Ivan: a face do crime |
Dilmércio Daleffe
O escorpião aproximou-se do sapo à beira do rio. Como não sabia nadar, pediu uma carona à outra margem. Desconfiado, o sapo respondeu: “Ora, escorpião, só se eu fosse tolo demais! Você é traiçoeiro, vai me picar, soltar seu veneno e eu vou morrer.” Mesmo assim o escorpião insistiu, com o argumento lógico de que se picasse o sapo ambos morreriam. Com promessas de que poderia ficar tranquilo, o sapo cedeu, acomodou o escorpião em suas costas e começou a nadar.
Ao fim da travessia, o escorpião cravou o seu ferrão mortal no sapo e saltou ileso em terra firme. Atingido pelo veneno e já, começando a afundar, o sapo desesperado quis saber o porquê de tamanha crueldade. E, friamente, o escorpião respondeu: “Porque essa é a minha natureza.”
O trecho extraído do livro “Mentes Perigosas”, de Ana Beatriz Barbosa Silva, reflete parte do mundo doentio de Raimundo Gregório da Silva, 56 anos, que ficou conhecido como “Ivan, o Terrível”. Esta semana ele foi condenado a 36 anos e seis meses de prisão por duplo homicídio qualificado e ocultação de cadáver. Isso porque, há cerca de sete anos, matou, queimou e ocultou os corpos de duas adolescentes. Parecido com filmes policiais americanos, a cena ocorreu em Campo Mourão, interior do Paraná. Em um bairro carente da periferia. Numa escola pública, onde Raimundo era o caseiro.
Amigo de todos os estudantes daquela instituição, “Ivan” – como foi apelidado – fazia o papel do caseiro boa gente. Sua missão era limpar e zelar da escola. Dava pitos aos mais bagunceiros e até conselhos aos que precisavam. E foi assim, com jeitinho, que aproximou-se das duas jovens Iara e Dmitria. A primeira desapareceu em 2010 e a segunda, em 2008. Pois bem, nenhuma delas jamais imaginou que estavam junto a um psicopata. Principalmente, porque para a maioria das pessoas, psicóticos têm cara de mau, são truculentos e com desvios comportamentais óbvios.
Mas não. “Ivan” que o diga. Sujeito franzino, baixinho, magro. Gente boa, conversador, amigo. Quando usava seus óculos então, tinha até cara de intelectual. Dava até dó. Quem seria capaz de dizer que faria o que fez? Mas segundo a escritora Ana Beatriz, sim, os psicopatas estão entre nós. São pessoas próximas demais que, de tão perigosas, fingem como atores consagrados de Hollywood.
Após quatro anos preso, seu julgamento terminou perto das 23h da última terça-feira – dia 23 de setembro. Ivan afirmou ter matado as meninas a marretadas. Depois de matá-las, queimou os corpos e as cinzas, jogou na horta do colégio - quantas crianças não se alimentaram daquela horta?. Depois desenterrou algumas partes e colocou na fossa.
Dimitria Vieira, em 2008, era quase uma criança. Tinha 16 anos. Iara Pacheco, estava com 21 anos, em 2010. A polícia chegou até ele depois de encontrar roupas das meninas no forro da escola. As investigações chegaram a ser encerradas. É que Ivan enviava mensagens de um celular às famílias das vítimas, se passando pelas próprias meninas. Mas a polícia descobriu que o aparelho que enviava as mensagens estava na casa de Ivan. No aparelho também foram encontradas fotos das meninas nuas.
Mas se para o alívio das famílias das duas adolescentes a justiça foi feita, fica a constatação de uma realidade mais ameaçadora. Para a escritora e pesquisadora, o mais impactante é que a maioria esmagadora de pessoas com mentes perigosas está do lado de fora das grades, convivendo diariamente em sociedade. Transitam diariamente pelas ruas, cruzam nossos caminhos, frequentam as mesmas festas, dividem o mesmo teto e, ás vezes, dormem na mesma cama.
Uma vez na rede de um psicopata, as consequências são avassaladoras. Vidas arruinadas, sonhos destruídos, dramas psicológicos. Dor. Ivan, agora está preso. Terá uma longa jornada distante da sociedade. Mas enquanto isso, muitos outros continuam por aqui. E eles estão perto. Muito perto.
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