Dilmércio Daleffe
Ele tinha um desejo. Queria morar e prosperar em Campo
Mourão. Então, ao lado da mulher e filhos, deixou a pequena Mallet, no Paraná,
para estabelecer-se sob a poeira vermelha. Chegou ainda na década de 50 e,
aqui, ficou até morrer. Nicolau Szapak fez história. Foi o primeiro e também o
último ferreiro da cidade. Iniciou consertando fogões a lenha, fazendo
talhadeiras e desenvolvendo pequenas ferramentas. Antes de deixar a vida,
continuava a labuta, mas agora, construindo churrasqueiras e criando
escapamentos. Ucraniano, Nicolau morreu há 11 anos. No entanto, sua história
jamais desapareceu. Ela está guardada na memória dos amigos e pessoas que o
conheceram. Embora tivesse um ofício simples, foi responsável por inúmeras
lições. Sem medo de errar, pode-se afirmar que o velho ferreiro teve
participação fundamental na formação da comunidade mourãoense, principalmente,
através de seu maior legado: a honestidade.
Uma comunidade é construída a partir de valores e da
formação de seu povo. E Campo Mourão, teve sua construção moral através de
famílias pioneiras que aqui vieram. Um destes desbravadores foi Nicolau. Chegou
em 53, ao lado da esposa Emília. Veio acreditando ser uma cidade promissora.
Tanto acreditou que jamais foi embora. Naquele ano, surgiu com um facão na mão.
As estradas ainda eram precárias e, vez em quando, picadas em meio ao mato
tinham que serem feitas. Aqui, instalou-se num casebre onde é hoje a esquina da
Avenida Manoel Mendes de Camargo e a Rua Mato Grosso – mais especificamente
onde está hoje o estacionamento da Dipar.
Junto a casa, montou a ferraria. A partir disso, passou a
trabalhar e colaborar com o desenvolvimento da cidade. Fazia de tudo, como
instrumentos e ferramentas em ferro. Até ouro derretia na forja. Teve seis
filhos. A eles, insistiu numa educação rígida, repleta de ensinamentos. Sua
filha mais nova, Hanucia, não esquece aquelas palavras. “Pregava muito sobre
honestidade. Jamais me esqueci de suas lições”, disse. O homem, apesar do pouco estudo, tinha uma
enorme sabedoria. Adorava ler. E diante das revistas e jornais, devorava cada
um. Foi também um colecionador de amigos e jamais identificou um inimigo. Um
deles foi Estefano Domanski. Até hoje lembra do amigo com ternura. “Ele se foi.
É a vida. Mas não esqueço das nossas pescarias. Era um homem generoso, honesto,
amigo. Adorava contar uma piada. Nos divertíamos bastante”, conta ele.
Domanski lembra que Nicolau era um artista. Fazia com o
ferro o que muitos não fazem nem no papel. “Ele me deu uma machadinha. Era tão
boa que não precisava afiar”, disse. Hanucia também tem lembranças de objetos
que o pai fazia. Aliás, mesmo doente, Nicolau não se afastava da ferraria. Era
sua paixão, seu hobbie, sua vida. “Ele viveu para o seu trabalho. Tanto é que
não ligava para bens materiais. Se quisesse tinha ficado rico. Mas preferiu
apenas viver. E viveu à família e aos amigos”, ressalta. A filha não esquece de
uma frase dita pelo pai: “Se um dia aplicar seu dinheiro, invista na terra, porque
ela floresce. Já os materiais, estes apodrecem”. A educação deixada por Nicolau
foi tão intensa que Hanucia ainda preserva parte dos ensinamentos.
Culturalmente, ela nunca deixou de falar a língua ucraína. Além disso, continua
a passar para outras gerações as pinturas em pessankas – ovos coloridos a mão.
Embora não gostasse de se meter em política, o velho
ferreiro havia sido vereador em Mallet. Mas em Campo Mourão, esqueceu-se
daquele passado. Preferia a vida pacata e zen a revolta do povo. Dizia que um
bom prefeito é aquele que faz o bem para sua cidade, principalmente, depois de
eleito.
Nicolau é um patrimônio de Campo Mourão. Como desbravador e
pioneiro, deixou um legado moral invejável. Suas lições de educação e
honestidade sem dúvida alguma tiveram influência na comunidade. Assim como
grandes empresas deixam rastros de progresso, Nicolau ajudou a florescer o
futuro. Fez sua parte. Mas ao contrário de muitos, preferiu olhar apenas à
frente. Sempre acreditou na cidade. E como diz a própria filha, teve orgulho de
ter morrido nas terras de Campo Mourão. Nicolau, o ferreiro, viverá para
sempre.