. Temos tudo o que precisamos. Para quem vive simples, a vida é simples”, garante.

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